A realidade do mal e o remédio da caridade

OPINIÃO - Leonardo Delatorre Leite

Data 02/04/2021
Horário 05:00

Em meio a tantos problemas e adversidades, é comum e natural a associação da contemporaneidade com uma espécie de “imanentização do mal”, cujos traços funestos fomentam tão somente a desesperança, o sofrimento, o desânimo e a destruição do que nos é precioso. Contudo, é muito importante frisar que o mundo, desde os primórdios da história humana, manifesta sinais de uma aparente “desordem”.
O grande filósofo da patrística, Santo Agostinho, frisava de forma categórica uma visão segundo a qual o mal não existe enquanto uma realidade ontológica, ou seja, enquanto substância. Mais tarde, São Tomás de Aquino definiu o mal enquanto “carência de um bem devido”. Essa concepção filosófica é extremamente eminente para a realidade humana, pois demonstra o caráter reducionista das cosmovisões que tendem a associar a causa derradeira da desordem e do mal a uma ideologia econômica, período histórico ou filosofia política. O mal não é absoluto, sendo assim, ele não se restringe a um sistema econômico, mentalidade política ou a um personagem histórico. A razão pela qual o mundo é afetado pela desordem é complexa e não pode ser explicada por visões de mundo pautadas por uma espécie de “imanentização escatológica”, conforme diria Eric Voegelin.
Nesse sentido, é equivocada a associação da origem do mal a uma ideologia política ou a um fenômeno histórico. Restringir a origem do mal a um conjunto de ideias é uma desonestidade intelectual. Ademais, o mundo contemporâneo está em desordem, mas tal fato não é uma peculiaridade da contemporaneidade, já que a história humana foi construída em meio ao sofrimento, luta, guerras e tristeza. O principal responsável por essa triste conjuntura encontra-se na natureza humana e apresenta uma causa quase que atemporal. Muitas vezes, falta ao homem um bem necessário para promoção da ordem, a saber: a genuína virtude da caridade, cujo centro encontra-se no amor fraterno. A carência desse bem explica a complexidade do problema do mal.
O amor não só representa o caminho para a vitória sobre a desordem, como também configura o principal motor da esperança e do ânimo para enfrentar as adversidades e instabilidades. Nas palavras de Santa Teresinha, o amor é a vocação derradeira de todos os homens. Uma das principais formas de demonstrar a caridade genuína consiste na preocupação e no zelo para com a realidade que nos cerca, para com as pessoas que nos são próximas. Pequenos atos de amor para com o próximo representam, em última instância, um verdadeiro remédio para esse caos aparente.
Não nos preocupemos, portanto, em restringir nossas ações tão somente em apontar os abusos das ideologias políticas. Mais vale um ato concreto de amor, cujo centro reside na obra redentora de Cristo, do que meras disputas ideológicas.
Praticar o amor exige sacrifício, desapego, mortificação e renúncia. Segundo Hannah Arendt, o mal pode ser extremo, mas nunca radical. Somente o bem pode ser radical e profundo. Tenhamos, portanto, a determinação para não falharmos na genuína caridade. “Não é bastante afastar-se do mal; é necessário ser bom. Deixar de roubar o alheio não basta, é necessário dar do que é seu. Deves afastar-se do mal a ponto de fazeres o bem” (Santo Agostinho).
 

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