Turma do fundão

OPINIÃO - Raul Borges Guimarães

Data 07/04/2024
Horário 05:15

Sempre fui da famosa “turma do fundão”. Você também? Já conheceu alguma? Precisamente, eu me posicionava lá no canto esquerdo, o que permitia uma visão diagonal de tudo que se passava na sala de aula. Observava melhor a mobilidade do professor entre os alunos, apreciava a rajada da luz solar penetrando pela ampla janela de frente para a rua, mapeava a troca de olhares entre os meninos e as meninas posicionados em diferentes pontos daquele ambiente escolar. Ou simplesmente, eu dava asas à imaginação por estar mais distante do controle do professor. Pode ser que essa vivência escolar não faça o menor sentido para você. Comigo, não. 
Penso que carrego até hoje a “turma do fundão” por onde eu passo. Acho que ela se projeta pelo espaço das cidades. Seriam elas formadas pelas galeras que se encontra pelas esquinas das cidades? É Kevin Linch que nos ensina: é ali que se estabelece a possiblidade de encontros inesperados pelo cruzamento de olhares, arranjos dos mais diversos, criação de pontos de referência para a mobilidade urbana. 
Sei lá... Foi do meu canto da sala que eu cheguei no “clube da esquina”, aquele que surgiu em Belo Horizonte (MG) nos idos de 1960, quando diversos jovens artistas passaram a se reunir nas esquinas da cidade para tocar e cantar, misturando ritmos como bossa nova, jazz, rock, dentre outros. Milton Nascimento, Fernando Brant, Wagner Tiso, Lô Borges, Beto Guedes - todos eles devem ter sido da turma do fundão, não?     
Nada contra vocês da “fila do gargarejo”, viu? Vocês sempre foram mais prestativos, atendiam mais rapidamente os questionamentos dos professores, tinham os cadernos em dia. Tudo bem que davam às costas pra gente. Não ficava chateado com isso, não. Era até divertido, pintava um clima entre nós. Afinal, “eu só preciso ter você por mais um dia, o meu pensamento tem a cor de seu vestido ou um girassol tem a cor de seu cabelo”! Ei, você aí, “você queria ser o grande herói das estradas, tudo o que você queria ser sem medo”... Não faz mal, “você ainda pensa e é melhor do que nada, tudo o que você consegue ser ou nada”! 
Salve a interação entre os diferentes nas salas de aula, nas ruas, nos movimentos. Salve a força de existências. Salve a “turma do fundão” e todas as esquinas das cidades.
 

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