Quando o lar se torna um perigo

EDITORIAL -

Data 10/07/2025
Horário 04:15

Em meio à rotina das famílias, há uma realidade brutal que se repete de forma quase invisível, muitas vezes atrás das portas fechadas de lares que, à primeira vista, deveriam ser espaços de afeto e segurança: a violência contra a mulher. Casos reincidentes de agressões dentro de relacionamentos estabelecidos continuam a expor a fragilidade das estruturas de proteção e a complexidade do ciclo da violência doméstica. Diariamente, O Imparcial noticia casos grotescos de agressões físicas, verbais e psicológicas contra companheiras, esposas, namoradas. 
A Lei Maria da Penha, sancionada em 2006, representou um marco histórico no combate à violência contra a mulher. Com ela, o Brasil reconheceu formalmente a gravidade dos abusos físicos, psicológicos, sexuais, morais e patrimoniais dentro de contextos familiares e afetivos. No entanto, quase duas décadas depois, ainda assistimos a um número assustador de mulheres que sofrem caladas – muitas, pela segunda, terceira ou décima vez.
Em grande parte dos casos reincidentes, a mulher não denuncia. Não por conivência, mas por medo, dependência emocional ou econômica, vergonha ou esperança – esperança de que o agressor mude. E aí reside uma das armadilhas mais cruéis da violência doméstica: o ciclo da reconciliação e da recaída. Após uma agressão, o pedido de desculpas, as promessas de mudança e o aparente arrependimento fazem muitas vítimas acreditarem que foi “um episódio isolado”. Não é. Raramente é.
Pesquisas e relatos de especialistas apontam que, quando não tratado ou enfrentado com medidas firmes, o comportamento agressivo tende a se repetir e até a escalar. O agressor, ao não ser responsabilizado, sente-se autorizado a repetir o abuso – muitas vezes com mais intensidade. E a mulher, fragilizada emocionalmente e sem uma rede de apoio eficaz, sente-se encurralada.
Não é fácil romper esse ciclo. Denunciar exige coragem, mas também condições reais de segurança, acolhimento e suporte psicológico e jurídico. É preciso lembrar que muitas mulheres continuam em relações abusivas porque não têm para onde ir, com quem deixar os filhos, ou como se sustentar.
Portanto, combater a violência contra a mulher não se resume a oferecer canais de denúncia – embora isso seja fundamental. É necessário um sistema robusto e integrado que envolva delegacias especializadas, casas de acolhimento, assistência social, programas de capacitação profissional e campanhas educativas permanentes. E, mais importante: a sociedade precisa deixar de julgar a vítima e passar a entender a complexidade de sua dor.

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