Uma pré-condição necessária para a melancolia é um distúrbio do narcisismo primário (Ogden2014). Freud em 1915 escreveu o texto “Luto e melancolia “e só foi publicá-lo em 1917. A Primeira Guerra Mundial assolava a Europa nessa época e uma grande carnificina instalava-se entre os homens. Nesse momento, dois filhos de Freud alistaram-se para a guerra e foram convocados. O seu consultório esvaziou-se devido à guerra. Também perde um grande aliado de estudos teóricos, chamado Jung. Houve uma ruptura e uma divergência de opiniões por parte de Jung, no ponto da centralidade da noção de sexualidade na compreensão da personalidade humana.
A melancolia é um termo advindo do grego, onde Melan (negro) e Cholis (bílis), isto é, melancholia significa, portanto, bile negra. Hipócrates (pai da medicina) classificou como um conjunto de sintomas como: aversão à comida, falta de ânimo, insônia, irritabilidade e inquietação. O que vem a ser narcisismo primário? É um processo normal, necessário, que ocorre num determinado momento regular do desenvolvimento libidinal. O bebê precisa sobreviver, precisa reagir no pós-nascimento. O aparelho mental do bebê recém-nascido tem um funcionamento com a característica primordial de ausência de contradição.
Freud chamou de processos mentais primários, que são os processos mentais inconscientes antigos e primários. É a única forma de funcionamento, ou seja, são orientados pelo princípio do prazer. Podemos configurar o distúrbio do narcisismo primário como uma resistência ao enfrentamento da realidade e ao desconhecido que permeiam de forma inerente nossa vida.
A sua majestade o bebê tem um tempo de validade. A própria anatomia e fisiologia nos empurram para o crescimento, rumo à independência e autonomia. A autonomia nem sempre é possível. O paciente melancólico, no primeiro ano de vida e na infância, não conseguiu fazer a passagem bem-sucedida do narcisismo para o amor objetal, que é o objeto exterior. Diante de perdas ou frustrações foi incapaz de fazer o luto ou enfrentar a realidade da perda e, com o tempo, de vir a ter um novo amor maduro com outra pessoa.
O melancólico não consegue se separar do objeto perdido e evita a dor da perda por meio da regressão narcísica de objeto para a identificação narcísica: E o resultado é que a despeito do conflito [decepção levando a afronta] com a pessoa amada, não é preciso desistir da relação amorosa. Trocando em miúdos, o melancólico deixou de fazer a travessia ao encontro do outro. Deixa de fertilizar e não se vincula ou faz alianças.
Consideramos um paciente de difícil acesso. Constrói relações em que a fusão prevalece. Na perda do ente querido, fusionado, desespera-se, pois desconhece o que perdeu exatamente. Ele sabe quem perdeu, mas não sabe o que perdeu nele próprio. A vivência dolorosa de perda sofre um curto-circuito devido à identificação do melancólico com o objeto que, assim, nega a separabilidade do objeto: o objeto sou eu e eu sou o objeto. O termo melancolia, em Freud, é sinônimo de depressão.