Pais com deficiência falam sobre o exercer da paternidade 

Neste especial do Dia dos Pais, O Imparcial conversou com Edson Silva, cadeirante, Romildo da Silva, deficiente visual, e Milton Mizukawa, que tem paralisia cerebral, sobre a vivência do que é ser pai

PRUDENTE - CAIO GERVAZONI

Data 14/08/2022
Horário 04:02
Foto: Freepik
Pais com deficiência são exemplos de força e resiliência
Pais com deficiência são exemplos de força e resiliência

“A pessoa com deficiência não é exemplo de superação. A pessoa com deficiência é o que ela tem, o que ela é. A gente aprende a se adaptar com o que nós temos”, ressalta o presidente do Condef (Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência) de Presidente Prudente, Salvador Neto.
Muito se fala de pais que precisam superar barreiras diariamente para criar filhos com deficiência, mas há também o contrário: homens com deficiência que não deixam suas limitações impedirem o exercício da paternidade. 
Neste especial do Dia dos Pais, a reportagem conversou com três deles sobre a vivência da paternidade e o que é ser pai a partir da perspectiva de Edson Silva, Romildo Luiz da Silva e Milton Takao Mizukawa. Alan Douglas Silva, filho de Edson, também, contribuiu com relatos sobre a vida do pai. 

“A pessoa com deficiência não é exemplo de superação. A pessoa com deficiência é o que ela tem, o que ela é. A gente aprende a se adaptar com o que nós temos
Salvador Neto

“Pai presente e atuante"

O policial civil Alan Douglas Silva, 33 anos, conta que seu pai Edson Silva, 57 anos, sempre foi um “pai presente, atuante e preocupado”. Edson é cadeirante e, além de Alan, é pai de Layanna Silva, 30 anos.
Em 1994, quando tinha 28 anos, Edson sofreu um trauma raquimedular ao cair de um pé de manga em Presidente Venceslau e ficar paraplégico. “Meu pai era corretor de seguros. Após o acidente, ele ficou cadeirante e teve que aposentar por invalidez. Ele quebrou a coluna em oito lugares, colocou platina nas costas”, conta o filho sobre o episódio. Na época, Alan tinha três anos e sua irmã Layanna apenas seis meses. 
Três anos depois do acidente, Edson passou pelo processo de separação da mãe das crianças. Alan, com seis anos, ficou com o pai, e Layanna, ainda muito nova, com três anos, ficou sob a guarda da mãe. 
Edson relata que a vivência da separação foi “um grande desafio”. “Depois da separação, você fica sozinho e aí você fala ‘e agora?’ Acho que se eu não tivesse meus filhos, eu não teria força para lutar. Não foi fácil, mas nunca parei para pensar, se você ficar parando para pensar, você não faz nada”, narra o pai de Alan e Layanna. 
“Mesmo assim, para complementar a renda, mesmo na cama, ele estudava e aprendeu a digitalizar trabalhos acadêmicos manuscritos desde 1995. Em 1998, ele aprendeu a fazer cálculos dentro de processos judiciais por meio do Excel. Ele pagou a faculdade para mim e para minha irmã”, relata Alan, formado em Direito. Layanna graduou-se em Estética. 
Edson conta que mal tem vida social desde o acidente e que apenas frequenta a igreja. O pai de Alan e Layanna conta que não teve tempo para perceber preconceito por parte da sociedade. Segundo ele, muito devido a sua personalidade e por ter tido condições de comprar um carro 0 km adaptado, tempos depois do acidente. Ele acredita que a aquisição do veículo foi uma condicionante para não passar por situações do tipo. “Percebi naquele tempo, que se você tiver um carro novo, zero, isso e aquilo, você já impõe a mais, sabe? Então, é diferente você sair da sua cadeira e entrar no seu carro e sair dirigindo. Talvez, com a pessoa que não tem carro e depende apenas da cadeira de rodas para rodar a cidade e pegar ônibus e tal seja diferente”, considera. 

Foto: Cedida

“Hoje com 57 anos, mesmo com saúde debilitada, me sinto vitorioso pelos meus filhos terem tido boa educação, serem criados na igreja e os dois formados e trabalhando”, conta Edson Silva

“Nunca foi empecilho"

O paratleta de natação, Romildo Luiz da Silva, 46 anos, é pai de Aissa Gabriele, 21 anos, e de Jônatas Josué, 19 anos, e há 10 anos convive com a deficiência visual após sofrer um AVC (acidente vascular cerebral) isquêmico e perder parcialmente a visão. Na época do acidente, Aissa tinha 11 anos e Jônatas 9. “Hoje, ambos estão cursando o ensino superior”, conta Romildo, que narra a relação de retribuição com seus filhos antes e depois de perder a visão de forma parcial. “Antes da deficiência, sempre cuidei, fui presente e tive uma interação muito grande em casa. Depois da deficiência, meus filhos continuaram e tiveram esta retribuição comigo, cuidando de mim, sempre me ajudando e auxiliando. A deficiência nunca foi empecilho para o nosso relacionamento, nem de mim para com eles, nem deles para comigo”, descreve Romildo. 
O paratleta, que atuava como carteiro antes do AVC, expõe que já percebeu em diversas ocasiões um certo desprezo por parte de outras pessoas que acham que a deficiência é um limitador na amplitude da paternidade. “As pessoas mais próximas que convivem comigo, me conhecem e sabem da minha vivência com meus filhos, sabem que eu nunca deixei a desejar em relação a isso [paternidade]. A deficiência não foi e não é ponto primordial para que falhasse enquanto pai. A deficiência não fez isso comigo”, indica o pai de Aissa Gabriele e Jônatas Josué, e esposo de Valdirene. 

Foto: Cedida

“Antes da deficiência, sempre cuidei, fui presente e tive uma interação muito grande em casa. Depois da deficiência, meus filhos continuaram e tiveram esta retribuição comigo”, relata Romildo Luiz da Silva

“Tenha empatia"

O servidor público Milton Takao Mizukawa, 65 anos, é sereno ao falar sobre o que aprendeu em sua vivência como pai. “Apreendi que tudo o que você ensina para os seus filhos, com o tempo, terá bons frutos. Então, ensinei a não discriminar a pessoa com deficiência. Ter empatia e ser amigo dessa pessoa. Ensinei-os a apreender a conviver com a deficiência do pai”, reflete Milton, que nasceu com paralisia cerebral, e frutificou família junto à Elza Terada Mizukawa. 
Questionado se já passou por alguma situação de preconceito, o pai de Eduardo e Jéssica cita um causo após o casamento com dona Elza. Na ocasião, Milton comunicou a um conhecido de longa data que havia se casado com Elza e esta pessoa o alertou para não ter filhos. “Ele me disse que eu não deveria ter filhos, porque a deficiência é hereditária. Tentei explicar que não é. Só que a pessoa continuou com a tese que eu não deveria ter filhos”, narra o servidor público. Os frutos do casamento com dona Elza são Eduardo Jum Mizukawa, 31 anos, que está no Japão, e Jéssica Mitiko Mizukawa, 26 anos. 

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“Apreendi que tudo o que você ensina para os seus filhos, com o tempo, terá bons frutos”, narra Milton Takao Mizukawa

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