O presente artigo dá início a uma série dedicada a explorar os mitos corporativos organizacionais e juridicos no âmbito da gestão de pessoas (área trabalhista). Há 25 anos ouço de empresários: “Empregados sempre ganham na Justiça!” Verdade ou mito? Mito.
O que é verdade nessa “eterna batalha” entre os dois lados da relação de trabalho é que empregados “ganham” mais ações trabalhistas que as respectivas (ex) empresas, o que faz gerar e perpetrar o mito.
Ocorre que gramatical e quantitativamente há uma diferença muito grande entre “sempre ganhar” e “ganhar mais”, e o fato de a grande maioria das empresas (empresários) não querer encarar de frente o porque perdem a maioria dos processos, colabora para o fortalecimento do mito.
Por que empresas perdem mais que ganham? Quase nenhum gestor se faz ou faz esta pergunta, ou se a faz já tem a(s) resposta(s) “na ponta da língua” - acreditando que esteja(m) certa(s) -, e geralmente seguem a seguinte linha: “O juiz tem dó do empregado e acaba dando alguma coisa para ele”; “a Justiça do Trabalho só existe para defender empregado”; “a Justiça do Trabalho é cega”; “qualquer coisa que o empregado e suas testemunhas disserem o juiz acredita”; “é impossível cumprir tudo o que está na lei”.
Quase nunca (ou nunca!) se ouve: “A empresa perdeu porque devia mesmo alguns direitos”; “perdeu porque preferi arriscar e ver no que iria dar”; “perdeu porque achei que o empregado, deseseperado por dinheiro, aceitaria um baixo valor de acordo”; “perdeu porque nunca procurei saber o que o Direito do Trabalho prevê”; “perdeu porque nunca quis gastar com advocatícia preventiva”; “perdeu porque nunca preferi prevenir, mas remediar”.
Empresas não perdem ações trabalhistas porque o juiz tem dó do trabalhador ou porque a Justiça é cega. Perdem mais processos por questões racionais, objetivas, contábeis, jurídicas e organizacionais.
Verdade: a legislação trabalhista é vasta, complexa, repleta de previsões que suscitam dúvidas de interpretação e aplicação.
Verdade: o Direito do Trabalho nasceu e se desenvolveu para proteger o trabalhador contra o tomador de serviço (assim como o Direito do Consumidor nasceu para defender este contra o fabricante, mas aí ninguém reclama).
Verdade: a legislação trabalhista prevê uma quantidade enorme de direitos aos trabalhadores que efetivamente custam muito dinheiro e por isso há empresas que mensalmente precisam escolher o que vão pagar (porque há o elevadíssimo custo tributário e burocrático brasileiro), dando origem a um passivo trabalhista.
Mas é verdade também: a maioria das empresas não quer saber como o Direito do Trabalho e a legislação funcionam e toma decisões na base do instinto, copiando o que outras empresas fazem e consultando o Google ou quem não é especializado no assunto.
Mas é verdade também: ao não quererem conhecer o Direto não querem agir preventivamente, preferindo se expor a risco de ação e de perder dinheiro.
Verdades: ações trabalhistas podem ser evitadas investindo (e não “gastando”) em prevenção; ações trabalhistas podem ser ganhas totalmente pelas empresas com ajuda do compliance; impactos jurídico-financeiros de ações trabalhistas podem ser reduzidos com governança.
De tudo isso resta a pergunta aos gestores: querem continuar alimentando o mito ou aceitar algumas verdades?