O homem que não foi ao seu próprio velório

Roberto Mancuzo

CRÔNICA - Roberto Mancuzo

Data 09/11/2021
Horário 06:00

Uma carona na estrada e lá estava eu, duas semanas depois, em frente aquele argentino enorme, corpanzil, barriga proeminente, que era mantida apenas pelo suspensório. Era Raul Melo, o homem por trás da primeira emissora de TV a cabo do Brasil. Pelo menos, isso estava escrito na placa quando cheguei em 1996 para trabalhar e era bem verdade. 
Como eu sou grato a este homem, que nos deixou no mês passado, sem receber a mesma importância que um dia já teve! 
Este mesmo homem olhou para dois pequenos seres saídos de uma universidade pública, eu e minha amiga Ana Paula Silva, e encontrou ali uma chance de investir em um telejornal rural. Sua empolgação era devastadora. 
Lembro bem quando olhou para mim, pela primeira vez, disse: “Vocês vão ser um sucesso. Vamos fazer as fotos do banner e do outdoor”. Fomos um sucesso? Sim. Não digo desses tipo “Big Brother”, mas no mínimo o programa “Atualidade Rural”, voltado para questões do dia-a-dia agropecuário da região, no colocou no mapa. 
Quase um ano de programa, muita ralação e a poeira de estrada, e a primeira proposta para o jornalismo diário, no caso do jornal Oeste Notícias. Dali para frente, foi só história até hoje, com 46 anos bem vividos e cumpridos em uma das profissões mais lindas e importantes que conheço, o jornalismo.  
É, seo Raul, queria tanto dizer ao vivo ao senhor o quanto a sua generosidade fez este homem aqui crescer na vida. E não digo por obrigação e sim por muita verdade. Porque qualquer um que conseguisse superar a casca grossa que o encapava conseguiria ver ali um visionário, um homem para além do seu tempo, entre o pioneirismo dos cursos de computadores, em uma época que era tudo muito arcaico, passando pela inauguração de uma emissora de TV a cabo até as experiências de hidroponia e aeroponia.
Seo Raul, o senhor se foi e eu nem sequer estive no seu velório. Aliás, nem, o senhor, né? Esta frase era marcante dele. Dizia que iria a todo lugar neste mundo, mas nunca no próprio velório. 
Mas tudo bem, o que posso garantir e prometer ao senhor hoje é que eu sempre vou olhar com carinho para todos aqueles que procurarem por mim e pedirem por uma chance. Foi o que aprendi com muita humildade nesta relação tão bonita que o senhor nos proporcionou. 
Obrigado por acreditar em mim e peço agora que olhe por nós aqui neste Brasilzão, que o senhor tanto amou e tanto quis bem. Fique em paz, seo Raul.
 

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