Panela Preta

Persio Isaac

CRÔNICA - Persio Isaac

Data 25/09/2022
Horário 06:07

17 de junho de 2003. A manhã prudentina está abençoada com um céu límpido e azul. Os amigos não imaginavam que aquela manhã iria ser diferente. O sol não cobra nada por seus raios, apenas mostra que Deus está presente. Na Lanchonete Tio Patinhas, o point mais tradicional da nossa amada aldeia, suas famosas e deliciosas esfirras são apreciadas e possuem fama nacional. 
Os amigos vão chegando: Diorai (in memoriam), Café, Maurão, Lázaro, Santão, Pena, Carlinhos Faria já estão prontos para a resenha. Sempre que encontro algum deles o papo é sempre alegre. Usam a linguagem dos boleiros para entender e explicar a vida: Oh Café, como está a vida? Persio tá zero a zero, só bola na trave kkkk. Lembro do "Rosca" que fez um golaço numa partida importante no campeonato amador. Pergunto a ele: Rosca, mas que golaço, como você fez? Ele com aquela humildade toda me responde: "Bati nela sem pedir explicação". A gente ri sempre dessa tirada do Rosca. Grande cara. 
Nessa histórica manhã, eles têm a ideia de formar um time de futebol e jogar aos sábados e depois  se deliciar com as doces lembranças dos tempos da juventude,  comendo um saboroso churrasco e tomando uma loira bem gelada.  Todos eles têm uma gloriosa história no nosso futebol e também no samba. Carlinhos Faria é um filho do samba da tradicional escola de samba Bico de Ouro e Maurão, Café e compadre Pena da Unidos do Jardim Paulista. Tempos de ouro do nosso carnaval de rua. 
Carlinhos sugere o nome do time de Panela Preta e todos gostam do nome por representar suas origens. Assim começa a história de um dos times mais históricos e icônicos da nossa querida aldeia. O campo escolhido foi do Jardim Everest. Grandes jogadores veteranos do nosso futebol amador compõem o Panela Preta. 
Café é o eterno presidente e o Maurão é o eterno técnico que comanda o time rival que joga contra o time do Café, que também é treinador, mas todos são Panela Preta. A rivalidade entre os dois é um espetáculo à parte. Tive a honra de jogar nesse time. O maior barato é depois do jogo com as histórias engraçadas. Lembro de uma passagem onde um dos jogadores do Panela traz um primo para jogar. Chega no Café e diz: Presidente convidei meu primo que é de Dourados no Mato Grosso para jogar. O Café olha para ele e pergunta: Seu primo joga em qual posição? De ponta-esquerda. Isso não existe mais, responde o Café.  Eu e todos os que estavam perto rimos dessa observação do presidente. 
Quando fui presidente do Tênis Clube, convidei o Panela Preta para jogar no campo society do clube. Ficaram todos muitos felizes com o convite. Preparei uma recepção onde depois do jogo teríamos um delicioso churrasco com cerveja bem gelada para eles. No dia do jogo, começam a chegar os jogadores. O Maurão com seus quase dois metros de altura passa pela portaria com elegância, o Café, numa máscara danada, vai andando com seu andar característico carregando uma bolsa nas costas e com um tremendo chapéu que daria inveja ao maior pecuarista do mundo. A rapaziada vai entrando, despertando a curiosidade de todos. 
A funcionária que trabalha na secretaria vendo o time entrar me fala: "Presidente é Panela Preta mesmo". Até hoje rimos dessa passagem.  Foi uma tarde histórica onde a confraternização mostrou que podemos ter cores diferentes em nossas peles, mas não há tinturas em nossos corações. Nesse tempo a palavra "Negão" era falada sem maldade. Hoje a inocência não merece compaixão. Depois de muito tempo fui no campo do Jardim Santa Paula rever esses queridos amigos. Todos me receberam com muito carinho e pra variar o Café com suas tiradas de boleiro cria mais uma das suas pérolas: Oh Persio, olha aquele menino novo. Que que tem ele Café? Pô, ‘tá’ vendo muita televisão, quer enfeitar muito a jogada, parece bazar. Mais risadas. 
Depois do jogo fomos ao Bar do Balbino para o segundo tempo. Só que agora a bola é carne com cerveja. E as histórias vão sendo contadas e a alegria fica bem representada nesses amigos que vivem a felicidade nesse campo de ilusões. O Panela é uma grande família. 

Chega o Obina cantando o hino do Panela:
"Panela oh
Panela que me viu nascer
Eu abro meu peito e canto o amor por você 
Ole, ole 
Eu canto e sou Panela até morrer"... É nóis.

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