Recebi um artigo muito oportuno, de autoria do promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo aposentado, Luiz Antônio Miguel Ferreira, mestre em Educação, advogado e consultor e do Henrique Koga Fujiki, pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. O artigo, cujo tema “Sharenting: pais que postam fotos dos filhos nas redes sociais”, foi publicado no Boletim Revista dos Tribunais Online, vol.39- 2023.
Dividirei alguns fragmentos do artigo, pois, penso ser de extrema valia sua divulgação e de utilidade pública. “Sharenting” foi a designação dada para o novo fenômeno que se refere aos pais que postam, de forma contínua e excessiva, fotos e vídeos de seus filhos na internet. Trata-se do resultado da formação das palavras em inglês “to share” (compartilhar) e “parenting” (parentalidade).
Essa situação tem se tornado comum, pois, cada vez mais, pais divulgam conteúdo de seus filhos (crianças e adolescentes), nas redes sociais, com ou sem a sua concordância, muitas vezes em situações constrangedoras ou até mesmo, vexatórias. Há uma necessidade de mostrar para o mundo como está o seu filho, o que faz, como se desenvolve, e outras situações comuns ou inusitadas. São inúmeras as formas como os filhos são expostos, e desconhecidas as consequências que essa ação pode acarretar no futuro.
Mas uma coisa é certa: em face dessa ação, muitas pessoas terão acesso a esse conteúdo, podendo utilizá-lo de variadas formas e com diferentes intenções. De um lado, para os defensores, o fato de publicar uma foto ou vídeo de um filho nas redes sociais não traz prejuízo ou exposição indevida. Apenas resulta de compartilhamento de um momento especial, que não pode ficar restrito à família... Trata-se de expressar um motivo de orgulho dos pais em relação aos filhos, compartilhando alguns marcos significativos do desenvolvimento da criança, ou apenas o seu dia a dia.
No entanto, para outros, tal situação pode gerar prejuízo para os filhos, que devem ser preservados em sua integridade física, psíquica e moral, uma vez que revelam situações íntimas, constrangedoras ou vexatórias, principalmente quando há algum interesse financeiro por trás da publicidade alcançada. Além disso, há evidente violação ao direito à privacidade da criança, posto que sua vida fica exposta nas redes, podendo gerar o compartilhamento indevido de informações pessoais, com consequências nefastas, no que diz respeito à criação de perfis falsos, ações de pedófilos e fraudes na identidade, entre outras. Sem contar com reflexos psicológicos negativos para o desenvolvimento da criança.
Destina o ECA, um capítulo específico sobre o direito à liberdade, respeito e dignidade. Nesse capítulo, busca-se reconhecer a honra, a intimidade, a preservação da imagem, identidade, autonomia, valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais da criança e do adolescente. Diz a lei: Art.17. “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais”.
Realmente, o artigo desperta para uma realidade que muitas vezes, levados pela emoção, de forma impensada, atuamos, publicando imagens ou vídeos que poderiam ser mantidas na intimidade familiar. O que ocorre é a facilidade em que a tecnologia de forma instantânea e mecânica tem, em propagar de forma veloz uma informação como imagens e vídeos. Há os influenciadores digitais que são muito beneficiados (sharenting comercial). Já o sharenting não-comercial, como acima mencionado pelos autores, poderá levar à sérios prejuízos irreversíveis a toda uma família.
A estrutura da maldade é tão veloz e maquiavélica, tanto quanto, uma imagem publicada por um ingênuo pai (mãe, tio, avó, madrinha...) ao publicar a sua felicidade diante da criança ao dar seus primeiros passos. Há sempre a tessitura perversa (pedofilia) ocupando espaços invisíveis diante da inocência da criança. O tráfico de bebês e crianças é uma realidade também. Refletir sobre o artigo, é preciso!