Reeducação cultural é necessária para desenvolver masculinidade saudável

EDITORIAL -

Data 19/01/2019
Horário 04:05

Nos últimos dias a imprensa tem voltado seus holofotes para um caso bastante preocupante, de denúncias de abusos sexuais sofridos por pelo menos 37 mulheres (o número cresce a cada dia) por um profissional da área da medicina de Presidente Prudente. A história é preocupante, justamente por reverberar uma realidade na vida de muitas mulheres: o quão vulneráveis elas estão, mesmo diante de circunstâncias formais, como buscar atendimento em um consultório médico.

Isso se dá, sem dúvida, pela ação de um indivíduo (no caso, o acusado) mas também é inegável que existe um contexto social que influencia nesse tipo de ocorrência, que faz com que o agressor saiba que sairá impune, tendo a certeza de que a vítima permanecerá calada, com medo, e mesmo que resolva expor o ocorrido terá seu relado desacreditado. Há uma opressão estrutural que envolve as relações de poder entre homens e mulheres, que silencia e aterroriza um lado, enquanto ameniza as ações e negligencia as responsabilidades do outro. Embora existam excessos nos movimentos sociais que lutam contra a estrutura e que por vezes a militância perca a razão, a realidade de que o sistema existe não pode ser negada.

Não existe caminho fácil para resolver a questão, pois é algo implícito, enraizado e naturalizado na cultura ocidental. Para viabilizar essa mudança é necessário criar uma nova consciência de masculinidade saudável no mundo moderno, do que é assédio e uma compreensão mais acurada a respeito das palavras e ações que invadem o espaço do outro. Entender que as mulheres não são objetos, que seus corpos não estão à disposição e que não é aceitável violá-los de qualquer forma que seja.

A resistência durante o processo de “reeducação” é inevitável. A título de exemplo, recentemente uma grande marca de barbeadores fez um comercial que denuncia e reflexe sobre o mau comportamento masculino, a qual foi alvo de críticas e boicote pelos rapazes que se sentiram pessoalmente ofendidos com a propaganda (ainda que ela não apontasse nenhum indivíduo específico, falando apenas de uma forma generalista sobre um problema que é real e comum).

Apesar do cansaço e do desgaste daqueles que tentarão impedir avanços e a perda de seus privilégios, iniciar esse processo de reconstrução de valores é urgente e pode salvar inúmeras vidas e impedir novos abusos e assédios. A sensação de impunidade e o silêncio das vítimas impede o processo de responsabilização dos agressores e faz com que eles se sintam invencíveis, o que os estimula a perpetuar os maus comportamentos. A jornada não é fácil e dificilmente os militantes sairão ilesos dela. Ainda assim, é o preço a se pagar por um mundo mais igualitário.

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