"Ocupação Ana Mae Barbosa” é uma exposição em cartaz em São Paulo que celebra o legado da professora referência no campo da arte-educação. São mais de 300 itens – alguns deles inéditos -, que retratam uma vida pautada pela luta por políticas públicas capazes de garantir o ensino de arte nas salas de aula do país. Ao propor seu método triangular (fazer artístico, leitura da obra de arte, contextualização histórica e sociocultural), Ana Mae rompe com a ideia de que a arte deve ser “decorativa”, “genial” ou “distante”. Em vez disso, ela valoriza a vivência e a experiência pessoal; convida os estudantes a refletirem sobre sua realidade; reconhece a arte como um campo de produção de sentidos cotidianos e plurais; aproxima a arte da sala de aula como direito cultural, e não como privilégio. Fiquei pensando na falta que está fazendo a presença da arte na escola, desde as crianças até as carteiras universitárias.
Nesta semana, o professor Mateus Fachin desenvolveu importantes atividades de integração da literatura com a música na disciplina sobre a produção e a escrita de gêneros literários na geografia da Unesp (Universidade Estadual Paulista). A turma faz uma homenagem à escritora Carolina Maria de Jesus. Eles lembram que ela acordava com o dia, antes que o sol batesse de cheio na favela do Canindé. Com um caderno achado no lixo e um lápis gasto que guardava como quem guarda o último pão, ela escrevia. Escrevia a fome, a espera, o grito preso na garganta, os ruídos da miséria que ninguém queria ouvir. A favela inteira era um coro de latas amassadas e crianças descalças, mas nas palavras de Carolina, aquilo virava outra coisa: virava vida.
Sabemos que Carolina Maria não esperava ser lida. Escrevia porque precisava. Porque doía. Porque tinha dentro dela um gesto que transbordava. Quando enfim publicaram "Quarto de Despejo” - obra que vendeu mais de um milhão de exemplares e foi traduzida para 14 línguas e distribuída em mais de 40 países, o país se espantou como se a arte tivesse surgido do nada. Mas ela, na verdade, estava ali o tempo todo — na lata reciclada, no papel rasgado, no silêncio das mães que choram sozinhas. A arte não caiu do céu: brotou da terra dura da periferia. Fez da arte algo da ordem do comum, do coletivo, do corpo presente. Não algo que se observa em silêncio num museu intocável, mas algo que se vive, se discute, se transforma.
A arte não é um quadro na parede da elite. A arte é a comida repartida, o batuque no intervalo, a lágrima escondida atrás do riso forte. A arte está viva porque é de todos. Como diz Gilberto Gil, "a cultura é ordinária! Cultura é igual feijão com arroz, é necessidade básica. Tem que estar na mesa, tem que estar na cesta básica de todo mundo.”