Infância roubada 

A família e todo o seu contexto são fundamentais para um bom desenvolvimento da criança, sendo sua casa o ambiente onde desenvolverá quase todos os arsenais básicos de seu comportamento. O papel dos pais, além de provimento de bens, sustento dos filhos e educação, consiste em transmitir valores culturais de diversas naturezas. É dever tanto da família como da sociedade criar e garantir ambientes seguros e saudáveis para o seu crescimento. 
Todo ato ou omissão da sociedade que não garanta condições saudáveis para o crescimento da criança e do adolescente ou que viole os direitos previstos em lei é compreendido como uma forma de violência. Dentre as diversas formas de violência contra crianças e adolescentes, o abuso sexual é uma das formas mais graves, deixando marcas em seu psiquismo jamais apagadas. Os efeitos negativos para o desenvolvimento das vítimas são muito grandes e comprometedores para todo um futuro. 
A definição de abuso sexual infantil não é uma tarefa simples, uma vez que se trata de um fenômeno complexo. A noção de abuso sexual contra crianças e adolescentes tem tido maior abrangência, incluindo situações nas quais pode ou não ocorrer contato físico. Dessa forma, compreende-se abuso sexual como todo ato ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual, cujo agressor esteja em estágio de desenvolvimento psicossexual mais adiantado que a vítima. A intenção é provocar sexualmente estímulos ou utilizá-la para obter estimulação sexual. Estas práticas eróticas e sexuais são impostas às crianças ou aos adolescentes pela violência física, ameaças ou indução de sua vontade. Podem variar desde atos em que não existam contatos físicos aos diferentes tipos de atos com contato físico. 
Sempre acreditamos que abusos sexuais existem, mas não com crianças do nosso convívio. O abuso sexual pode acontecer fora do contexto doméstico ou familiar, envolvendo situações de violência na qual o agressor é uma pessoa desconhecida. No entanto, tem sido dentro do contexto familiar, que ocorre a maioria dos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes, pessoas muito próximas, que podem ou não apresentar laços consanguíneos. 
Às vezes o agressor representa um papel de cuidador, desenvolvendo com a criança uma relação de confiança, afeto e tudo acontece de forma extremamente sutil. A criança na maioria dos casos, não identifica imediatamente que a relação é abusiva e por esta razão não revela a ninguém. Muitas vezes por desconhecimento do que pode significar aquele ato ou manuseio dos órgãos genitais do agressor. E com isso o abuso vai avançando e tornando-se explícito. Esse ciclo entre o avanço e o silêncio pode durar anos. E o segredo vai se dando em consequência das ameaças e barganhas por parte do abusador para garantir que a vítima mantenha a situação abusiva em segredo, uma vez que o agressor sabe que a interação é ilegal e imoral. Geralmente o segredo é mantido devido às ameaças de morte de pessoas significativas para a vítima. As barganhas não são fantasias, são reais e elas têm poderes que desencadeiam longos silêncios. Vão desde presentes, ofertas e regalias com gigantescos privilégios. 
O assunto é complexo e muito doloroso, mas é uma triste realidade encontrada de forma muito comum, no aspecto psíquico entre muitos adultos. Quantas pessoas experienciaram situações de abusos e mantiveram-se em silêncio, por longos anos. E o pior, tendo que às vezes, conviver com o agressor na rotina familiar do dia a dia. O abuso sexual constitui um grande trauma, semelhante a uma ferida jamais sujeita à cicatrização. 
As crianças ou adolescentes vítimas de abusos sexuais apresentam mudanças extremamente visíveis em seu comportamento, iniciam um processo de isolamento, permanecem mais agressivas do que o é habitualmente, iniciam as fugas, comportamento hiper sexualizado, abandona os hábitos lúdicos, insônia, pesadelos, falta ou excesso de apetite. Seu estado emocional também modifica, fica mais frágil, com vergonha, medos, ansiedade, irritabilidade, raiva, tristeza e culpa. Também ficam com baixa concentração e atenção, desconfiança e transtornos de memória.
Pode acontecer de ter mudanças comportamentais de regressão, tais como chupar o dedo, fazer xixi ou coco na cama, comportamentos autodestrutivos, machucar a si mesma, etc. É importante denunciar, não se calem. Busquem ajuda. A ingenuidade, às vezes, cega. É muito importante falar aos filhos sobre sexualidade e todo o seu contexto.
 

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