“Plus ultra”

O dia 20 de novembro é considerado, atualmente, como feriado estadual em alusão ao Dia da Consciência Negra. A lei que instituiu o feriado no Estado foi aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada pelo governador Tarcísio de Freitas. Como diz a cantora, Baby Consuelo, em sua música, “Todo dia é o dia do Índio”. A música chama “Curumim chama cunhatã que eu vou contar”. Acho também que todo dia é o dia da mãe, do pai, de consciência negra, da pátria, da bandeira, da solidariedade, do amor, da paz, enfim, o dia de dar vida à vida. 
Nesse dia tão especial da Consciência Negra, lembrei do grande escritor, contista, romancista, etc., chamado Machado de Assis. Ele nasceu no Morro do Livramento, no Rio de Janeiro, em 21 de junho de 1839. Autor dos romances “Dom Casmurro” e “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, o maior nome da literatura brasileira. Faleceu em 29 de setembro de 1908, deixando uma obra que soma, além de seus dez romances publicados, centenas de contos, poemas e diversas peças de teatro. Li ultimamente o seu pequeno e fantástico livro chamado “A igreja do diabo” e o “O Alienista”. 
“Plus ultra” é o tema do último capitulo-13, do livro “O Alienista”, e resolvi publicar fragmentos, que julgo serem fascinantes: Era a vez da terapêutica. Simão Bacamarte, ativo e sagaz em descobrir enfermos, excedeu-se ainda na diligência e compenetração com que principiou a tratá-los... Com efeito, era difícil imaginar sistema terapêutico mais racional. Estando os loucos divididos por categorias, segundo a perfeição moral que em cada um deles ultrapassava os outros, Simão Bacamarte cuidou em atacar de frente a qualidade predominante. Suponhamos um modesto. Ele aplicava a medicação que pudesse incutir-lhe o sentimento oposto. E não ia logo às doses máximas: graduava-as, conforme o estado, a idade, o temperamento, a posição social do enfermo. Às vezes, bastava uma casaca, uma fita, uma cabeleira, uma bengala, para restituir a razão ao alienado. Em outros casos, a moléstia era mais rebelde. Recorria, então, aos anéis de brilhantes, às distinções honoríficas, etc. 
Houve um doente poeta que resistiu a tudo. Simão Bacamarte começava a desistir da cura, quando teve a ideia de mandar correr matraca, para o fim de promovê-lo como um rival de Garção (poeta português do século 18) e de Píndaro (poeta grego). Foi um santo remédio, contava a mãe do infeliz a uma comadre; foi um santo remédio... Tal era o sistema. Imagina-se o resto. Cada beleza moral ou mental era atacada no ponto em que a perfeição parecia mais sólida; e o efeito era certo. Ou melhor, nem sempre era certo. 
No fim de cinco meses e meio, a Casa Verde estava vazia. Todos curados!... O alienista ficou radiante ao ver sair o último hóspede da casa, mostra com isso que ainda não conhece o nosso homem. Plus ultra! Era a sua divisa. Não lhe bastava ter descoberto a teoria da verdadeira loucura; não se contentava em ter estabelecido em Itaguaí : o reinado da razão. Plus ultra! Não ficou alegre, ficou preocupado, pensativo; alguma coisa lhe dizia que a teoria nova tinha, em si mesma, outra e novíssima teoria. “Vejamos, pensava ele: vejamos se chego, enfim, à verdade”. 
O desfecho é encantador, assim como Machado de Assis e toda a sua forma em narrar. É necessário permanecer com o dicionário do lado, para acompanhar toda essa riqueza de expressões. Vocês sabem o que significam “aplicar o remédio da matraca” e o termo “Plus ultra”? Não perguntem para a I.A.! Salve, salve Machado de Assis!
 

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