Conversa de meninos

OPINIÃO - Raul Borges Guimarães

Data 27/02/2022
Horário 04:30

Outro dia um menino me perguntou o que eu fazia quando era pequeno, uma vez que não existiam videogames, celulares e nada do universo digital. Eu simplesmente disse a ele que brincava na rua. Eu fazia malabarismo no muro entre a minha casa e a do vizinho, brincava de esconde-esconde no fundo do quintal da casa da minha avó, soltava pipas e colecionava bolinhas de gude. Era um mundo que acontecia antes das crianças irem para a escola.
Como o meu pequeno amigo frequenta a escola desde quando largou as fraldas, percebi que ficou com pena de mim. “Quer dizer que a minha mãe só me levou para a escola quando eu tinha 6 ou 7 anos?”, dizia o menino. Ele não conseguia imaginar como era possível crianças caminharem livremente pelas ruas e inventarem tantas coisas malucas para fazer durante o dia e passou a me procurar para eu contar as minhas peripécias infantis.     
Conviver com as crianças detona em mim uma sequência de situações vividas quando eu era muito pequeno. Lembro-me do aparelho de televisão chegando em casa. A programação começava no final da tarde e terminava lá pelas 10 da noite. Lembro-me da dificuldade para telefonar para a minha avó em Uberlândia. Não era uma ligação direta. Era preciso solicitar à telefonista da cidade e aguardar numa fila de espera (não raras vezes por mais de uma hora) até ela nos chamar. Eu contei para o menino sobre o meu espanto quando o primeiro homem pisou no solo da lua. E descrevi o entusiasmo das crianças para participarem das primeiras campanhas de vacinação infantil que aconteceram no Brasil!
Diante das minhas histórias malucas, o meu pequeno amigo reage de muitas maneiras. Em geral, ele dá muitas risadas, imaginando como devia ser difícil viver naquele tempo dos dinossauros! E no meio deste jogo de imaginação, eu o desafiei a pensar no que ele vai contar para as crianças quando for velho. O menino olhou bem nos meus olhos e rapidamente começou a brincar de vovô contando histórias para os netos. Ele começou a lembrar do tempo que sobreviveu isolado em casa, sem poder brincar com outras crianças, por causa de uma terrível doença que se espalhou pelo mundo. Ele contou que viu na internet crianças fugindo de uma guerra ou sendo mortas no meio de um bombardeio. Falou do medo que sentiu quando tomou a vacina porque o pai dele teve que brigar com todo mundo para convencer que aquela injeção era importante. 
Diante daquele espaço do faz de conta, eu me encantei com a força transformadora das brincadeiras. Não existe uma criança que não saiba brincar!
 

Publicidade

Veja também