De hoje a 25 de agosto, o Parque do Povo, em Presidente Prudente, vai receber uma obra que não se contenta em ser apenas vista. Ela quer ser escutada. Sentida. Percorrida. Quer fazer a cidade lembrar que, sob o concreto e a pressa, ainda corre um rio.
"Bocas do Rio. Canção Subterrânea" é uma instalação híbrida — visual e sonora — criada por Rafael Costa e Lizis e promovida pelo coletivo Cidade Sensível, com realização através do ProAC (Programa de Ação Cultural) do Governo do Estado de São Paulo. A obra ocupará 100 metros de comprimento no gramado próximo à galeria d’água e à pista de skate, transformando a memória oculta do Córrego do Veado em experiência viva.
O leito desse rio perdido é desenhado com galhos e cipós pintados em tons de azul, ondulando pelo gramado como se acompanhassem um fluxo invisível. A cor evoca tanto a ausência quanto a promessa da água.
Mas a obra não começa ali. Nas calçadas ao redor do parque, um traçado sinuoso pintado em azul guia o visitante até o coração da instalação, marcado por frases que despertam a escuta e a imaginação:
"A terra sonha com a água. E você, sonha com o quê?"
"Que som teria esta rua se o rio ainda cantasse?"
"O que a cidade soterrou em você?"
"E se fosse lago em vez de alagamento?"
No início do percurso, a própria galeria d’água — portal para o subterrâneo — ganha uma intervenção artística, pintada por dentro e por fora com a mesma paleta azul e a mesma textura orgânica dos galhos, criando um elo visual entre o espaço urbano e o fluxo escondido.
Espalhadas pelo leito, tubulações azuis se erguem como pontos de escuta: são as “bocas do rio”. Desses tubos, ecoam sons reais do Córrego do Veado, gravados em trechos onde ele ainda corre livre e em locais onde permanece confinado pelas galerias. O resultado é uma paisagem sonora imersiva, inspirada nos conceitos de paisagem sonora de Murray Schafer e nas experiências de John Cage, onde o som da água se mistura ao vento, aos passos e às conversas do parque.
Diferente de outras intervenções urbanas, a obra se insere na categoria de Land Art por intervir diretamente no espaço, usando o próprio território como matéria-prima simbólica.
“Em minhas pesquisas e produções com arte urbana, eu busco revelar e refletir as existências que são invisibilizadas. Convido vocês a experienciar essa instalação que vai refletir o elemento água como memória. Essa obra foi pensada para aquele ponto exato, porque ali o rio ainda corre subterrâneo”, ressalta Lizis.
Pensar e refletir o espaço urbano é investigar como a presença ou ausência de certos elementos no espaço geográfico podem determinar dinâmicas de seu uso.
“Para mim, a arte urbana tem esse poder de deslocar o olhar, de lembrar que o lugar onde vivemos tem camadas de história, de natureza e de vida que o concreto não apaga. É uma forma de reencantar o espaço público, de fazer a gente se perguntar: o que mais a cidade está escondendo?”, complementa.
Mais do que um exercício estético, a instalação é um convite a “escutar o invisível” — a reconhecer que, sob o chão da cidade, existem rios que continuam respirando. É também um gesto de resistência e de reencantamento: uma forma de devolver ao espaço público um fragmento do que a urbanização enterrou.
Entre o murmúrio da água e a presença física dos galhos azuis, “Bocas do Rio. Canção Subterrânea” propõe uma reconexão sensível entre natureza e cidade, memória e imaginação.
SAIBA MAIS
Rafael Costa é músico, compositor, luthier, educador musical e produtor cultural prudentino. Cofundador da banda Mocambo Groove e do coletivo Som na Linha, investiga paisagens sonoras e escutas ativas, usando a música como militância e a cultura como ato revolucionário.
Lizis é artista visual e produtora cultural com atuação marcada pela relação entre arte, corpo e cidade. Residente em Presidente Prudente, define sua pesquisa como experimentos visuais. Rompe limites poéticos entre pintura, colagem e escultura, criando estéticas híbridas.
SERVIÇO
Local: Parque do Povo – Gramado próximo à galeria d’água e pista de skate, Presidente Prudente
Período: 16 a 25 de agosto de 2025
Acesso: Livre e gratuito
Autoria: Rafael Costa e Lizis
Promoção: Coletivo Cidade Sensível
Realização: Governo do Estado de São Paulo – ProAC (Programa de Ação Cultural)
Projeto Cidade Sensível
Obra ocupará 100 m de comprimento no gramado próximo à galeria d’água e à pista de skate
Projeto Cidade Sensível
Projeto é um convite para refletir sobre a memória, a água e a cidade, na foto, o projeto aprovado
Altemar Ribeiro
Obra é assinada por Lizis (artes visuais) e Rafael Costa (arte sonora)