A insustentável leveza de ser

Persio Isaac

CRÔNICA - Persio Isaac

Data 05/04/2020
Horário 06:44

Todo amor traz uma bagagem positiva ou negativa. Todo amor tem tristeza e alegria, tem castigo e tem perdão. Sempre um vai sofrer mais que o outro. Essa dualidade é inevitável. Os covardes do afeto nunca vão chorar por amor, fogem dele como o diabo da cruz. O medo de amar é o refúgio, a desculpa esfarrapada de quem não quer carregar compromissos. Cada um de nós experimenta de formas variadas o peso insustentável da vida.

Como disse Belchior na sua bela canção “A Divina Comédia Humana”: "O amor é uma coisa mais profunda que uma simples transa sensual". Uma letra bastante reflexiva, uma filosofia de vida. O autor tcheco, Milan Kundera, no seu livro, “A insustentável leveza do ser” usa teorias de Nietzsche, Sartre e até mesmo a filosofia pré-socrática de Parmênides, que dissertava sobre a relação peso/leveza, a problemática da dualidade do ser humano e apontava que o ser é "imóvel, imutável, eterno e infinito". Ele diz em seu livro: "Não há nada mais pesado do que a compaixão. Mesmo a nossa própria dor não é tão pesada como a dor co-sentida com outro, por outro, no lugar de outro, multiplicada pela imaginação, prolongada em centenas de ecos".

Muitas pessoas se recusam a carregar o peso da vida como o médico Tomas, personagem do livro, que depois de um divórcio conturbado, escolhe o caminho da frivolidade. Não quer compromissos. Suas relações com outras mulheres se resumem apenas a sexo casual. Quer ser livre das amarras que o amor exige.

Outras mulheres vivem como a personagem Tereza, mulher dependente, sufocada com tantos desejos reprimidos, vivendo uma vida triste, entregando muito de si mesma aos outros sem ter a devida compensação afetiva. Acaba se envolvendo com Tomas, cometendo traição fruto dos seus desejos escondidos e reprimidos. A moral judaica cristã a culpa mais ainda. O peso que ela carrega é totalmente contrário de Sabina, que representa a própria leveza de ser. Mulher decidida, descompromissada, livre, empoderada e que vive uma relação erótica com Tomas, que sofre vendo Tereza sofrendo com suas traições.

O outro personagem é Franz, professor universitário que representa o amor-sonhador, romântico e persistente. Esses quatro personagens representam em grande parte a nossa fragilidade, nosso caos interior, nossa busca para encontrar uma forma de sermos felizes e leves. O peso da vida para o autor está em toda forma de opressão.

Na vida, procuramos  escolher  aquilo que pensamos que é leve, e queremos que seja leve, mas com o tempo vamos sentir um peso insustentável. O amor se instala e sobrevive a partir da fragilidade, da vontade de ser vulnerável e aceitar a vulnerabilidade do outro. Quem realmente ama renuncia seu próprio bem estar em função do bem estar do outro. Amor é renúncia.

 

 

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