De acordo com as estatísticas mais otimistas, enquanto você faz a leitura desta crônica, um jovem negro foi morto em algum canto do Brasil. Anualmente, calcula-se que são assassinados no país mais de 20 mil negros entre 15 a 29 anos. São mais de 60 mortos por dia!
Diante de uma realidade tão brutal, como a que assistimos a semana que passou lá no Complexo do Alemão (Rio de Janeiro), precisamos lutar permanentemente para que as perdas dessas vidas não sejam naturalizadas, como se passassem apenas de mais uma notícia veiculada pela televisão e as redes sociais. Gente que vira número. Gente que vira tese de doutorado. Gente que vira um pontinho no mapa....
Pois eu não quero esquecer os nomes desses meninos e meninas. Quero guardar onde moravam. Lembrar de cada um deles. Daqueles três jovens mortos esse ano na comunidade de Gamboa, em Salvador: Alexandre dos Santos, 20; Cauê Guimarães, 22; e Patrick Sapucaia, 16. Lembrar também de Eduardo de Jesus, o menino de 10 anos que foi morto em 2015 lá no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. E Ana Paula Santos, a mocinha de 20 anos que estava grávida de nove meses quando foi morta na cidade de Santos em 2020. Ou a barbaridade da morte de João Pedro de 14 anos com um tiro pelas costas lá no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo (RJ) em 2020!
A violência não atinge apenas as crianças e adolescentes brasileiros. Fico imaginando a tortura que é a vida das mulheres negras, especialmente as mães desses jovens assassinados. E dos policiais, que não são apenas os principais agentes da violência, mas também vítimas dessa tragédia nacional. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a polícia brasileira está entre aquelas com o maior número de mortes em serviço no mundo...tristes estatísticas que nos fazem lembrar que “são quase todos pretos/Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres”, como nos ensina a nossa diva Elza Soares.
De fato, não existe branco puro em lugar nenhum. Outro dia eu ganhei um teste de linhagem genética e fui informado que o meu DNA indica que 86% da minha ancestralidade é proveniente da Europa, especialmente da Península Ibérica (meu avô paterno era português). Mas apareceu também 3% de traços genéticos africanos da Senegâmbia, região geográfica que engloba atualmente os países Senegal, Gâmbia e Guiné-Bissau. Ou seja, as vidas negras estão por toda parte e realmente importam! Numa sociedade racista não basta não ser racista, é preciso ser antirracista. Sejamos!