​​​​​​​“Somos contrários a política de flexibilização adotada pelo governo”

Raul Borges Guimarães, professor e pesquisador

REGIÃO - ROBERTO KAWASAKI

Data 14/06/2020
Horário 10:00
Foto: Reprodução: Grupo tem acompanhado diariamente a difusão do vírus pelo território paulista
Foto: Reprodução: Grupo tem acompanhado diariamente a difusão do vírus pelo território paulista

O cenário de pandemia da Covid-19 gera medo e incerteza quanto à evolução da doença no Brasil. No mês passado o Estado de São Paulo anunciou a retomada consciente da economia, o que trouxe expectativas quanto a um novo cenário que estava por vir. No entanto, o recuo da fase de flexibilização na região de Presidente Prudente e em outras duas do Estado trouxe novamente a discussão sobre a evolução do vírus. Na edição de hoje, o professor e pesquisador, Raul Borges Guimarães, faz um panorama sobre a situação atual e o que esperar das próximas semanas.

O Imparcial: Atualmente, o senhor faz parte de uma rede de pesquisadores da Unesp mobilizada a estudar o vírus em conjunto com outras universidades públicas. Gostaria que falasse brevemente sobre o que está sendo analisado, desenvolvido pela equipe.
Raul: Desde a entrada do novo coronavírus no Brasil, no final de fevereiro, temos acompanhado diariamente a difusão pelo território paulista. Por meio de uma análise de estatística espacial, identificamos que a difusão da Covid-19 no país se comporta de acordo com o modelo hierárquico, segundo o qual a rota de dispersão do vírus segue das cidades maiores para as menores. A partir dessa análise, identificamos 13 cidades mais importantes do interior paulista que poderiam se tornar centros dispersores da doença em sua região, sendo Presidente Prudente uma delas. Infelizmente, nossa previsão estava correta.

Na semana passada, o Governo do Estado de São Paulo anunciou o recuo da fase de flexibilização na região de Presidente Prudente. Como analisa esta situação?
Somos contrários a política de flexibilização adotada pelo Governo do Estado de São Paulo. Isso porque as tendências analisadas são de crescimento, tanto do número de casos confirmados de Covid-19 como da taxa de ocupação dos leitos de UTI [Unidade de Terapia Intensiva] para pacientes Covid-19. Mantidas a atual taxa de crescimento observada para o número de casos [da doença], e o tempo médio de internação, estimamos uma taxa de ocupação de 63% para os leitos de enfermaria e 95 % para os leitos de UTI daqui a 4 semanas. 

O que pode ser feito diante desse cenário?
Para continuar aprofundando essa análise e atualizando semanalmente essas tendências, a equipe da Unesp, sob minha coordenação, se prontifica a continuar colaborando com as autoridades locais e regionais. Para nos adaptar a essa nova política e conseguirmos avançar nas medidas de flexibilização, teremos de realizar grande esforço para o aprimoramento do planejamento de medidas de emergência da saúde pública diante da pandemia da Covid-19.

Durante a retomada consciente da economia, nas primeiras semanas de junho, a população foi às ruas e lotou o centro de Prudente. Inclusive, havia pessoas não fazendo o uso das máscaras de proteção. Será que após esse recuo anunciado na semana, a comunidade vai realmente se conscientizar?
Temos insistido que a única medida eficaz para superarmos essa situação de emergência em saúde pública, é preciso ouvir os médicos especialistas no assunto, especialmente, os epidemiologistas e os infectologistas. Infelizmente, vivemos em um país dividido pela disputa ideológica e disputa de narrativas. Até hoje existem pessoas que querem comparar as mortes pela pandemia com o total de mortes de outras doenças, como o câncer, por exemplo. Segundo os infectologistas, são dados incomparáveis. Os epidemiologistas conseguem prever, aproximadamente, quantos serão os óbitos por câncer ou por problemas respiratórios a cada ano. Uma doença de transmissão viral é completamente diferente. Se perdermos o controle da disseminação da doença, o resultado será dramático em perdas de vidas. É isso que se quer evitar. 

Como analisa a questão econômica no cenário de pandemia?
A crença de que o isolamento social é que está regando a crise econômica é uma narrativa que parece ter virado consenso na opinião pública; é exatamente o contrário. Não temos como sair dessa crise econômica sem respeitar o isolamento social, para que possamos nos livrar mais rapidamente da pandemia. De fato, a crise econômica está relacionada à demora do governo federal em ajudar as pequenas e médias empresas, dificultando o acesso aos 600 reais para as pessoas mais pobres, e atrasando enormemente o repasse de recursos para os municípios poderem pagar suas contas. No mundo inteiro, o Estado apoiou rapidamente e com muita força as empresas e a população com maior dificuldade. Então, são duas agendas importantes. A superação dos problemas da saúde pública é condição para a vida voltar ao normal. E o Estado terá de ajudar a todos, como está ocorrendo nos principais países do mundo.

 

Nome: Raul Borges Guimarães
Ocupação: Professor titular do Departamento de Geografia da FCT/Unesp (Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista) em Presidente Prudente.
Contatoraul.guimaraes@unesp.br | Instagram: @fala_raul

 

 

 

 

 

Publicidade

Veja também