Em 1904, o governo do Rio de Janeiro, até então capital brasileira, anunciou a vacinação obrigatória contra a varíola. A decisão resultou numa série de protestos contra a campanha de imunização, que levou a população às ruas para por à prova os estudos científicos vigentes na época. A situação gerou conflitos armados e deixou mortos e feridos. Apesar de ser um episódio de outro século, a conhecida Revolta da Vacina se mostra mais contemporânea do que nunca – em 2021, um levante popular muito semelhante aos protestos do passado começa a crescer em todo o país.
Diferentemente daquela época, não há um quebra-quebra generalizado. A maioria das discussões se concentra não nas ruas, mas num ambiente ainda mais perigoso: as redes sociais, que contribuíram para amplificar o movimento antivacina. Por conta da pandemia da Covid-19, doença que causou mortes em todo o mundo, teve início uma corrida contra o tempo para a disponibilização de uma vacina eficaz contra o vírus, o que também gerou de forma imediata uma avalanche de comentários que colocam em dúvida a procedência dos imunizantes e os seus efeitos para a saúde humana – comentários estes normalmente baseados em disputas políticas e teorias negacionistas e conspiratórias, isto é, sem qualquer fundamento científico.
Estas campanhas de desinformação não só contribuem para desvalidar a segurança das vacinas e desencorajar a população a se proteger, como também promovem a desqualificação da ciência, a única que pode frear o avanço da doença em todo o mundo. Nestas circunstâncias, é muito importante que não voltemos a repetir erros do passado, subestimando estudos científicos em benefício de discursos geralmente propagados por aqueles que sequer têm conhecimento a respeito. Neste momento, a união da população em prol da vacina é necessária para a construção da responsabilidade coletiva, considerando que ao proteger um grupo, o outro se beneficiará diretamente disso.
A vacinação é certamente uma das maiores transformações da medicina, tendo em vista que combate doenças e estende a expectativa de vida da população mundial. Não podemos compactuar com mitos que impeçam as chances de nos livrarmos dessas moléstias, sobretudo neste momento, em que o planeta padece de uma doença para a qual o combate efetivo começa a dar os primeiros passos – e cabe a nós garantirmos que novos passos sejam dados por meio da política de imunização.