Ação requer retorno do transporte gratuito a soropositivos de HIV

Defensoria Pública alega que lei de 2015 deixa margem para recusa por parte da Semav e informa que assistidos em Prudente estão deixando tratamento de lado

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Data 28/03/2019
Horário 05:50
Arquivo - Giovana, defensora pública: “A Constituição veda o retrocesso”
Arquivo - Giovana, defensora pública: “A Constituição veda o retrocesso”

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo, em Presidente Prudente, ingressou com uma ação civil pública, protocolada na terça-feira, ao se deparar com uma recusa por parte da Semav (Secretaria Municipal de Assuntos Viários e Cooperação em Segurança Pública) em relação à renovação das gratuidades do transporte público da cidade às pessoas portadoras do HIV (vírus da imunodeficiência humana), em uma ação que segue em segredo de Justiça. “A Constituição Federal veda o retrocesso, então esse direito à saúde precisa ser readquirido”, informou a defensora pública Giovana Devito. Na APPA (Associação Prudentina de Prevenção à Aids), pelo menos 24 pessoas tiveram problemas com a renovação, o que segundo a coordenadora, Carla Diana, representa um prejuízo ao portador, município e sociedade. “As pessoas estão deixando de buscar o tratamento por causa do não acesso ao transporte e isso nos preocupa”.

A Prefeitura, questionada sobre a situação, por meio de nota, confirmou que a lei em vigor atualmente não inclui esse público como beneficiário da gratuidade no transporte público e esclareceu que “dessa forma, somente com laudo médico em mãos é que a Semav tem condições de avaliar e, eventualmente, conceder a gratuidade ao público em questão”.

A Defensoria Pública esclarece que até 2015 os portadores do HIV no município tinham como garantia a Lei 6.213/2004 e que regulamentava o passe gratuito aos portadores de deficiência e dava demais providências. No documento, em seu artigo 1º, ficava isento do pagamento da tarifa, mediante apresentação de credencial: portadores de deficiência física com dificuldade de locomoção; portadores do vírus HIV em tratamento médico; os portadores de problemas renais, que necessitem de transporte para a realização de hemodiálise, dentre outros. Desta forma, a lei deixava explícita a presença deste público na garantia do direito.

No entanto, em 2015, conforme a defensora pública, foi promulgada a Lei 8.993 e que dispõe sobre o serviço de transporte público de passageiros em Prudente, de forma que o documento veio para estabelecer as normas para a concessão e permissão da exploração do serviço na cidade. No documento, no capítulo que trata das isenções, no entanto, o artigo 39 afirma que ficarão isentas da tarifa as pessoas nas seguintes situações: com deficiência ou com mobilidade reduzida, pessoas com idade igual ou superior a 65 anos, crianças menores, com idade até 6 anos, sempre acompanhadas dos pais ou responsáveis, sendo que o benefício não se estenderá ao acompanhante; outras isenções concedidas pela legislação municipal.

Com isso, a nova lei deixa de mencionar o público portador do HIV, o que, segundo a Defensoria Pública, tem dado margem para que a Semav recuse a realizar a renovação das credenciais.

Ação civil pública

Conforme Giovana, a defensoria foi procurada pela APPA, já que a instituição percebeu uma redução na procura pelo tratamento por parte dessas pessoas, que usam como justificativa a falta de condições de transporte, além do fato de que a recusa é algo que deve ser revisto. “Percebemos, ao ter contato com essas pessoas, que se trata de um público muito carente, muitas vezes com mais de 50 anos, e que vive com uma renda abaixo do mínimo, o que faz necessária a concessão da gratuidade”.

Ainda segundo Giovana, a recusa “fere o tratado internacional dos direitos humanos”, além de significar um “retrocesso”. “Por isso, a ação civil pública, para que estejamos em favor desse grupo que é vulnerável”. Ela lembra que a lei de 2015, por não deixar explícita a presença do HIV nas condições necessárias, deveria levar em consideração que elas podem ser consideradas pessoas com deficiência, como prevê a lei, já que o vírus é justamente o da imunodeficiência humana e que traz “prejuízos enormes ao sistema imunológico”.

Tratamento comprometido

A coordenadora da APPA lembra que o problema não é novo, já que se arrasta desde 2015, mas afirma que ao longo dos anos a instituição percebeu prejuízos significativos ao tratamento dessas pessoas, sendo necessário procurar a Defensoria Pública como uma forma de buscar ajuda. “Ao passarem pela avaliação médica da Semav, o profissional não considera o HIV como uma deficiência, e recusa o pedido. Alguns dos assistidos, de forma individual e processual, conseguiram a concessão da gratuidade, mas não é uma realidade de todos”.

Sobre os prejuízos encontrados, Carla lembra que eles não se resumem a quem conquistou o benefício anos atrás, de forma que a sociedade e a administração pública também deveriam se atentar aos perigos. “Ao deixarem de buscar seus remédios e demais atendimentos do tratamento, a pessoa fica em uma condição de carga viral em atividade e que, além de prejuízos pessoais, a deixa capaz de contaminar outras pessoas. Essa gratuidade, portanto, é um investimento do município e uma conquista que foi tirada”, finaliza.

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