Fonte Esmeralda

Benjamin Resende

COLUNA - Benjamin Resende

Data 08/11/2020
Horário 05:50
Fonte Cristal de Celso Assumpção, Década 40
Fonte Cristal de Celso Assumpção, Década 40

Italianos e seus descendentes foram e são responsáveis por boa parte da Presidente Prudente de ontem e de hoje. Siamo tutti oriundi. É só tomar, nas mãos, a lista telefônica da cidade, para os nomes italianos aparecerem um atrás do outro. Os imigrantes vieram, depois os migrantes, todos atraídos pelas boas terras vendidas pela Cia. Marcondes e pelo Cel. Goulart. Chegavam de trenzinho, o barulhento trenzinho de madeira da Estrada de Ferro Sorocabana. Vinham de todas as partes. Italianos procedentes do norte da Itália, principalmente da província de Treviso. Camponeses, na maior parte. Também os italianos da Paulicéia Desvairada, das Minas Gerais, dos cafezais de Campinas, Ribeirão Preto, Araraquara e cidades recém-formadas. Os sítios e as chácaras, ao redor da cidade nascente, eram seu alvo predileto para plantação de verduras e frutas a serem vendidas na vila; e, também, para o plantio de café. Os italianos cruzaram o mar. Acompanhavam-se da família, e a filharada inteira ia coadjuvar nos trabalhos diários. Substituíram a mão-de-obra escrava, quer nos pequenos serviços domésticos, quer nos da lavoura e nos rudimentares transportes de cargas. Deixaram a Itália do Rei Vitório, trazendo sua foto, para cultivar a pátria amada, não por saudosismo, mas por patriotismo. Um povo que trazia a alma para, na península, não deixar a volta. “Aqui é preciso ressurgir Tróia”, disse Enéas, ao chegar ao Lácio. “Aqui, a alma se compõe e o trabalho duro prospera”, diziam nossos nonnos e nonnas. Nada de sebastianismo. A volta não tinha razão de ser. Cada italiano ou os“oriundi" aqui aportados fizeram sua “Eneida”. É uma epopéia que merece ser contada em versos. Romances, aventuras e poesias não faltam. Heróis são os Grotto, Furlanetto, Stadella, Fregonezzi, Colnago, Tiezzi, Peretti, Casarotti, Daneluzzi, Calabretta, Botigelli, Ceriani e inúmeros outros. Seus nomes estão gravados nas casas comerciais, escritórios, consultórios, fábricas, prédios e produtos de vários matizes. Ocultam a saga de heróis anônimos. Presidente Prudente guarda, nas histórias familiares, a esforçada gente italiana. To dos formam uma grande odisséia. Muitos deles lembram loucura de tanta grandeza que queriam. Com o trabalho, ludibriavam a sorte, criavam fortuna e mereciam fé. O que é o homem sem a loucura do ter e do ser? E, consumidos de esperança, fizeram a indústria brasileira. Prudente tem seus heróis italianos. Recorde-se a evolução da cidade e um por um irá surgindo das páginas dobradas do tempo. Veja-se o trabalho do Carmino Ricci. Chegado aqui, em 1923, adquiriu sua pequena chácara atrás do Asilo dos Velhos, onde, hoje, está parte da rotatória dos prefeitos. Oleiro e agricultor, plasmou tijolos e plantou hortaliças, frutos e frutas que vendia, em sua carroça, às senhoras prudentinas. Essas, às vezes, lhe perguntavam: “A água da chácara é boa?”. E o Carmino a gabava como a melhor dessas paragens. Pediam-lhe que a trouxesse para experimentar. E o senhor Ricci, pouco tempo depois, já não vendia, em sua carroça, verduras e frutas, mas, em latas de querosene, a boa água de sua chácara. Um viajante, vendo a impropriedade das latas d`água, propôs-lhe a venda de uns garrafões de vidro, dizendo serem mais práticos e mais higiênicos. Topou a parada. Engarrafava a água da mina e o negócio prosperava. Foi preciso comprar um caminhãozinho Chevrolet “Gigante”, ano 1937, para fazer a entrega da água de mina, agora batizada de “Fonte Esmeralda”. Foi a primeira boa água potável de Prudente. Até há pouco tempo, a casa do Carmino, de tijolos, era a única, onde, hoje, fica o Posto Padroeira, em frente do Velório Athia. E, com os traçados da Avenida Cel. Marcondes, da Santa Casa até a rodovia Raposo Tavares e das pistas Sul e Norte do Parque do Povo, esse marco de Prudente desapareceu. A olaria e a fonte se foram, mas sobrou, ali, um nome de rua, Carmino Ricci. Fruto sem dúvida do progresso. Lembrei-me, então, do que dizia meu nonno: Tutti i giorni si nasce... e tutti giorni se muore.

 

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