Ouvindo a música chamada “Televisão”, criada pela banda Titãs, fiquei pensando e imaginando qual seria o novo vértice, na contemporaneidade, para essa mesma “televisão”. A música é uma crítica à dominação que o veículo (televisão) daquela época realizava sobre as mentes, ao criar demandas desnecessárias e incentivar o consumo desenfreado.
A música foi escrita na década de 80, mais precisamente em 1985. É composta por uma letra, muito significativa, criativa e a considero muito atual, de extrema importância para reflexões. O que poderíamos pensar que surgiu no lugar da televisão e que atualmente nos provoca alienação, incapacidade para pensar, isolamento e banalizações?
Havia um programa do Golias, onde usava essa expressão, “Ô Cride, fala pra mãe”. Essa pessoa existiu e tratava-se de Euclides Gomes dos Santos, amigo de infância do saudoso humorista, Ronald Golias. Transcrevo a letra aqui: “A televisão me deixou burro, muito burro demais. Agora todas as coisas que eu penso me parecem iguais. O sorvete me deixou gripado pelo resto da vida. E agora toda noite quando deito é boa noite, querida... Ô Cride, fala pra mãe. Que eu nunca li num livro, que um espirro fosse um vírus sem cura, vê se me entende pelo menos uma vez criatura. A mãe diz pra eu fazer alguma coisa, mas eu não faço nada. A luz do sol me incomoda, então deixo a cortina fechada. É que a televisão me deixou burro, muito burro demais. E agora eu vivo dentro dessa jaula junto dos animais. O Cride, fala pra mãe, que tudo que a antena captar meu coração captura. Vê se me entende pelo menos uma vez, criatura. Ó Cride,fala pra mãe”.
Os compositores são: Antônio Belloto, Arnaldo Filho e Marcelo Fromer (in memoriam). Pensando na atualidade, algo mudou? Transformou-se? Penso que essa “televisão” referida pela música transformou-se, houve novos desdobramentos, tornou-se o objeto dos nossos desejos, como o oxigênio, leva-se para todos os lugares, mais potente, conexão sem limite, que são os iPhones, iPads, as redes sociais, enfim, a tecnologia. Hoje vemos crianças em tenra infância, hipnotizados com seus desenhos e jogando, indiferentes diante dos parques de diversões.
Quando a música diz que, “O sorvete me deixou gripado pelo resto da vida”, podemos pensar no sentido de que, “somos facilmente influenciados, não nos conhecemos, desconhecemos nossas características, já não sei me vestir, maquiar, calçar e arrumar o meu cabelo. Necessito acompanhar os influenciadores no Instagram ou qualquer outra rede social”. “Agora todas as coisas que eu penso me parecem iguais”, não há uma crítica e distinção, não há subjetividade, tampouco, reflexões. “Eu beijo todas, mas não beijo ninguém”.
Os celulares tornaram-se uma jaula e eu sou um bicho primata. “Tudo que a antena captar meu coração captura”. Já não tenho história, tampouco memória. No vicio pelos jogos no videogame, “A luz do sol me incomoda, deixo a cortina fechada” e permaneço isolado. E o mimetismo impera. Uma geração liquida (Zydmunt Bauman), preconiza uma nova época em que as relações sociais, econômicas e de produção são frágeis, fugazes e maleáveis, como os líquidos.
São as experiências pessoais de cada um, sem a construção da identidade de um casal, da integração entre os indivíduos. Nessa fluidez, a vida de cada um estaria propensa a mudar de uma hora para outra, às vezes de forma imprevisível. Nada se cria, tudo se copia. Está tudo igual, banal e viral! E as emoções sucumbiram em favor do mecânico, do operativo e automático. Ninguém ouve ninguém, todos falam ao mesmo tempo. O Cride, fala pra mãe. Onde está a mãe? E o amor?