Pesquisadora é premiada com US$ 50 mil para investir em projeto de conservação do mico na região

Gabriela Rezende é coordenadora de programa que visa melhoria da qualidade do habitat da espécie, que tem presença predominante no Pontal do Paranapanema

REGIÃO - DA REDAÇÃO

Data 26/03/2024
Horário 16:28
Foto: Leonardo Silva
Gabriela Rezende é coordenadora do Programa de Conservação do Mico-leão-preto na região
Gabriela Rezende é coordenadora do Programa de Conservação do Mico-leão-preto na região

Em comemoração ao mês Internacional da Mulher (março), a Disney Conservation Fund premia 11 mulheres incríveis que causam impacto positivo na conservação em todo o mundo. Gabriela Rezende, coordenadora do Programa de Conservação do Mico-leão-preto na região de Presidente Prudente, uma iniciativa do IPÊ (Instituto de Pesquisas Ecológicas), está entre as premiadas e receberá, além do reconhecimento, o valor de 50 mil dólares para investir no projeto.

Há uma década, Gabriela está na liderança do projeto que deu origem ao IPÊ, organização onde 56% dos cargos técnicos e de gestão são ocupados por mulheres. Nesse período, Gabriela conciliou a coordenação do projeto com um MBA (Mestre em Administração de Negócios, em tradução livre), o doutorado, a gestação e o nascimento de suas duas filhas.

“Fico muito honrada com esse reconhecimento da Disney, afinal neste mês é importante contarmos com ações práticas que reconheçam e apoiem o importante papel desempenhado por nós, mulheres, na conservação de espécies. Com esse recurso será possível avançar nas ações de manejo populacional e do habitat no Pontal do Paranapanema, consolidar nosso programa de Saúde Única, avançar nas pesquisas usando bioacústica e sobre o impacto das mudanças climáticas nos micos, além de desenvolver diversas ações de educação ambiental e comunicação”, destaca a pesquisadora. A Disney Conservation Fund é uma das principais financiadoras do Programa de Conservação do Mico-leão-preto, desde 2005, em diversos ciclos, apoiando ações nas frentes de pesquisa (sobre a espécie e manejo das populações), educação ambiental e conservação (proteção e restauração do habitat).

Entre os principais resultados obtidos pelo projeto junto com uma verdadeira rede de parceiros, apoiadores e financiadores, está a melhoria na situação do mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus) que, em 2008, após 24 anos de ações voltadas à sua conservação, passou de “criticamente ameaçado” para “em perigo” na lista vermelha da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza). O programa tem como desafio, agora, melhorar ainda mais essa situação, passando a espécie para "vulnerável".

Qualidade do habitat

O mico-leão-preto existe apenas no Estado de São Paulo e conta com cerca de 1,8 mil indivíduos na natureza, sendo 60% na região do Pontal do Paranapanema, no oeste paulista. Para melhorar a situação da espécie, as pesquisas de campo do programa embasam ações em três frentes principais: melhoria da qualidade e conectividade do habitat, manejo de populações e educação ambiental.

Na primeira frente são destaques a criação e ampliação de áreas protegidas para a conservação da espécie, como por exemplo a Estação Ecológica Mico-leão-preto (do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) e a ASPE Mico-leão-preto - Área sob Atenção Especial do Estado em Estudo para Expansão da Conservação da Biodiversidade (da Fundação Florestal), além do aumento da conectividade de fragmentos florestais no Pontal do Paranapanema, que orienta os Corredores de Vida, também um projeto do IPÊ.

O maior corredor florestal já restaurado na Mata Atlântica conecta o Parque Estadual Morro do Diabo (da Fundação Florestal de São Paulo) à Estação Ecológica do Mico-leão-preto com 2,4 milhões de árvores, em 12 km. O financiamento da Disney também deu suporte às ações no corredor.

Manejo de populações

Já em relação ao manejo de populações, o programa, desde 1995, tem essa como uma aliada estratégica para garantir a viabilidade das populações. Naquele ano, pesquisadores fizeram a reintrodução de uma população em um fragmento no Pontal do Paranapanema, onde a espécie estava localmente extinta. “O IPÊ acompanha esses grupos de micos desde então e sabemos que essa nova população conseguiu se estabelecer e permanecer na área. Estamos planejando realizar, em breve, um censo para avaliar se essa população é viável ou se precisamos de mais ações de manejo para torná-la autossustentável no longo prazo”, explica a pesquisadora.

Gabriela destaca a importância de alinhar ações de manejo metapopulacional com melhorias do habitat. “O manejo de populações é uma estratégia de curto prazo que deve ser trabalhada junto com o manejo do habitat – a restauração, para garantirmos a sobrevivência das populações”, afirma.

Educação ambiental

A educação ambiental também está na identidade do programa como forma de levar informação científica aos alunos, em especial de escolas públicas, e contribuir com a formação de professores em municípios estratégicos para a proteção do mico no Pontal do Paranapanema. O programa também desenvolve materiais didáticos para orientar ações pedagógicas nas escolas e organiza atividades de contato com a natureza para os alunos da região no Parque Estadual Morro do Diabo, onde está localizada a Trilha do Mico-leão-preto e onde vive a maior população conhecida de micos, com cerca de 1,2 mil indivíduos. Nessas atividades, os participantes têm a chance de ouvir (ou até mesmo ver) os micos e, em algumas ocasiões, contribuir para a melhoria da qualidade do habitat através de ações de plantio de mudas nativas.

Todas essas ações de conservação são pautadas por resultados de pesquisas sobre a ecologia da espécie. Essas pesquisas, realizadas e orientadas por Gabriela, possibilitam traçar estratégias capazes de melhorar a qualidade das florestas para os micos na Mata Atlântica e apoiar os planos de ação para a conservação de primatas no Brasil e no mundo. Medidas nessa direção já incluíram a instalação de ocos artificiais, que são estratégicos para os micos terem onde se abrigar e dormir em florestas fruto de restauração florestal, uma vez que em jovens florestas não há ocos naturais.

A ação dos ocos artificiais (teste do modelo e instalação) foi viabilizada de 2017 a 2020 com recursos da Disney Conservation Fund. Outra pesquisa desenvolvida se refere ao monitoramento de grupos por meio de GPS e acelerômetros (dispositivos presentes na mochila que os micos carregam e que registra todo o movimento feito por eles), que permitiu estimar pela primeira vez o gasto energético diário dos indivíduos. “É como se fosse o primeiro estudo a mostrar que para seres humanos é recomendado o consumo diário de 2 mil kcal e todas as dietas são baseadas nesse valor”, comentou a pesquisadora na época.

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