Solidariedade e voluntariado: um paradoxo brasileiro

OPINIÃO - Blenda Alves

Data 17/09/2022
Horário 04:30

Solidariedade e voluntariado. Palavras que nos remetem a um sentido único, de fraternidade, compaixão, mas que, na prática, revelam-se de forma paradoxal na sociedade brasileira. Temos muitos solidários para poucos voluntários: essa é a realidade que se impõe e exprime a enorme diferença que há entre “ser solidário” e “ser voluntário” em nosso país.
Temos fama de povo caridoso, sempre disposto a intervir em momentos de comoção. Casos como o de Brumadinho (MG) e outros mais recentes, como as chuvas que devastaram cidades do Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco são provas repetidas do imenso altruísmo que mobiliza nossa gente. É indiscutível, somos solidários!
Mas, quando se trata de voluntariado, a situação é surpreendentemente oposta. Só 4% da população se dedica a atividades do gênero, segundo a Pnad Contínua 2019. Nos Estados Unidos, esse contingente supera 30%. Das razões, arrisco apontar aqui, uma delas é a falta de envolvimento das grandes corporações em projetos de voluntariado. Segundo o Datafolha, apenas 15% das atividades voluntárias são organizadas por empresas.
Creio que essa realidade pode mudar justamente com a força do mundo empresarial, que tem pessoas, organização, comunicação e investimento em ações sociais. O trabalho voluntário demanda enorme compreensão de gestão para que seja contínuo; precisa ser desenvolvido de forma racional, ter resultados mensuráveis, ser constantemente avaliado e respaldado por indicadores – exatamente como fazem as empresas.  Além do ambiente corporativo, por sua vez, ter enorme potencial aglutinador, capaz de despertar a transformação de muitos “solidários” em “voluntários”.
A experiência nos mostra isso. Desde 2014 a MRV&CO decidiu fomentar o voluntariado corporativo entre seus colaboradores, com o Instituto MRV, e o incentivo já soma mais de 4,2 mil participações.
A crescente preocupação com a agenda ESG, tendo o voluntariado um aliado estratégico no eixo “S”, é fator importante nessa conjuntura e deve servir para acelerar esse processo – assim esperamos e torcemos.
Até lá, cabe enaltecer essa minoria de abnegados da pátria, nossos voluntários. Em homenagem a eles, que no mês de agosto celebrou o Dia do Voluntariado, relembro uma fábula do sociólogo Herbert de Souza, o inesquecível Betinho, que narra o diálogo entre um beija-flor e um leão, durante um incêndio em uma floresta: O beija-flor ia do rio para o incêndio levando uma gotinha de água no bico. O leão, intrigado, perguntou: “Ô beija-flor, você acha que vai conseguir apagar o incêndio sozinho”? E o beija-flor respondeu: “Não sei se vou conseguir, mas estou fazendo a minha parte”.
 
 

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