O padre e o fotógrafo

Roberto Mancuzo

CRÔNICA - Roberto Mancuzo

Data 18/04/2023
Horário 06:00

Eu nasci e cresci em um lar católico muito atuante. Meus pais sempre fizeram parte da comunidade da cidade onde me criei, na paróquia de Santo Antônio, em Junqueirópolis, e era natural que um dia eu também tivesse a vontade de servir.
Depois de idas e vindas, vida profissional, pessoal, filhos, lá estava eu pronto para então ser uma pessoa firme na fé, mas também na comunidade. Queria ajudar, trabalhar, viver uma vida feliz dedicada ao outro. 
Só que tinha um detalhe: eu queria trabalhar, mas não queria fazer exatamente o que já fazia profissionalmente na comunicação, no jornalismo ou na fotografia. Para mim isso era ganha pão e não havia razão de exercer exatamente a mesma coisa. 
Então lá foi eu fazer cursos de capacitação. Comecei na intercessão e depois outros. Passei até pela pregação, mas por incrível que pareça falhei miseravelmente em todas as tentativas. Eu não me encaixava, não tinha jeito. Nada ia para frente e eu ficava sempre com uma sensação de que não era aquilo.
Um belo dia, porém, enquanto chegava para dar aula na universidade, meu telefone toca e a conversa foi muito rápida.
- Olá Roberto, tudo bem? 
- Tudo bem! Quem fala?
- Aqui é o padre Rodrigo, que acabou de assumir a paróquia Nossa Senhora do Carmo, na Maristela.
- Sua benção, padre. Em que posso ajudar?
- Fiquei sabendo que você tira fotos. É verdade?
- Sim, produzo sim.
- Preciso que faça as fotografias lá na igreja e coloque também nas redes sociais.
- Tá.
- Então você começa já no domingo que vem. 
- ok. Obrigado!
Bem, o resto desta conversa é uma história riquíssima de oito anos atuando como fotógrafo na Pastoral da Comunicação. Quer dizer, não havia bem lá uma pastoral, mas hoje depois daquele convite eu olho para o lado e vejo dezenas de companheiros, todos também servindo em texto, vídeo e fotografia. Hoje temos uma pastoral dedicada à evangelização por meio da comunicação. 
O que tiro deste episódio é que seja qual for o seu talento ou o seu dom, é para os outros que ele faz sentido. É ao servir o outro que podemos encontrar a razão de uma vida feliz. Parafraseando uma passagem famosa do Novo Testamento, eu vivia com a minha luz embaixo da cama e isto estava errado. E vai entender por que tantos anos se passaram até que eu realmente entendesse qual era a minha utilidade. 
Bem, vai entender também por que ao contar esta história eu começo a chorar. A questão é que o mesmo homem que um dia me fez descobrir este presente está de partida. Domingo passado eu fotografei a última missa do padre Rodrigo em nossa comunidade. 
Foi muito difícil fazer o que sempre fiz. Vai ser difícil não o encontrar mais no visor da câmera.  
Para pessoas que têm fé como eu tenho, as maiores obras são feitas pelos homens e mulheres de boa vontade, intercedido por outros homens e mulheres que por vez são inspiradas pelo nosso Pai.
Não há nada de sobrenatural nisso. O que o padre Rodrigo me fez enxergar é que eu não precisava esperar para servir em uma área que às vezes nem teria competência para isso. 
Ele me fez enxergar que os nossos talentos e dons são únicos, dados por Deus para que usemos a serviço dos homens. E assim eu fui. E assim eu irei sempre. 
Amigo Rodrigo, é triste demais a sua partida e o choro me impede de escrever mais sobre isso. Mas eu sei que esse mundo precisa também de homens como você em outros lugares. 
Eu fico feliz em saber que uma outra comunidade, outras pessoas e outros homens como eu vão ser descobertos por esse olhar santo. Um dia serviremos novamente. Deus o abençoe, padre.
 

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