Política

Órgão de contas pede reprovação de gastos de Alckmin e França em 2018

  • 22/05/2019 13:05
  • JOSÉ MARQUES E CAROLINA LINHARES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - De forma inédita, o Ministério Público de Contas de São Paulo pediu a reprovação dos gastos do governo do estado. O parecer é relativo ao ano de 2018, cuja gestão foi dividida entre Geraldo Alckmin (PSDB), de janeiro a março, e Márcio França (PSB), de abril a dezembro. O documento, que agora será analisado pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado), foi assinado na terça-feira (20) e obtido pela Folha de S.Paulo. Nele, são apontadas irregularidades como benefícios fiscais concedidos por meio de decreto do governador, sem passar pelo Legislativo, e gastos insuficientes na educação. O parecer deve ser levado em conta no julgamento das contas de Alckmin e França pelo plenário do TCE, em junho. Em seguida, a decisão será votada pela Assembleia Legislativa, onde o governo costuma formar maioria. Se as contas forem reprovadas, os ex-governadores podem ser alvo de multa e de ação por improbidade administrativa. Alckmin já tem bens bloqueados em uma ação de improbidade relativa à delação da Odebrecht. O Ministério Público de Contas existe desde 2012 em São Paulo e tem opinado desde então pela aprovação com recomendações ou ressalvas das contas dos governadores. Alckmin nunca teve uma conta reprovada enquanto governou o estado. No ano passado, tanto o tucano como o pessebista concorreram nas eleições --à Presidência da República e ao governo de São Paulo, respectivamente-- e foram derrotados. França chegou ao segundo turno com promessas de flexibilizar os gastos do estado e conceder benefícios ao funcionalismo. Um dos alertas feitos no documento trata da publicidade do governo em relação à segurança, uma das bandeiras de campanha de Alckmin à Presidência. o órgão não questiona os gastos com o marketing, mas afirma que o governo não consegue confirmar as informações veiculadas na propaganda. "Claramente não há como admitir que a administração efetue uma publicidade com dados inventados", diz o procurador Rafael Neubern Demarchi Costa no parecer. Já França deu aval político para a Assembleia Legislativa aprovar um aumento do teto salarial estadual de funcionários públicos, de R$ 22 mil para R$ 30 mil, o que beneficiaria os agentes fiscais de rendas, elite dos servidores. A medida foi derrubada pelo Tribunal de Justiça. No parecer de Demarchi Costa, ele diz que não há dados sobre o impacto financeiro que essa medida poderia causar e afirma que a advocacia do estado deve "acompanhar cuidadosamente" a possibilidade de a decisão ser revertida. Para o procurador, os problemas mais graves e que levaram ao pedido de rejeição das contas é que Alckmin e França não sanaram, em 2018, diversas irregularidades apontadas pelo TCE em anos anteriores --e ainda agravaram outras. O relatório aponta que o governo assinou --não é especificado se sob Alckmin ou França-- 16 decretos de redução de ICMS sem passar por aprovação da Assembleia Legislativa, o que Demarchi Costa afirma ser irregular. O procurador mostra que o próprio estado de São Paulo tem questionado juridicamente benefícios fiscais concedidos por outras unidades federativas "apenas com base em decreto do Executivo, sem lei específica". O parecer ainda questiona o que considera "indevida alegação de sigilo" sobre os dados relativos a esses benefícios fiscais. O Ministério Público de Contas pede que seja aberto um processo para apurar responsabilidades e, sendo o caso, aplicar multas especificamente em razão de o estado ter sonegado essas informações e documentos. A recomendação de reprovação se deve ainda à maquiagem em gastos da educação para cumprir percentuais mínimos de investimentos na área. Apesar de alertado sobre a irregularidade da prática, o governo paulista contabilizou despesas com pagamento de aposentados como gastos relativos à educação. A Constituição estadual determina a aplicação de ao menos 30% da arrecadação com impostos no ensino público. Segundo o governo, o percentual atingiu 31,25% em 2018. No entanto, se descontado o gasto com aposentados da área da educação, o total despendido cai para 25%. Desde 2016, o tribunal vem alertando o governo de que, a partir de janeiro de 2018, não iria mais aceitar que gastos com aposentadorias fossem colocados no bojo do ensino. Por isso, o relatório considera haver "motivo determinante" para dar parecer desfavorável. O mesmo acontece com o Fundeb, recurso destinado à remuneração de professores na ativa e a outros gastos de educação, mas que o governo confirmou ter sido usado para pagamento de inativos. OUTRO LADO O ex-governador Geraldo Alckmin, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou confiar que o TCE irá aprovar as contas do governo. Ele ressaltou que o parecer do Ministério Público de Contas é uma etapa preliminar e que o governo paulista irá providenciar as explicações para as irregularidades apontadas. O ex-governador Márcio França, por meio de nota, afirma que o aumento do teto dos servidores é iniciativa de exclusiva competência da Assembleia Legislativa e que não passa pelo Executivo. A medida "foi aprovada contra recomendação contrária do governo e nunca foi colocada em prática, ou seja, não se pagou um único centavo de aumento do teto". Sobre os recursos da educação, a nota afirma que "a Assembleia Legislativa aprovou legislação autorizando contabilizar o pagamento de professores e servidores aposentados como recurso aplicado no setor, como já vinha sendo feito há cerca de 20 anos". França lembra ainda a Constituição do Estado de São Paulo é a única determinar o percentual de 30%, enquanto no restante do país é de 25%.