Encolher ou fortalecer o Estado?

OPINIÃO - Gaudêncio Torquato

Data 04/12/2019
Horário 04:21

O ministro Paulo Guedes, a par de declarações polêmicas - as pessoas não deveriam se assustar “se alguém pedir o AI-5”-, pretende “encolher o Estado”. Deixaria sob sua égide o que é estritamente de sua obrigação, como educação, segurança pública, saúde. Para tanto, vai focar na privatização de centenas de empresas estatais. O que levanta a questão: qual deve ser o escopo do Estado no governo Bolsonaro?

Um dos papas da ciência política, o sociólogo Alain Touraine, em seus estudos, prega o aumento da capacidade de intervenção do Estado como forma de um país atenuar as desigualdades. O Estado tem sido fraco para debelar as mazelas. Por conta disso, o governo age no varejo, trabalhando no curto prazo, com o presidente Jair Bolsonaro praticamente se limitando a fazer agrados e benesses para operar a administração.

Estado forte, por aqui, tem sido sinônimo de autoritarismo, arbitrariedade, estrutura burocrática gigante e ineficiente, corporativismo etc. Como encolher o Estado de sua estrutura paquidérmica, dando-lhe capacidade de planejar a longo prazo, sem reformas capazes de deflagrar novos costumes e consolidar as instituições? Começamos com a reforma trabalhista, seguida da recente reforma da Previdência, mas essas não bastarão. O que se espera é um amplo leque de mudanças.

Seja qual for o escopo reformista, o desafio se impõe: colocar no mesmo balaio componentes como liberalismo, bem estar social, Estado capaz de intervir no mercado quando necessário, institucionalização política, racionalidade administrativa, extinção do corporativismo, mudança da política de clientelas pelo mérito.

Fortalecer o poder de decisão do Estado é meta a ser perseguida para se combater interesses individuais e grupais que, entre nós, prevalecem sobre as políticas sociais. Trata-se de um desafio que ultrapassa décadas. O governo Bolsonaro até prometeu acabar com a velha política. Mas ainda tateia na escuridão nesse primeiro ano.

Reformar o Estado, como se prega, não é tarefa para uma única administração. O reformador tem inimigos na velha ordem, que se sentem ameaçados pela perda de privilégios, e defensores tímidos na nova ordem, temerosos que as coisas não deem certo. Por último, sobram indagações: afinal, que escopo os militares defendem para o Estado brasileiro? Como aparar desigualdades com programas liberais, que dão vazão a climas concorrenciais? Como atrair investimentos quando o fantasma dos tempos de chumbo, vez ou outra, reaparece na paisagem? Como deixar de atender a um parlamentar dos grotões, que ameaça votar contra o governo se não for atendido? Enfim, qual o Estado mais adequado à nossa democracia?

 

 

 

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