As guerras nossas de cada dia

Roberto Mancuzo

CRÔNICA - Roberto Mancuzo

Data 15/03/2022
Horário 06:00

A guerra da Ucrânia está longe. A gente até se compadece, mas como costumo ensinar aos meus alunos sobre notícia, um fato ganha em força quanto mais perto está de quem recebe a mensagem. 
Se a guerra não fosse na Ucrânia e sim e um Álvares Machado, em um situação bem hipotética e absurda, mesmo assim com certeza, todos nós aqui em Presidente Prudente estaríamos bem preocupados.
O que não quer dizer que o estado de guerra não esteja perto de nós. Vivemos conflitos diários porque guerra é a ausência de paz.
Se não estamos bem no casamento, no trabalho, junto aos amigos ou consigo estamos em estado de guerra. Alguns mais fortes, outros menos, mas todos eles sem a tranquilidade necessária para tocar a vida.
Fato é que ninguém sai ileso de uma guerra. A questão é saber o quanto vamos perder menos e o quanto também vamos ganhar. 
Na minha mais recente guerra pessoal pude compreender o poder que um conflito de grande porte faz na vida de alguém. Perdi muito, mas também ganhei ferramentas que me serão úteis para o resto da vida. Para mim e ou para quem precisar de meus conselhos daqui para frente. 
Os aprendizados de um conflito são sempre mais interessantes.
Ao final de todo dia de guerra, os generais sentam-se com aliados e avaliam as perdas, mas especialmente pensam em novas estratégias que surgem por conta do que se aprendeu.
Em resumo, a cada cessar fogo, uma experiência acumulada e a chance de novas estratégias. 
Em um desses momentos eu finalmente pude compreender um dos detalhes mais interessantes de uma guerra: ela é sempre anunciada.
Guerras não acontecem assim, do nada, como as brigas na saída da escola. Uma guerra sempre tem uma história mal resolvida, um estado de desequilibro que uma hora se rompe definitivamente. Seja por falta de diálogo, por leniência, que nada mais é do que a mansidão ou lentidão, incompetência, ignorância, desprezo, falta de vontade ou até mesmo descuido.
E depois do dia D, do primeiro tiro disparado, vem o campo de batalha, ou seja, a hora em que os exércitos saem do estado de prontidão e partem realmente para a luta. Esse momento é outra grande oportunidade de aprender porque estamos muito acostumados a ameaçar, mas quando vamos realmente para o corpo a corpo descobrimos que somos muito incompetentes ou até mesmo inocentes demais.
O enrosco aqui se dá porque o agir em uma guerra está sempre ligado à sua conduta moral. Quais os princípios que te regem, que mesmo que não houvesse guerra alguma você não abriria mão? Isso é moral e na hora do confronto ela deve estar mais afiada do que nunca porque está justamente aí a sua paz.
Se agirmos fora dos princípios morais que nos norteiam não temos como exigir do inimigo qualquer tipo de honestidade. E o contrário é melhor: podemos dormir em paz mesmo diante da mais difícil derrota. Por outro lado, é preciso colocar em batalha também a irmã mais próxima da moral, que é a ética. 
Aprendi com o professor Clóvis de Barros que a ética é a arte da convivência e é justamente na guerra que precisamos ter um bocado dela. Sempre acreditei na boa relação entre pares que se colocam em confronto. Há briga sim, há rancor, mas deverá haver ali um mínimo de convivência que traga mais para frente o que os dois lados desejam: a paz. 
Ser ético nesta hora é saber superar muita dor e ser mais humano do que o normal, mas eu vejo, hoje, com minha guerra chegando ao final das batalhas, que é a forma mais eficaz de sobreviver e viver em paz. 
Enfim, se posso dar um conselho útil a quem está em guerra ou percebeu que vai entrar em uma é este: busque a ética e mantenha a moral. O resto é bala perdida.

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