A casa da Família Macuco

Persio Isaac

CRÔNICA - Persio Isaac

Data 27/12/2024
Horário 07:09

Minha filha, Luiza, tinha marcado às 14h30 para ir num consultório médico. Saímos às 14h de casa. Passamos na empresa e, dali, seguimos ao consultório médico. Nem imaginava que o consultório era em frente a um dos símbolos do bairro do Bosque: a Padaria Trigal. O bairro do Bosque onde morou grandes figuras prudentinas, como o lendário Zé Geraldo (jogou na seleção brasileira de basquete), nosso eterno playboy Nenê Medeiros, Nelito (in memoriam), Rosa "Grace Kelly" Peretti (in memoriam), Vado Leal, Marco Antonio Colombo, Celso Oishi, Toninho Marini, Lelena (in memoriam), Solange Zacharias (in memoriam) e tantos outros amigos e amigas. 
O bairro do Bosque continua charmoso. Os quadros da memória apareceram nesse momento para mim.  Lembrei da casa do Tadeu Ciabatari que apelidamos de  Transilvânia. Era conhecida como: "A casa do Drácula" kkk. Não me perguntem o porquê, só imaginem kkk. Lembrei de mais amigos e amigas que habitaram o charmoso bairro do Bosque: Quincas Medeiros, Diorla e a Márcia Faustino. 
Fui passeando pelo bairro, esperando minha filha. Só lembranças magníficas fui sentindo. Uma grande emoção tomou conta de mim, quando parei em frente de outro grande símbolo do bairro: a casa da Família Macuco. Estava à venda. Entrei na casa vestido de saudade. Andava pela casa e parava, andava e parava. Belas lembranças chegavam como abelhas num pote de mel. Parado na sala, uma doce lembrança veio me abraçar. A querida amiga, Maria Célia Macuco, recebendo, com seu sorriso cheio de personalidade, os amigos chegando para mais uma grande festa. Voltei no tempo. 
Desci até aquele famoso jardim de inverno, onde ouvi um dos mais bonitos sambas composto pelo Cau Pimentel (in memoriam), que na ocasião estava presente cantando, “Verso Novo”, dele e de Eduardo Gudim: "Começa a festa seu dia chegou/a roda de samba está aberta/ as mesas, os copos/ desculpe o tempo te apagou/ pergunto agora/ como é que vai ser/ teu pranto vai te convencer/ sozinha/ e ninguém pra te socorrer". Adoro esse samba. Uma poesia em forma de canção. Cantei muito esse samba nas rodas de samba nos tempos de faculdade. Me senti como Toto, personagem do filme “Cinema Paradiso”. Abraçado na saudade, sentindo toda a energia daquela casa mágica. Abri a porta do porão e senti que o passado ainda pulsava e teimava em viver, não deixando o tempo apagar as ilusões que ali vivemos.  
Entrei no porão, naquele espaço mágico, e sorri. Ali nasceu o icônico grupo musical Cabelos Ruins. A imaginação é fantástica. Pude sentir e ver eu na bateria, Alceu Macuco na guitarra e o Nelitão no baixo. A moda nos anos 60 era ter cabelos lisos e Ronnie Von era o príncipe dessa moda maldita. Nós três tínhamos cabelos crespos e por isso o nome do grupo: Cabelos Ruins. Uma expressão de protesto, uma gostosa transgressão. Foi a nossa maneira de protestar contra essa ditadura dos cabelos lisos. Não aguentávamos usar mais a insuportável "touca". 
Não poderia deixar de sentir e de lembrar da beleza de Silvia Helena (in memoriam) cantando “The Look Of Love”. Os três cabelos ruins timidamente embriagados de desejos acompanhando a rainha da sensualidade. Foi como ganhar na Mega Sena de final de ano sozinho. Foi um gol de Pelé. Doce lembrança. Não me peçam para contar o tapa nos pratos da bateria que o excelentíssimo, Dr. Macuco, deu na hora que estávamos ensaiando para a tão esperada estreia que seria no aniversário do "Pacardão" (Ricardo Peretti). Não percebemos a altura do som e conseguimos ultrapassar os limites da paciência do Dr. Macuco, que estava trabalhando. Espero que ele nos tenha perdoado. 
Será que a Da. Neusa vai me chamar para fazer uma chamada oral de português? Só quem viveu essa época vai entender o teor desse trauma. Da. Neusa merece todas as homenagens. Foi excelente professora de português. Eu deveria ter estudado e escutado mais ela. Hoje sofro com meu desconhecimento na gramática.  Tinha medo do Ciro Macuco. Era grande e tinha uma mão do tamanho de uma raquete de tênis. O Gabriel Macuco um cara tranquilo. A Marta ficava na dela e o Celso com seu jeito frágil, com uma inteligência voraz. O Alceu com seu jeito tímido via a vida poeticamente. 
A hora da saudade começa chegar ao fim. Meu celular toca, minha filha. Me despeço do passado e volto para a  realidade. O personagem, o Corvo, do poema de Edgar Alan Poe, me vem à mente trazendo a frase emblemática: "nunca mais".  Pedi para minha filha tirar uma foto da casa onde uma placa diz: "Venha para onde estão os melhores! Minha filha pergunta: Quem morava nessa casa pai? Disse: A família do Dr. Macuco. Aqui filha, deixei um pedaço do meu coração. Tempos de ouro. Vejam vocês.
 

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