Tássia Reis faz do hip hop sua arma contra e a favor do mundo

Aos 27, rapper vem conquistando o público com o EP “Outra Esfera", o segundo trabalho da carreira, lançado no final de 2016

VARIEDADES - OSLAINE SILVA

Data 07/02/2017
Horário 13:53
 

Com influências musicais que vão de Clara Nunes, passando por Jackson 5, até nomes do rap nacional, como Sabotage, RZO, Expressão Ativa e Racionais MCs, Tássia Reis, 27 anos, vem conquistando o público com o EP "Outra Esfera", o segundo trabalho de sua carreira, lançado no final de 2016. Determinada, ela poderia simplesmente ser definida pelas suas características artísticas, como compositora e cantora, mas vai além e faz do hip hop sua arma contra e a favor do mundo. É uma usina criativa de convicções, em que seu discurso tão feminista quanto libertário (nas mais diversas vertentes, da intolerância à opressão emocional) dita canções sublimes, embaladas por sua voz doce em gêneros abertos, do rap ao reggae.

Jornal O Imparcial Lançada na internet, Tássia Reis alcançou 10 mil views em um dia com "Meu Rapjazz"; música serviu como trampolim para a carreira

"Esse EP é a continuação das ideias que apresentei no meu primeiro trabalho. Vem de uma busca de transformação. Para ser verdadeira, tem que ser interna, se entender, se conhecer. Falo muito dos limites que a sociedade impõe para nós mulheres, especialmente negras, e que nós mesmas colocamos... Questiono o medo de viver, que é uma coisa tão comum na nossa vida. E questiono a sociedade em relação a privilégios", expõe a artista.

Tássia ressalta que é uma mulher negra que vem de uma cultura em que no rap se escrevem sobre si mesmo, o meio em que estão inseridos. Tudo que está em torno disso, como as tantas opressões. E, além de fazer arte, dialoga com as pessoas por meio do seu poder de fala, da sua música.

 

"Outra Esfera"

"Não é Proibido" é a música que abre o trabalho narrando a questão de limites, da cobra mordendo o próprio rabo quando se é tão limitado quanto a limitação que oferece ao outro. E reflete uma metalinguagem em camadas etéreas que tornam a música impossível de ser catalogada no limite de um gênero.

"Ouça-me" é um rap mais visceral que solta gritos presos na garganta, de opressões. Já "Desapegada" traz um clima mais suave e até jazzístico em discurso que fala do apego contemporâneo e da proposta do desapego ao tóxico.

"Semana Vem" contrabalança um texto de discurso abusivo em reggae doce. O trabalho já vira para um rap mais vigoroso, "Da Lama/Afrontamento", onde a cantora se baseia no assassinato do irmão de uma amiga para refletir sobre o racismo estrutural brasileiro e na discriminação que culmina com situação tangente a genocídio da juventude negra.

O single do disco é "Se Avexe Não", com sua reflexão de mágoas reservadas, opressões e oprimidos e liberação dessa somatização em um clima de soul music e doses de samba.

Fechando, ela vem com "Perigo", que é a abertura de comportas da canção anterior, da emotividade liberada e da vivência intensa.

 

Trajetória

Tássia conta que levou tempo a se entender artista. Primeiro de tudo começou a escrever. Segundo ela, dos 14 aos 21 anos, ainda em Jacareí, sua terra natal, sempre fez parte de grupos de dança urbana. E foi assim que conheceu a cultura hip hop e canalizou sua veia criativa para escrever dentro dos gêneros que este abrangia.

"Estava tão acostumada a ouvir Clara Nunes por influência da minha mãe, quanto Jackson 5 por influência do meu pai e os raps de Sabotage, RZO, Expressão Ativa e Racionais MCs, por irmão. Que naturalmente escrevia textos que já vinham acompanhados de melodias, com propostas de harmonias e arranjos", lembra.

Ela comenta que já estava inserida no meio, mas sentia a necessidade de fazer algo mais. Muitos ritmos surgiram e uma professora de redação disse que ela deveria fazer uma música. E assim veio a primeira. Já tecnóloga de moda foi o tempo que mais escreveu. Diz que se sentia inspirada, diariamente. Tinha muito material, vários perrengues e muitas novidades.

Ai ela se intitula compositora. Para mostrar aos seus amigos o que eu escrevia, tinha que cantar e eles perceberam que tinha uma voz interessante. Logo começou a surgir alguns convites como de MC Ralf, Alfro Reg e foi aumentando.

"Foi assim que depois de me mudar para São Paulo, e concluir o curso de Moda, aceitei os elogios que sempre recebia por minha voz e coloquei em estúdio na canção ‘Meu Rapjazz’. Era para ser parte de uma mixtape só de mulheres, que não deu certo. Mas a música serviu como trampolim para minha carreira", pontua.

 

O poder da rede

Lançada na internet, a aceitação foi imediata, o que levou a equipe que começou a acompanhá-la a produzir um clipe para a música. No primeiro dia, ao chegar a 10 mil views, ela teve certeza que acertara. Tanto que um ano depois saiu seu primeiro EP, batizado com seu próprio nome.

Enquanto isso, sua participação em projetos foi crescendo. Foi convidada para cantar com Marcelo D2, gravou com Izzy Gordon, fez shows com a banda de jazzrap Mental Abstrato, foi para o universo das rimas femininas no projeto "Rimas e Melodias", entrou para a discussão de gêneros que sempre propôs no "Salada de Frutas" e a posição política a levou a novas composições, que culminam neste trabalho.

"Lancei o primeiro EP em 2014 e outras coisas foram acontecendo. Mais pessoas me procurando em uma corrente facebookana. A música independente conseguiu alcançar outros patamares, diversos públicos, com a internet. Antes tinha que esperar algum show na sua cidade para ver determinado artista. Hoje não", finaliza a cantora.

 
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