O paleontólogo William Nava, há duas décadas dedicado a escavações e pesquisas no interior paulista, celebra uma das maiores conquistas de sua carreira: um artigo de seis páginas na revista científica Nature, considerada a mais importante do mundo. A publicação destaca a descoberta de uma ave pré-histórica fossilizada na região de Presidente Prudente, que pode representar um elo evolutivo entre espécies do período dos dinossauros e as aves modernas.
“Para mim, é o auge da minha carreira. São 32 anos de paleontologia, e ver um fóssil de Prudente na Nature é um privilégio imensurável”, afirma Nava, emocionado.
A história começou em 2004, quando Nava identificou vestígios fósseis em um terreno baldio na região dos Três Rios, zona sul de Presidente Prudente. Na época, o local não possuía nenhuma proteção e era usado como depósito de lixo e queimadas. Mesmo assim, o paleontólogo notou rochas com estruturas curiosas.
“Foi uma intuição. Vi algo diferente nas pedras. Coletamos e, junto com o professor Herculano Alvarenga, de Taubaté, percebemos que eram fósseis de aves do período Cretáceo”, explica.
Ao longo dos anos, Nava persistiu nas escavações, muitas vezes sozinho, resgatando peças frágeis que poderiam facilmente se perder com o tempo.
Batizada de Navaornis, em homenagem ao próprio paleontólogo, a ave descoberta em Prudente viveu há cerca de 70 milhões de anos e reúne características de aves muito primitivas, como a Archaeopteryx, e também de aves atuais. A caixa craniana tridimensionalmente preservada possibilitou estudos avançados por meio de tomografias feitas em Porto Alegre (RS).
“É de um grupo extinto no final do Cretáceo. Um fóssil raríssimo, porque une traços antigos e modernos. Por isso, é considerada um elo perdido”, destaca Nava.
A pesquisa ganhou amplitude graças à colaboração com cientistas renomados como o argentino Luis Chiappe, do Museu de História Natural de Los Angeles. Juntos, os pesquisadores analisaram os fósseis ao longo de quase uma década até a publicação na Nature, em 2024. O artigo também contou com parcerias com a UnB (Universidade de Brasília) e a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Com apoio dos prefeitos Nelson Bugalho e Ed Thomas, o sítio paleontológico foi cercado em 2020 e batizado como “Sítio Professor Pepe”, em homenagem ao educador prudentino. Placas informativas foram instaladas, reconhecendo o valor científico e histórico do local.
“Presidente Prudente precisa se orgulhar disso. Poucas cidades no mundo têm um fóssil com esse grau de importância. A ciência está mostrando isso ao planeta”, afirma Nava.
Atualmente, os fósseis coletados estão armazenados e catalogados no Museu de Paleontologia de Marília, que possui estrutura especializada e é referência na região. Nava reforça que os fósseis pertencem à União, não a uma cidade específica, e podem ser depositados em qualquer museu ou universidade do Brasil.
“Enquanto Prudente não tiver um museu paleontológico com estrutura adequada, o destino dos fósseis seguirá sendo instituições preparadas para conservá-los e estudá-los. Pretendemos continuar escavando na área, pois é parte de um projeto científico, mas, futuros fósseis coletados, poderão ficar em Prudente se houver quem faça a curadoria, que entenda do assunto e que eles possam ficar disponibilizados para estudos por outros pesquisadores,e não apenas estudados por uma única instituição”, diz.
Além do prestígio internacional, William Nava inspira jovens cientistas e reforça a importância da valorização da ciência no interior do Brasil. Mesmo com recursos limitados e enfrentando o descaso por anos, ele persistiu.
“Fiquei escavando por 20 anos aqui sem ninguém se interessar. Agora, com a Nature, a cidade está no mapa mundial da paleontologia. Isso é ciência funcionando. É assim que crescemos como sociedade”.
Foto: Sinomar Calmona
Professor William Nava: “É o auge da minha carreira. São 32 anos de paleontologia, e ver um fóssil de Prudente na Nature é um privilégio imensurável”
Artigo de seis páginas na mais importante revista científica mundial sobre ave descoberta em Prudente, que viveu há cerca de 70 milhões de anos e reúne características de aves muito primitivas, como a Archaeopteryx
Professor William Nava passou 20 anos pesquisando achados no Sítio Paleontológico de Prudente