Simulação testa tempo-resposta no atendimento às vítimas

Ação organizada pela Liga do Trauma e de Cirurgia de Emergência da Famepp/Unoeste mobilizou mais de 550 pessoas; 70 alunos de Medicina representaram as vítimas com maquiagem realística

PRUDENTE - DA REDAÇÃO

Data 21/08/2023
Horário 17:10
Foto: Emerson Sanchez/Unoeste
Simulação resultou no atendimento a 70 feridos, entre leves, graves e gravíssimos; objetivo foi treinar equipes de resgate e instituições diversas
Simulação resultou no atendimento a 70 feridos, entre leves, graves e gravíssimos; objetivo foi treinar equipes de resgate e instituições diversas

Parecia cena de filme, com direito a alguns efeitos especiais como fumaça artificial e maquiagem realística, além de acadêmicos de Medicina dando um show de atuação e representantes das instituições envolvidas realizando seus trabalhos com responsabilidade e maestria, tornando tudo muito real. Assim dá pra resumir a sensação de quem acompanhou de perto a 8ª edição da Simulação de Catástrofe realizada na manhã deste domingo (20), no Prudenshopping, e organizada pela Famepp (Faculdade de Medicina de Presidente Prudente), por meio da Liga do Trauma e de Cirurgia. A proposta de explosão originada por vazamento de gás dentro da praça de alimentação e que resultou em 70 vítimas, entre feridos leves, graves e gravíssimos, foi baseada em um caso real: uma explosão no Osasco Plaza Shopping, no dia 11 de junho de 1996. Na época, 42 pessoas morreram e 372 ficaram feridas.

Para que a simulação realística saísse realmente como o planejado, objetivando principalmente analisar o tempo-resposta e suas variáveis no tempo empregado por cada instituição participante, e que foram acionadas para o resgaste e atendimento das vítimas, foram oito meses de trabalho e várias reuniões de ajustes. Ao todo, 550 pessoas foram mobilizadas, das quais 70 acadêmicos de Medicina a partir do 3º termo (segundo ano), que representaram cada uma das vítimas. A conduta e o desempenho de cada profissional envolvido foram avaliados no transcorrer da ocorrência.

A presidente da Liga do Trauma, a acadêmica do 10º termo de Medicina, Lorena Lex da Motta, considerou o dia como “um domingo histórico”, por se tratar de um treinamento importantíssimo para melhorar os protocolos de atendimento em casos reais de catástrofes, como a simulada ontem. “É um momento de muito orgulho para cada pessoa que está aqui, porque este é um dos maiores treinamentos na área da saúde e que envolve as equipes de resgaste. Importante todos vivenciarem o clima causado nessa circunstância e também a realidade dos hospitais nessas horas. O principal objetivo não foi treinar os alunos apenas, mas todas as equipes que atuam na linha de frente de atendimento às vítimas na cidade de Presidente Prudente”, esclareceu.

A coordenadora de extensão da Famepp, a professora Claudia Álvares Calvo Alessi, complementou dizendo que esse tipo de ação vai muito além das contribuições aos estudantes no que diz respeito aos conhecimentos em relação à urgência, emergência e trauma. “Em especial para a cidade, para verificar se os atendimentos são eficazes. Então, tem muitos órgãos envolvidos, Defesa Civil, Corpo de Bombeiros, hospitais, Unidades de Pronto Atendimento, tudo para verificar o tempo-resposta, seja no atendimento in loco até o tempo do hospital e salas de emergência”, detalhou ela, acrescentando ainda que após a simulação, um estudo baseado nos dados coletados no local e nos hospitais será elaborado para analisar alguns pontos que podem ser melhorados. Esses dados serão discutidos em reuniões posteriores com o objetivo de promover as mudanças necessárias para melhorar o atendimento às múltiplas vítimas em Prudente. O prazo para a análise dos dados que culminará num relatório dos atendimentos, e que será repassado em posteriores reuniões de briefing junto às instituições envolvidas, é de 30 dias.

Maquiagem realística

Assim como a professora Claudia e a Lorena que estavam à frente da organização juntamente com outros integrantes da liga, os alunos que representaram as vítimas e a equipe de maquiagem também precisaram madrugar no maior shopping da cidade. Às 5h todos estavam a postos para começar o trabalho realizado na técnica de “moulage”, que replica o realismo dos ferimentos, queimadura e diversas fraturas no corpo humano. O trabalho foi realizado e supervisionado pelo professor de Artes e coordenador do Programa Unoeste + Cultura, Josué Pantaleão. “Cada equipe foi organizada para ficar com suas maquiagens de acordo com os traumas. Então, foram assim divididos: queimaduras de 1º grau, de 2º grau, hematomas, fraturas expostas. Cada equipe foi capacitada para realizar cada um desses trabalhos específicos. A união foi maravilhosa e deu tudo certo. O trabalho ficou muito parecido com o real, e a maquiagem realística tem esse propósito. Estão todos de parabéns”, elogiava ele.

A estudante do 6º termo de Enfermagem da Unoeste, Joyce Moreira Affonso, era um dos braços no trabalho da maquiagem. Ela tem o curso profissional de maquiagem, mas não exerce no dia a dia. Neste domingo foi peça fundamental para que os ferimentos nas vítimas atingissem o nível de perfeição. “É a segunda vez que participo desses momentos, e é incrível, porque a gente vê as coisas tomando forma por meio da maquiagem. Geralmente a gente vê no dia a dia esses acidentes acontecerem, mas trazer isso na forma artística é algo muito interessante. Aqui vários materiais são usados nessa técnica, até o que a gente acha que nunca vai usar como linguiças de verdade. E é bem interessante essas composições, além dessa brincadeira das cores pra dar aspecto de profundidade nas feridas. O resultado é que tudo se torna muito real para quem está vendo”.

A professora do curso de Enfermagem e orientadora de TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) na Faculdade de Medicina, Elaine Cristina Negri Santos, é outra profissional que ajudou a preparar parte das 70 vítimas envolvidas na simulação. Praticamente uma especialista em “moulage”, ela inclusive já escreveu capítulo de um livro e artigos falando sobre a técnica. Essas publicações acabaram levando Elaine para outros eventos, recebendo convite até para os internacionais. “A moulage tem o objetivo de caracterizar, por exemplo, o que o paciente apresenta: uma lesão, uma ferida, uma fratura. E a finalidade é trazer para o real, para que o estudante ou o profissional que for atender o paciente simulado, se depare com algo que vai encontrar na prática, a exemplo das fraturas expostas. A técnica também tem uma questão pedagógica, pois além da questão visual acaba gerando emoções a quem vai atender o paciente que sofreu lesão, ficou ferido e está com sangramento”, explicou.

Vítimas simuladas

O estudante do 6º termo de Medicina, Thiago Pugliesi Huss, viveu uma das vítimas. A maquiagem feita numa das pernas dele representava com perfeição e riqueza de detalhes uma fratura exposta de patela. “Ficou um trabalho perfeito, tudo muito real, de impressionar. Experiência gratificante saber que estou auxiliando na ajuda do treinamento da cidade pra verificar como está o atendimento, os procedimentos, e se os protocolos estão sendo feitos de forma correta”.

A acadêmica do 8º termo de Medicina, Júlia Dolovet Fidelis de Oliveira, também se surpreendeu com essa mesma experiência. “É um momento muito único e de privilégio poder vivenciar isso, sentir esse clima e ver como a gente pode ajudar os pacientes, o que as equipes de resgate vão fazer, se está certo ou errado. Na vivência a gente observa e fixa muito mais o conteúdo. E poder estar do lado de cá, no lugar de um dos feridos, é um começo pra gente saber como ajudar, como classificar os pacientes feridos, pra onde mandá-los, como comandar uma equipe, poder ver a condutas dos médicos nos hospitais. Tudo muito importante”, considerava.

Foto: Emerson Sanchez

Durante os trabalhos, conduta e desempenho de cada profissional envolvido foram analisadas; briefing de ajustes será apresentado posteriormente

Sirenes em ação

O sistema interno de alarme do Prudenshopping foi acionado pontualmente às 8h, como era previsto. A partir daí, o clima de tensão e o pânico, somado aos gritos de desespero e de dor das vítimas, tomava conta da praça de alimentação. Parecia mesmo tudo real. Por consequência da dimensão da explosão, havia feridos caídos no chão e sobre as mesas. Logo, as equipes de resgate foram acionadas, e o barulho ensurdecedor de caminhões do Corpo de Bombeiros e das ambulâncias que a todo momento chegavam no shopping, chamava muita atenção de quem trafegava pela Avenida Washington Luiz. É que o campo de classificação das vítimas, para onde elas eram levadas depois de serem retiradas de dentro da praça de alimentação, era o hall de entrada do shopping que fica na rampa de acesso pelo piso inferior.

A ação treinou os protocolos necessários e os órgãos envolvidos no atendimento de vítimas na cidade de Presidente Prudente, de forma coletiva.  Por isso a simulação envolveu desde o acionamento do Corpo de Bombeiros, o resgate das vítimas e o atendimento pré-hospitalar, utilizando o método Start (Simple Triage e Rapid Treatment), até a avaliação inicial na sala emergência nos hospitais e UPAs (Unidades de Pronto Atendimento). As vítimas mais graves eram encaminhadas por meio de transporte de ambulâncias para o Hospital Regional Doutor Domingos Leonardo Cerávolo, Santa Casa, além das Unidades de Pronto Atendimento Ana Jacinta e Guanabara, onde foram atendidas conforme os protocolos dos respectivos serviços de saúde.

A acadêmica do curso de Enfermagem e integrante da Liga de Urgência e Emergência, Maria Isabelly Gonçalves Peixoto, era uma das profissionais que ajudava no campo de classificação e vazão das vítimas. O sentimento dela em poder participar do momento era um só: o de gratidão. “Parece muito real, dá a sensação de que a gente está trabalhando de verdade, e isso é importante pra nós também enquanto estudantes para quando isso vier a acontecer, já possamos ter noção de como agir, nos preparando melhor. É estimulante poder estar aqui e eu acho muito importante esse tipo de investimento da faculdade”, resumia, em meio ao atendimento.

Instituições parceiras

Como a ação foi grandiosa, várias instituições foram mobilizadas, entre elas, Corpo de Bombeiros, Grau (Grupo de Resgate e Atenção às Urgências e Emergências), Grupamento de Policia Militar de Presidente Prudente, Secretaria de Saúde de Presidente Prudente, Defesa Civil de Presidente Prudente, REER (Rede Estadual de Emergências de Radioamadores), Cart (Concessionária Auto Raposo Tavares), Serviços de Ambulância 24 horas e Bombeiro Civil, Same (Serviço de Atendimento Móvel e Emergência), Semob (Secretaria de Mobilidade Urbana e Cooperação em Segurança Pública), Unimed, Tiro de Guerra, Prudenshopping, entre outros.

O tenente do Corpo de Bombeiros, Lincoln Ribas, parabenizou o trabalho da Unoeste e de todos os profissionais e estudantes envolvidos no trabalho. “Essa simulação é muito importante pra gente testar nossos protocolos de atendimento, nosso tempo-resposta e também a integração de todos os órgãos de apoio sob a coordenação do Corpo de Bombeiros. Aqui foram testados todos os protocolos, tanto do serviço de atendimento às emergências, quanto das unidades hospitalares. No meu ver, a equipe trabalhou de forma organizada na medida do possível. Devido à quantidade de vítimas demorou um pouco para se estabelecer a normalidade. Mas após estabelecida, com a colaboração de todos, a ocorrência saiu a contento”.

O coordenador de Proteção e Defesa Civil de Prudente, Renato Gouvea, também teceu elogios ao trabalho ordeiro nessa 8ª edição da Simulação de Catástrofe da Famepp. “O papel da Defesa Civil é apoiar em situações de calamidades e catástrofes, e hoje estamos nessa grande integração dos órgãos. Primeiramente precisamos agradecer a Unoeste, grande incentivadora e organizadora desses simulados anuais que são muito importantes para o treinamento das equipes. E mostrar para a população de Presidente Prudente e região que nós estamos preparados para salvar vidas e dar um melhor atendimento se isso vier ocorrer de verdade”.

O subtenente do Tiro de Guerra de Prudente, Jackson Roberto Kohn, coordenou o trabalho 26 de atiradores que ajudaram na remoção das vítimas de dentro do local atingido pela explosão. Ele também ficou feliz em ver o bom desempenho da equipe. “Eu acredito que esse exercício aqui é muito importante para interagir todas as agências envolvidas numa catástrofe desse vulto, e para o Tiro de Guerra com certeza é mais um treinamento num apoio aos bombeiros, aos hospitais e a toda equipe que ajuda numa catástrofe dessa. Um exercício de cidadania também, pois muitos atiradores ajudaram a conter as pessoas que estavam aparentemente mais nervosas”.

Por fim, o médico do Grupo de Resgate e Atenção às Urgências e Emergências, Alexandre Pirineus Cardoso, que comandava o encaminhamento das vítimas aos hospitais conforme a classificação de seus estados de saúde, elogiou o dinamismo coletivo praticado na operação de resgate. “O médico do Grau, quando está na cena, é um médico regulador. Na verdade, eu não tenho ação direta no atendimento das vítimas quando há outros médicos presentes, como foi o caso. Eu avalio que o treinamento é sempre uma coisa para melhorar, para quando ocorrer de verdade as pessoas saibam realmente o que fazer. Posso dizer que foi uma simulação bem válida. Eu conversei com o tenente do Corpo de Bombeiros e a gente viu algumas dificuldades que tivemos durante o transporte dos pacientes, algumas coisas que poderíamos ter mudado e que provavelmente vamos conversar agora e fazer o briefing. O trabalho agora é ajustar com todos para que se caso ocorra de verdade a gente esteja realmente preparado para atender da melhor forma possível”, concluiu.

Fotos: Emerson Sanchez

Campo de classificação das vítimas, para onde eram levadas depois de serem retiradas de dentro da praça de alimentação

Corpo de Bombeiros foi o primeiro a chegar na praça de alimentação para evacuar o local e ajudar no socorro às vítimas graves

Estudante de Enfermagem da Unoeste, Joyce Moreira Affonso ajudou no trabalho da maquiagem realística

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