Deveres de cidadania doméstica

OPINIÃO - Marcos Akira Mizusaki

Data 11/03/2021
Horário 05:45

Num sentido etimológico, a palavra cidadania se refere à condição de alguém que reside numa cidade e, ao mesmo tempo, como membro de um Estado, sujeito a direitos e obrigações. No regime democrático, a definição de direitos dos cidadãos vem como garantia constitucional, como direito à vida, saúde, educação, igualdade, liberdade, propriedade, segurança, etc. Tratam-se de direitos individuais e coletivos assegurados em nossa carta suprema e que devem ser tutelados por aqueles que estão no poder. Ser cidadão, portanto, envolve não só na busca de satisfação de direitos, mas também no cumprimento de seus deveres (pagar impostos, votar nas eleições, participação na política, convocações em geral do Estado, etc).
O que foi dito até agora, creio que não seja novidade para a maioria dos leitores. No entanto, o que desejamos despertar com o presente artigo consiste na chamada cidadania doméstica. Dentro de casa, onde compartilhamos o ambiente com os membros da família, alguns de seus integrantes, normalmente adolescentes, acabam se comportando como se estivessem em hotéis. Não colaboram na limpeza, no momento das refeições ou desrespeitam os ambientes coletivos, sobrecarregando apenas alguns integrantes, normalmente os pais (ou avós). Os responsáveis, quando deixam de tomar atitudes no momento correto, acabam perdendo a autoridade sobre eles, criando verdadeiros hospedeiros.
Na medida em que crescem, estes jovens passam a acreditar que todos tem o dever de lhes servir, e não têm qualquer obrigação em contrapartida. Irritam-se facilmente nas escolas e tendem a enfrentar professores, além de desrespeitarem os espaços coletivos. Também têm grandes chances no futuro de apresentarem dificuldades no mercado de trabalho, com alcance limitado em tarefas simples.
Portanto, é dentro de casa que inicia a busca da verdadeira cidadania, com a chamada cidadania doméstica, onde compartilhamos com os demais membros da casa, as obrigações que beneficiam a todos, sem prejuízo do respeito nos espaços coletivos. Os responsáveis devem desde cedo ensinar aos poucos as tarefas coletivas, para que cresçam naturalmente com estas obrigações. Isso não faz mal a ninguém. 
Não se confunde com trabalho infantil. Aqui representa apenas a delegação de algumas tarefas dentro de casa, que não colocam em risco o desenvolvimento da criança ou adolescente. Pelo contrário, faz com que eles tenham respeito e empatia pelo próximo, principalmente com os mais velhos. Ora, se uma criança pegou brinquedos e espalhou pela sala, ao final ela pode perfeitamente guardá-los na caixa; depois que se alimentou, o adolescente pode lavar seu próprio prato, ou ter seu dia para fazê-lo por todos; ajudar na limpeza da casa, arrumar sua própria cama, seu quarto, etc, tudo supervisionado por um adulto. 
Sabemos também que existem excessos por parte de alguns, com atribuições de tarefas incompatíveis com a idade ou muito além de sua capacidade. Estes casos merecem devida apuração pelas entidades de atendimento, para que os responsáveis sejam orientados ou até punidos pelo excesso.
A reflexão que se busca é que as famílias criem suas proles como verdadeiros cidadãos, ou seja, que saibam reconhecer seus direitos, mas que também cumpram com seus deveres. Fazendo isso dentro de casa, instintivamente fará o mesmo do lado de fora. O inverso também é verdadeiro. Depois que tiverem dentro de casa um adulto hospedeiro, talvez seja tarde demais.
 

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