Precisamos falar sobre fome

Roberto Mancuzo

CRÔNICA - Roberto Mancuzo

Data 27/04/2021
Horário 06:00

Eu não tenho lugar de fala neste tema de hoje. Até porque o que eu sei sobre ele? Uma coisa é estar com fome e ir até a cozinha e resolver a questão ou se dirigir ao supermercado e dar um jeito. Outra, totalmente diferente, é passar fome e aí é que digo que nunca aconteceu comigo. 
O mais perto que cheguei desta condição sofrida foi em entrevistas que fiz com pessoas que me relataram não saber o que fazer naquele mesmo dia para dar de comer às crianças. 
Você consegue entender o que digo? Passa pela sua cabeça como é o desespero de um pai ou de uma mãe que não imagina sequer como irá sustentar minimamente seus filhos em uma única refeição? E na próxima? A fome é algo muito longe da realidade da maioria dos milhões de brasileiros, mas é uma sombra que assusta ou já atingiu outros milhões e por isso precisamos tocar neste assunto.
Neste sentido, o que tenho como lugar de fala é a compaixão. Compadecer-se com o outro é sofrer com ele, vivenciar a dor, mesmo não estando na condição de dor. A compaixão leva a atitudes práticas importantes porque apesar de notadamente sermos diferentes em status social, chegamos sempre à conclusão que pertencemos à mesma condição humana e assim agimos. Não é ter empatia, termo bonitinho de nossa época, mas que se reduz apenas a perceber-se no lugar do outro. Podemos até ficar tocados quando somos empáticos, mas logo sentimos o alívio de não estarmos lá naquele lugar de verdade e agimos pouco. 
Ter empatia é pouco perto da fome. Compaixão é tudo. 
E olha, psiu! Não finja que não tem nada com isso, porque como diz David Hume, no Tratado da Natureza Humana (1739), "Ninguém é completamente indiferente à felicidade ou à miséria dos outros". 
Todos precisamos agir sim. Especialmente em momentos de crise como a que passamos por conta da pandemia. Esta doença horrível, as consequências em um país extremamente desigual e poderes que mais erram do que acertam jogaram para a condição de fome pelo menos mais de 20 milhões de brasileiros, segundo o site Brasil Sem Fome. São pessoas que vivem com menos de R$ 157 por mês, em extrema pobreza. Perto deste número, segundo o site, são 63 milhões de pessoas em estado de pobreza, ou seja, com renda menor de R$ 455 por mês. Estamos muito perto, se é que já não estamos, de voltar ao Mapa da Fome global.
Existem muitas maneiras de ajudar e sites como o “Ação da Cidadania”, que colocam muitas opções de doação, espaços, comunidades e instituições que precisam de auxílio. 
Mas vale também lembrar que aí perto de você pode ter alguém com fome e como disse o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, certa vez, “quem tem fome tem pressa”. Agora não é hora de ensinar a pescar. Agora, precisamos resolver.
Cidadãos e empresas, procurem por igrejas, templos e organizações não-governamentais ou simplesmente façam contatos com assistentes sociais, vão direto à fonte. Vocês verão que é mais simples do que imagina e assim começarão a desenvolver a compaixão e a preencher um espaço que quando não é ocupado por políticas públicas de qualidade, gera morte e um futuro incerto a muitas pessoas. 
Vamos juntos?
 

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