Mulher Maravilha

Persio Isaac

CRÔNICA - Persio Isaac

Data 27/03/2022
Horário 06:30

Lembro da primeira vez em que a vi. Foi na piscina grande do Tênis Clube em que ela vestia um maiô verde musgo e elegantemente subia a escadinha da piscina. Os raios de sol refletindo em seu belo corpo a luz e o calor no seu delicado rosto de Audrey Hepburn. O sol jamais vê sombras, parecia que ele morava dentro dela.  Meus olhos a acompanharam e, em cada passo que dava, um brilho saía dos seus olhos iluminando o seu charme que fez um rapaz sorrir, era seu namorado. 
Muitas vezes um desejo nasce e morre no mesmo instante. A vida continuou seu caminho e eu continuava dançando a dança da solidão. Minha irmã Mariza me falava que tinha conhecido uma menina que tinha tudo a ver comigo, insistia sempre em falar dela e eu continuava abatido pela desilusão, estava abraçado no desalento. Nem imaginava que essa menina seria aquela do maiô verde musgo que fez meu mundo parar por um instante. 
O destino foi generoso, nos colocou na boite do Tênis e ali conversarmos sobre o filme “Superman” e combinamos de nos encontrar em São Paulo, já que morávamos na grande metrópole. Ela estudava Biblioteconomia e seu grande sonho era ser uma arqueóloga. Namorar uma Indiana Jones seria uma vida de aventuras, não acham? Mas a desilusão permanecia no meu coração que era uma urna fria, sem grãos de ilusões em minhas mãos. Tinha largado o quarto ano de Psicologia e tocava bateria nos bares e boites de São Paulo para sobreviver. Morava na Rua Frei Caneca com meus queridos amigos Zé Roberto e Tiago Marcondes. 
Ela tomou a iniciativa e foi até o apartamento e deixou um bilhete para que eu ligasse. Achei legal e tomei coragem, não poderia ser mais um covarde do afeto e fui até um orelhão e liguei. O medo me dominava, a baixa autoestima sorria. A voz dela me deu motivação e começamos a sair. Realmente minha irmã Mariza tinha razão, nossa empatia foi total. Pedi ela em namoro na casa do meu querido Tio Nerinho e dançamos cantando um samba de Martinho da Vila.  
Depois de algum tempo, contei a minha grande desilusão e pedi paciência, tinha que ser honesto comigo mesmo e com ela. Com apenas 18 anos ela me disse: nunca perca teu orgulho, eu gosto da sua personalidade e de teus sonhos. Eu com meus 26 anos fiquei impressionado com esse choque positivo de autoestima, com essa dignidade feito uma rocha e percebi que estava diante de uma menina mulher de princípios nobres e que tinha os olhos voltados para o meu caráter, para minha personalidade e para  meu coração. 
Uma das cenas mais fortes que guardo é ela sentada na mesa do Bar Epílogo sozinha esperando acabar meu trabalho com minha querida amiga Ana Caram. Ela gostava que eu cantasse o samba de Paulinho da Viola: "Que voltarei depressa/ tão logo a noite acabe/ tão logo esse tempo passe/ para beijar você...”. Depois íamos embora no meu velho Fusca azul onde a bola do câmbio saía em cada marcha que eu trocava e nós ríamos na madrugada sob a luz pálida da lua. 
Mulher Maravilha me deu duas filhas maravilhosas, a Luiza e a Flávia, me deu força em busca do futuro, acreditou em mim e me mostrou que o amor é a força maior que pode mudar tudo. Uma neta abençoada chamada Isabel é o nosso maior tesouro nesse mundo. Lembro que no dia do meu casamento, quase na hora de ir para a igreja, abri o guarda-roupa e apavorado gritei: Cadê meu terno? Tinha esquecido de buscar lá na loja do seu Garrido. Fui correndo com meu amado primo Marcelo buscar o precioso terno. Que sufoco. Escrevi essa crônica escutando o samba, “Mulher Lunar”, de Moacir Luz e Aldir Blanc, e essas frases dessa letra poética resumem meu sentimento pela Mulher Maravilha. 
"E me ocorre
 Que eu nem cantava e você já sorria
 Eu nem sonhava e você já sabia
 Que viria ser minha inspiração"...

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