Regras patrimoniais no casamento e o pacto antenupcial

Bruna Melo

COLUNA - Bruna Melo

Data 08/01/2021
Horário 06:00

Quando o assunto é o aspecto patrimonial no casamento, existem diversas dúvidas e o presente artigo visa esclarecer algumas. É muito saudável falar sobre as regras financeiras do casamento antes mesmo da formalização. Deixar bem esclarecido para ambas as partes referidas normas, para evitar futuros mal entendidos durante o casamento ou mesmo para o caso de um futuro divórcio ou uma sucessão. Partindo da premissa que a organização e transparência é salutar para um relacionamento, quais as principais regras patrimoniais e suas consequências no casamento?
O pacto antenupcial é um contrato celebrado pelos noivos para estabelecer o regime de bens e as relações patrimoniais que serão aplicáveis ao casamento. Há uma liberdade para estipular as regras e, caso queiram, os noivos podem escolher um regime tipificado na legislação ou algum atípico ou híbrido, conforme o caso concreto. A liberdade na escolha das regras patrimoniais não é absoluta, pois não pode violar algumas normas chamadas de ordem pública previstas, como por exemplo, as regras patrimoniais relativas à sucessão por morte, presunção de paternidade, assim como deveres decorrentes do casamento.
O regime legal aplicável no Brasil a partir de 1977 com a Lei Federal 6.515 é o regime da comunhão parcial de bens, que significa que somente haverá comunhão nos bens adquiridos onerosamente na constância do casamento, ou seja, os bens recebidos por doação ou inventário e adquiridos anteriormente ao casamento são tidos como particulares e não se comunicam, e os bens sub-rogados em seu lugar. Antes da referida lei, o regime legal era o da comunhão universal de bens (todos os bens em regra comunicavam).
Há previsão legal para aplicação do regime da separação obrigatória de bens em alguns casos específicos, previstos no artigo 1.641 do Código Civil, como por exemplo, da pessoa que vier a casar e possuir 70 anos ou mais. E o que isso significa? Nas hipóteses tratadas no referido artigo, os noivos não poderão escolher o regime de bens, a separação será imposta pela lei. Neste regime, porém, para evitar que um dos cônjuges enriqueça às custas do outro, tem sido aplicada a Súmula 377 do STF (Supremo Tribunal Federal), que estabelece que haverá comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento. A prova do esforço é questão controversa na jurisprudência pátria e atualmente as decisões dos tribunais superiores estão no sentido de presumir o esforço na aquisição dos bens (STJ, REsp 1.171.820 PR, Min. Sidnei Beneti).
No caso de opção do regime legal, não é necessária a lavratura do pacto antenupcial. Sendo muito comum a lavratura do pacto antenupcial para a escolha do regime da separação convencional de bens (não comunica nenhum bem) e comunhão universal de bens (comunicam todos os bens). Como mencionado acima, é possível a escolha por pacto atípico ou híbrido. Por exemplo, a escolha das regras da separação total de bens excluindo um único imóvel que será comum.
A escolha pela separação convencional de bens tem repercussão nas operações de venda e compra de imóveis. Nos casos da comunhão parcial de bens e comunhão universal de bens, quando na venda de um imóvel, o cônjuge deve comparecer na escritura pública como proprietário (comunhão universal) ou anuente (comunhão parcial de bens no caso de bem particular), enquanto na separação convencional de bens a presença do cônjuge não se faz necessária, havendo maior autonomia.
O regime que vigora no casamento tem repercussão no direito sucessório, uma vez que conforme artigo 1.829 do CC/02, por exemplo, não é tido como herdeiro no inciso primeiro (concorrência dos filhos com o cônjuge) aqueles que se casam no regime da separação obrigatória, ao passo que aqueles que se casam no regime da separação convencional de bens herdará. No que tange ao inciso segundo (concorrência dos pais com o cônjuge) independente do regime de bens o cônjuge herdará.
O pacto antenupcial é obrigatoriamente feito por escritura pública no cartório de notas e, posteriormente, deve ser levado ao cartório de registro civil onde será realizado o casamento, bem como, após a celebração do casamento, ao cartório de registro de imóveis (registrado no Livro 3) do primeiro domicílio do casal para produzir efeitos perante terceiros e averbado na matrícula dos bens imóveis do casal.
O regime de bens começa a vigorar a partir da data do casamento e somente poderá ser alterado mediante autorização judicial. Há um debate jurídico sobre se, uma vez feito o pacto antenupcial, este pode gerar efeitos para uma união estável no caso da não realização do casamento, ou seja, conversão de pacto antenupcial em contrato de convivência. O tema é polêmico, porém me filio à corrente pela possibilidade, com viés de valorizar a autonomia privada manifestada pelas partes no pacto (STJ, REsp 1.483.863/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, , DJe 22/06/2016).
Para a lavratura do pacto antenupcial, é necessário o comparecimento das partes ao cartório de notas de confiança antes da realização do casamento, portando documentos pessoais (RG, CPF e certidão de estado civil originais). O valor da escritura de pacto antenupcial no Estado de São Paulo é equivalente à de uma escritura sem valor declarado que fica em R$ 473,82 (incidência de ISS de 5%).
 

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