Novas formas de se relacionar impulsionam a compulsão

- THIAGO MORELLO

Data 20/02/2019
Horário 09:59

Em 2018, o Instituto Akatu publicou uma pesquisa a qual mostra que 76% dos jovens, em média, não praticam o consumo consciente. Mas, em análise ao fato, e propriamente à atualidade, a psicóloga Ieda Benedetti não só confirma a situação, como coloca as novas formas de relacionar, aliadas à tecnologia, como as principais causas que levam a uma tendência maior de compulsão. Hoje, a especialista ainda entende que essas compulsões, além do próprio consumo (gastos com cartão de crédito), se sobressaem ainda no uso de drogas e na prática do sexo. “É como uma atualização das compulsões”, completa Ieda.

Em outras palavras, a psicóloga busca dizer que as novas formas de se relacionar fazem com que os jovens tenham outra formação de personalidade mais suscetível ao consumo. “Eles são influenciados por personalidades que não são pessoas. Não é um sujeito, e sim uma página. Uma página que é dirigida para várias pessoas”, detalha.

Isso tudo ocorre para reprimir anseios e problemas que as pessoas possuem, ainda de acordo com Ieda, mas que buscam tratamento de forma errada. “Elas procuram ajuda em lugares que não podem dar, como livros e vídeos de autoajuda, pessoas que não possuem formação e vão repetir um texto que vão culpabilizar o sujeito e não o contexto em que ele vive”, observa.

E a partir disso, ocorre o desaparecimento de valores. Como a humildade, onde todos se exibem nas redes sociais; a confusão do que é público e privado, com compartilhamento de coisas pessoais; e a transitoriedade, onde tudo é rápido demais e em pouco tempo o que é tendência já não é mais, ainda conforme a psicóloga.

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Ieda, psicóloga: “Eles são influenciados por personalidades que não são pessoas”

Como lidar?

O consumo excessivo do jovem, de acordo com a psicóloga Bianca Beletato, também pode estar atrelado à necessidade ser aceito em um determinado grupo, fazendo com que ele “tenha que comprar ou possuir algo que as pessoas daquele meio social têm”. Desta forma, ela indica que a melhor forma de lidar com a insegurança e aceitação é entender, desde cedo, que nem sempre isso é possível. “Nesse contexto, o melhor caminho é a conversa, seja com um profissional ou com os pais, que, por sua vez, devem dar o exemplo”, completa. Isso inclui também: imposição de limites, participação do orçamento doméstico e conscientização sobre poupança.

perfil

                                                                José Reis

Caio: "Juventude está cada vez mais ansiosa e compulsiva"

Nome e idade: Caio Pedrinho da Silva, 22 anos

Ocupação: mestrando em Administração

Curso: formado em Administração

Faculdade: Unoeste (Universidade do Oeste Paulista)

Cidade de origem: Presidente Prudente

Você se considera uma pessoa consumista?

Acredito que eu seja mais controlado, pois sei me organizar financeiramente e conter meus gastos e impulsos. Compro as coisas apenas quando acho realmente necessário, e não apenas por me interessar em algo.

Quais ações você adota para ser uma pessoa mais controlada no dia a dia?

Penso que me tornei assim por questões educacionais, pois desde pequeno meus pais sempre me ensinaram e me incentivaram a aprender a controlar o meu dinheiro e refletir as necessidades daquilo que eu queria. Então, sempre que me deparo com algo que demanda um gasto, eu reflito se aquilo é necessário, se será útil para mim ou se é algo apenas relacionado à emoção do momento.

Qual sua opinião sobre a possibilidade de hoje o jovem estar ligado a uma rotina que mais o aproxima com o consumo excessivo?

A juventude brasileira está se tornando cada vez mais ansiosa, compulsiva e exibicionista, gerando assim o aumento do consumismo da população. E consigo perceber isso ainda no meu convívio pessoal, onde muitas vezes, por falta desse controle financeiro, psicológico e emocional, acabam usufruindo de diversos bens ou serviços que não são necessários.

No seu ponto de vista, é difícil estar em um meio social e não ser atingido por essa onda consumista?

No atual cenário brasileiro acho difícil não ser uma pessoa consumista, pois o meio social nos impulsiona a isso. Além das organizações, que estão se aproveitando cada vez mais das fragilidades humanas para te inserir nesse mundo.

dica de filme

Clube da Luta (1999)

                                                             Divulgação

A primeira regra do Clube da Luta é não falar sobre o Clube da Luta. Mas acredito que dessa vez seremos perdoados. Porque precisamos falar sobre o filme Clube da Luta, sob direção de David Fincher, que mesmo completando 20 anos em 2019 ainda é atual. Isso porque, em resumo, o filme conta a história de um executivo jovem, estrelado por Edward Norton, que trabalha como investigador de seguros. A vida dele entra em colapso a partir do momento em que ele se vê insatisfeito com seu cotidiano e ainda enfrenta uma terrível crise de insônia por dias. Para passar por isso, ele começa a frequentar grupos de autoajuda, convivendo com pessoas problemáticas, como a viciada Marla Singer (Helena Bonham Carter). Ademais, ele conhece Tyler Durden (Brad Pitt) - quando a verdadeira trama da história começa -, que o apresenta o misterioso Clube da Luta, e que além de extravasar suas angústias e tensões através de violentos combates corporais, planeja explodir prédios onde estão instaladas grandes as companhias. Mas o ponto alto do filme é que, apesar de ter tudo, comprar várias coisas, ter um apartamento completamente decorado, o protagonista não é feliz. Frases como “Trabalhamos em empregos que odiamos para comprar porcarias de que não precisamos” e “As coisas que você possui acabam possuindo você” são épicas do longa,  com o intuito de trazer a real crítica por traz da autoria: o consumo em excesso.

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