“Protocolei denúncias, e me tornei inimigo dos professores da Jupyra”

José Fábio Sousa Nougueira, secretário municipal de Cultura

PRUDENTE - GABRIEL BUOSI

Data 27/11/2019
Horário 07:18
Jean Ramalho - Fábio Nougueira comenta sobre início das denúncias que resultaram em CPI
Jean Ramalho - Fábio Nougueira comenta sobre início das denúncias que resultaram em CPI

Após a notícia de que o relatório parcial da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que propõe o afastamento do secretário municipal de Cultura de Presidente Prudente, José Fábio Sousa Nougueira, e outros quatro servidores da Secult (Secretária Municipal de Cultura) foi aprovado, a reportagem teve, com exclusividade, uma entrevista com o titular da pasta, que falou sobre as denúncias que envolvem seu nome e da Escola Municipal de Artes Professora Jupyra Cunha Marcondes. No depoimento, ele comenta sobre algumas das irregularidades encontradas na unidade de ensino e apontou quando foi que se iniciaram as denúncias contra seu nome. “[...] foi um vespeiro que eu mexi, que envolve mordomias e algumas questões que são ilegais”, aponta.

Secretário, como o senhor avalia todo esse processo desde o início?

Não entro no mérito de a CPI ser legal ou ilegal. Acredito, no entanto, que toda e qualquer denúncia tem que ser apurada. Se ela era necessária e se está dentro da legalidade, isso no futuro a própria Justiça vai dizer. Mas quero deixar claro que sou sim a favor de toda e qualquer denúncia ser averiguada, principalmente se envolver o poder público.

Para contextualizar a partir da sua versão dos fatos, como foram que as denúncias surgiram?

O que ocorre é que, na Escola Municipal de Artes Professora Jupyra Cunha Marcondes, há cerca de um ano e pouco, começamos a detectar algumas irregularidades e quando você fica ciente destas certas irregularidades, você precisa tomar decisões e foi o que fiz, quando protocolei denúncias no Ministério Público Estadual, que também foram enviadas à Prefeitura e vereadores.

Há algum exemplo de irregularidades que podem ser citadas?

Há, como pagar coisas na escola que não deveriam ser pagas, ou mandar confeccionar camisetas e vender dentro da escola pela própria direção, sendo que a escola não pode fazer isso. Neste caso, por exemplo, é preciso pegar a arte da camiseta e colocar em lugares que confeccionam para que os pais se responsabilizem por ir ao local e fazerem seus pedidos. Além disso, há a questão das bolsas de estudos que têm um sistema de requisição, e que é enviado para a Secretaria de Assistência Social, que é a responsável por analisar o pedido e dizer se sim ou não. Detectamos, no entanto, muitas bolsas dadas pela direção da escola de forma desrespeitosa. Além disso, no Festival de Música do ano passado, algumas pessoas que participaram pagaram diretamente na secretaria da escola e esse dinheiro não deu entrada na Prefeitura, sendo manipulado dentro da escola.

Diante do que teve conhecimento, como foi que o senhor reagiu?

Eu fiz uma denúncia na própria Prefeitura e a direção da escola na época até fez um depósito devolvendo o dinheiro no montante de aproximadamente R$ 1,3 mil. Fora isso, quero dizer que, nessa época, o prefeito determinou que fossem revistas as questões de funcionários das secretarias e se o atendimento da população poderia ser ampliado. À época, pedi a um assessor que desse uma olhada nos funcionários da pasta. Em números, que não são exatos, 27 professores da escola têm orçamento em folha de pagamento em quase R$ 4 milhões, e outros quase 80 funcionários da secretaria tem folha de R$ 2 milhões. Essa diferença é muito grande. É ilegal? Não é, mas eu fiz uma proposta aos professores de ampliar o atendimento à população, pois um professor que trabalha seis ou sete horas tem um salário que pode variar de R$ 13 mil a R$ 15 mil, fora os ex-professores aposentados com salário de R$ 18 mil.

Poderia explicar um pouco mais sobre a proposta apresentada de ampliação no atendimento?

Era basicamente que eles, a partir de 2020, ao invés de trabalhar com um único aluno, pelo salário que recebem, pudessem ampliar com trabalhos na periferia, junto à comunidade ou entidades carentes, por exemplo, e pedi para eles a possiblidade de isso ocorrer no próximo ano. Ocorre que com essa série de coisas detectadas, eu mexi em vespeiro. Vale destacar que a identificação dos problemas não veio de fora, não foi uma denúncia de alguém da população, por exemplo, mas nós mesmos estamos denunciando, tanto que protocolei as minhas denúncias, mas com isso me tornei inimigo dos professores da escola. Para se ter uma ideia em números, temos 27 professores, sendo que três deles trabalham fora da unidade. Juntos, esses três atendem cerca de 360 alunos aproximadamente. E do outro lado tenho 24 professores dentro da escola que atendem cerca de 500, e comecei a questionar sobre isso. Por que não ampliar essa demanda? Por que em vez de ficar dentro de uma sala de aula com um aluno, dentro do ar-condicionado, não irmos para a comunidade?

Nesse período, existiu algum confronto entre vocês?

No início, ainda no ano passado, cheguei a pedir a exoneração da direção da escola e foi colocado para responder pelo cargo um professor da unidade, que também começou a identificar questões problemáticas. Foi nesse período que comecei a exigir que mudanças fossem feitas. Eu não aceito, por exemplo, que você cobre algo de um aluno e esse dinheiro ser revertido para um café de professores, mas volto a falar, foi quando comecei a virar um vilão e momento em que surgiram denúncias absurdas. A cidade inteira sabe que eu gosto de redes sociais e na minha página do Facebook eu falo coisas que eu gosto e não gosto, de onde surgiram outras denúncias.

E como as redes socais passaram a fazer parte desse processo?

Alguns professores começaram a ver minhas postagens e tiravam fotos da tela para dizer que eram indiretas para eles. Como, por exemplo, quando lemos que um homem agride uma mulher nos noticiários e colocamos na rede social: homem que bate em mulher é covarde. Esse é meu pensamento, mas o professor vai e denuncia que a indireta é para ele. Por isso, as denúncias feitas na Câmara são baseadas nisso, que tal coisa é indireta para os professores. Tem até um boletim de ocorrências de uma professora que teve uma discussão com uma mãe e eu fui chamado para intervir. Nessa discussão eu falei para a professora que ela era uma servidora pública e que ela teria que tratar bem as pessoas, além do fato de que ela dá aulas para crianças, que têm direitos, por isso, falei para que ela parasse de fazer aquilo, pois o reinado dela havia acabado. Eu não ia admitir isso e foi quando ela fez uma denúncia de que eu havia a humilhado publicamente. Então, as coisas são extremamente neste sentido.

Além disso, teve alguma outra situação que possa exemplificar e que pode ter desencadeado tais denúncias?

Identificamos que aproximadamente oito professores que foram efetivados não tinham faculdade de Música. Tinham outras formações, como Desenho e Pintura, e foi quando questionei como um professor dá aula de música sem ter o curso específico. Neste momento, me tornei mais inimigo ainda, pois há a possibilidade de eles perderem legalmente essa oportunidade. Quero deixar claro que uma coisa é você saber e não fazer nada, e eu não sabia do que estava ocorrendo. Quando soube, denunciei e protocolei o que eu havia visto, como no Ministério Público Estadual.  

Qual era naquele momento seu pensamento sobre as irregularidades?

Veja bem, a Prefeitura com dificuldades, como na folha de pagamento, e nós temos que ter por ano quase R$ 4 milhões para manter pouco mais de 20 professores. É correto isso no momento em que vivemos no país? Não podemos mandar embora ou diminuir o salário, mas podemos aumentar a demanda atendida, por exemplo. Mas tem professor que quer dar aula apenas para um aluno e com o ar-condicionado ligado, dentro da sala de aula, recebendo R$ 13 mil por mês. E eu não posso aceitar isso, por isso disse que foi um vespeiro que eu mexi, que envolve mordomias e algumas questões que são ilegais.

Com tudo isso, foi sugerido o afastamento. Como se sente diante disso?

Prefiro não opinar. Mas quero dizer que concordo com a CPI na questão de averiguar as denúncias, mas ela não ouviu os dois lados ainda.

Pegando o gancho em cima da sua fala, a Câmara já apontou, inclusive em relatório, versões do senhor em relação às denúncias. Não considera isso como seu posicionamento no caso?

Não, eu não fui ouvido. A Câmara me mandou um monte de papel e com indagações, mas por lei eu preciso ser ouvido sobre o caso. No início do processo todo, antes das oitivas, a Câmara mandou um documento para mim em cima de uma acusação e eu falei que não procedia e entendi que depois eu seria chamado para as oitivas. Desafio eles mostrarem gravações minhas, pois eu não fui lá.

E em relação ao pen drive que dizem ter com gravações e que serão encaminhadas à Polícia Civil. O senhor teme de alguma forma o conteúdo?

São duas gravações que eles possuem sobre denúncias. Uma delas e que repercutiu, e que tenho uma cópia, é que em determinada reunião eu estava comparando o Projeto Guri, que atende quase 700 crianças com muito menos professores, na intenção de entender por que é que a Jupyra não consegue atender quantidade maior de alunos. Ocorre que uma mãe, em reunião, no entanto, fez um comentário de que eu não deveria comparar o Guri, que seria coisa de pobre, nas palavras dela, e tenho testemunhas sobre isso. E em outra reunião, no entanto, eu citei o caso dessa mãe e falei algum texto mais ou menos que dizia: eu não aceito essa comparação, pois a primeira cama que eu dormi na vida foi quando eu tinha 13 anos, pois até então eu dormia no chão. Minha realidade pouquíssimas pessoas conhecem, e eu não aceito discriminação contra pobres. Foi quando eu fiz um comentário que diz mais ou menos o seguinte: se os professores da Jupyra querem trabalhar só com crianças perfumadas, saibam que vão ter que trabalhar também com crianças que podem sim estar fedendo. Esse pedaço do meu áudio que está lá, como se eu falasse que criança pobre fede, mas eu quero que coloquem o áudio inteiro e mostrem todo o conteúdo que eu falo que venho da pobreza de não ter o que comer, e contextualizo a fala de que não trabalharemos apenas com crianças perfumadas, mas que às vezes elas podem estar fedendo. Isso eu falei, e repito na frente de quem for, pois não estou errado, mas só pegaram um trecho para a denúncia. É do universo da janta de farinha com açúcar que eu venho, aos 13 anos de idade, foi isso que eu questionei e pedi respeito pela vida. É desse universo que eu defendo, e estou sendo condenado por isso.

Sobre tudo isso, gostaria de deixar alguma consideração final?

Ano que vem completo de 28 anos de governo. O Tribunal de Contas do Estado sempre aprovou as contas da secretaria sem discussão. Nunca questionaram uma nota, e é isso que estão querendo manchar. É isso.

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