Hoje é o dia da vingança

Roberto Mancuzo

CRÔNICA - Roberto Mancuzo

Data 02/09/2025
Horário 06:00

Quando os primeiro raios de sol saíram hoje, alguma coisa estava diferente. Eu não soube bem de cara, mas logo uma voz suave chegou aos meus ouvidos: “Hoje você poderá se vingar. Eu te dou todos os poderes de fazer com os outros o que sempre fizeram contigo.”

Rebati que era loucura, que isso não existia, que... E o meu telefone tocou. 

- Sr. Roberto, tudo bem? Aqui é Dr. Antônio Cláudio. Sou o CEO do seu cartão de crédito MasterBlaster Indi. 

- CEO? 

- Sim, na verdade, o dono mesmo. Sabe o que é, sabe que as coisas estão difíceis nesta vida, muitas contas muitos boletos e este mês eu estou bem apertado mesmo. E daí que queria saber se o senhor não poderia me emprestar um dinheirinho. Pouca coisa, cerca de R$ 10 mil e daí eu lhe pago parcelado. Pode ser? 

A voz veio e disse: “Vai, é agora, testa seu poder de vingança”

- Mas é claro, Sr. Antônio! Fico honrado. Sem problemas. Vou parcelar seu débito em 12 vezes. Só vou colocar uns juros compostos aqui, uma taxa de análise de crédito de R$ 300; um fundo de proteção ao meu recebimento de só 2% ao mês, quase nada; um pouquinho de IOF, mais um seguro obrigatório contra calote, porque confiança é uma coisa, garantia é outra, né? Nada demais. No final, os R$ 10 mil que você precisa ficarão por R$ 17.600. Tá tudo certo?

- O quê? Mas isso é... é...

- É a confiança que temos no seu nome, Sr. Antônio! Uma oportunidade única!

Ele concordou e desligou e aí eu vi que era isso mesmo. O dia era da vingança e como eu tinha menos de 24 horas fui direto para a Câmara de Vereadores. 

- Tudo bem vereador Fabinho? Seguinte, o senhor me deve R$ 2.500. Aceito Pix. 

- Meu amigo, por qual razão eu te devo isso, perguntou estendendo a mão amigavelmente.

- Há quatro anos, o senhor prometeu asfaltar a rua principal do nosso bairro em seis meses. Não cumpriu e segundo o “Contrato de compromisso eleitoral não assinado, mas moralmente vinculante”, que propus mentalmente na época, isso configura descumprimento de meta. Daí, calculei o prejuízo. São R$ 500 por ano de atraso, uma cobrança simbólica pela poeira que entrou na minha casa, pelo desgaste extra dos pneus do carro e pelo estresse de desviar dos buracos. Multiplicando por cinco anos, porque o senhor incluiu o ano zero da promessa, chegamos aos R$ 2.500. De novo: aceito Pix.

Neste mesmo dia, eu ainda cobrei e recebi R$ 178 da atendente de telemarketing que ligou na hora errada, não se identificou e foi invasiva. 

Também consegui que o açougueiro do hipermercado que sempre coloca gramas a mais no peso das carnes pagasse para todos os clientes que ele lesou no dia uma taxa de “Raiva engolida a seco”. Neste mesmo atacadista, foi bem legal ver o dono mesmo correndo para conseguir caixas para minhas compras e levando tudo até o carrinho.

E por fim, óbvio que não iria deixar barato: todas as big techs das minhas redes sociais me devolveram, com juros corrigidos, o valor que eles lucraram com meus dados desde a época do falecido Orkut. E ainda ganhei uma consultoria grátis sobre como funcionam exatamente os algoritmos, especialmente quando flopam seu conteúdo do nada, sem explicação alguma. 

Eles pediram para eu não contar a ninguém, mas se quiser, me chama no direct, que eu tenho até meia-noite para mais esta vingancinha.      
 

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