Em ação, MPF questiona escolha de beneficiários

Na região, 401 famílias de oito municípios estão cadastradas no PNRA (Programa Nacional de Reforma Agrária).

REGIÃO - Elaine Soares

Data 22/07/2014
Horário 00:53
 

A "falta de controle e transparência" com que são escolhidos os beneficiários da reforma agrária no Estado são objetos de uma ação civil pública ajuizada pelo MPF (Ministério Público Federal). Por meio do procurador da República, Pedro Antônio de Oliveira Machado, o órgão alega que o destino dos lotes estaria sendo definido por "movimentos sociais", quando o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) é quem deveria determiná-lo, levando em consideração critérios previstos em instruções normativas. O juízo da 24ª Vara Cível da capital ouvirá os réus - Incra e União - antes de decidir pelas providências requeridas pelo MPF. Entre elas está a suspensão de todos os processos administrativos em curso, bem como a abstenção da abertura de novos destinados à aquisição de propriedades rurais no Estado. Isto até que as irregularidades apontadas sejam sanadas. O recadastramento de interessados e atuais assentados também é requerido pelo órgão ministerial. Na região, 401 famílias de oito municípios estão cadastradas no PNRA (Programa Nacional de Reforma Agrária).

O procurador aponta certa "negligência" por parte do Incra, o qual "tolera que movimentos sociais arregimentem e identifiquem possíveis beneficiários, formulem a listagem de seus nomes, sem qualquer controle estatal, critérios de impessoalidade, isonomia e transparência". Para ele, tal atitude seria ainda a raiz de problemas posteriormente observados como "assentamentos ociosos, lotes abandonados ou comercializados irregularmente, sem a efetiva e eficiente exploração agrícola", completa.

Conforme consta na inicial, em investigação, o MPF teria constatado ainda que famílias supostamente acampadas em locais próximos a áreas de interesse para reforma agrária seriam "beneficiadas com preferência". Como frisa a Assessoria de Imprensa do MPF, tais práticas, além de ferir as normas vigentes, têm limitado a oportunidade de acesso à terra àqueles que pertencem ou são indicados por movimentos sociais. "Isso porque, em geral, esses acampamentos são formados por pessoas aliciadas pelas lideranças desses grupos, a grande maioria oriunda das periferias das grandes cidades e sem vínculo com o trabalho rural", coloca.

Machado ressalta que não é contra os movimentos sociais que, para ele, "têm um papel importante de cobrar o governo, impulsionando a política de reforma agrária". Diz apenas discordar que esteja na mão destes grupos uma atribuição que é do órgão gestor da administração pública. "Os movimentos, que muitas vezes sequer detêm estatuto e constituição formal, não podem influir a tal ponto de decidir para quem e qual pedaço de terra será destinado, quem passa na frente de quem na fila, etc. Isto é totalmente antirrepublicano", considera.

O procurador também traz à tona a questão do prejuízo ao erário já que, para ele, o instituto "insiste na desenfreada aquisição de terras, sem a devida fiscalização daquelas já distribuídas".

 

Pedidos


O órgão ministerial quer que o Incra, de maneira mais clara e direta, retome para si a função de fazer a seleção das famílias, seguindo a legislação e normas vigentes. E que torne públicas as informações sobre o assunto. "Quando solicitado, o Incra sequer é capaz de fornecer listas e cadastros atualizados de potenciais beneficiários do PNRA. O poder público perdeu, se é que um dia teve, o controle sobre a reforma agrária", contesta. Na ação, em caráter liminar, a Procuradoria pede o recadastramento de todos os assentados e candidatos interessados inscritos no PNRA (Programa Nacional de Reforma Agrária) e a publicação dos dados no site do Incra e do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Tudo isto em 180 dias.

Ainda exige que as informações sejam sempre atualizadas, inclusive com o nome de novos contemplados com lotes. Machado pede também a adequação de norma aplicada para determinar os contemplados, a fim de deixar expressa a ordem de preferência e critérios para a seleção de beneficiários.

Entre outras reformas, o procurador pede que a presença no CadÚnico - sistema do governo federal onde constam as famílias em vulnerabilidade social - seja incluído como um dos critérios a serem considerados para o recebimento do título de domínio e de concessão de uso de imóveis da reforma agrária.

 

Opinião


Ao contrário do que pleiteia o MPF, Cícero Bezerra de Lima, coordenador da FNL (Frente Nacional de Luta Campo e Cidade) - grupo ligado a José Rainha, líder dissidente do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) - defende que sejam assentadas pessoas que lutam pela terra e não que estão em uma lista de espera, posicionados por ordem de determinados critérios. "A fila nunca vai andar se depender do Incra. Sem ocupação de terra não há reforma agrária. Por isso, temos que ir à luta. E quem vai à luta tem o direito de ganhar seu lote", defende.

Já Luiz Antônio Nabhan Garcia, presidente da UDR (União Democrática Ruralista), parabeniza o MPF ao passo que critica o Incra. "O instituto nunca teve o controle. A reforma agrária sempre foi política e ideológica. É dinheiro público jogado no lixo. Aliás, existem muitos aspectos que deveriam ser investigados, inclusive pelo MPE , como a venda ilegal de lotes, por exemplo. Esta ‘falta de controle’ é apenas a ponta do iceberg", menciona.

 

Incra


Contatado na tarde de ontem, o Incra informou que se manifestará quando for oficialmente notificado sobre a ação. Quanto aos municípios onde estão as famílias cadastradas no PNRA estes são: Euclides da Cunha Paulista, João Ramalho, Martinópolis, Paraguaçu Paulista, Rancharia, Regente Feijó, Sandovalina e Santo Anastácio.

 
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