Boleiros

Persio Isaac

CRÔNICA - Persio Isaac

Data 11/07/2021
Horário 06:00

A maneira de expressar de qualquer povo sempre será uma criatividade à parte. Aqui no Brasil existe uma outra linguagem para explicar a vida, a linguagem da bola. O futebol e seus personagens usam expressões de um jogo de futebol para exemplificar ou explicar o imponderável jogo da vida. 
Um dia andando pelo calçadão, encontrei o querido amigo, Antonio Carlos Miranda, o famoso Café, eterno presidente do lendário time Panela Preta. Num bate-papo descontraído, perguntei: E aí Café, como está a vida?  Ih presidente tá 0 a 0 só bola na trave. O bom humor é a marca registrada dos boleiros, para eles a vida é como um jogo de futebol. 
Meu irmão, Ronaldo Isaac, estava jogando de lateral-direito no lendário time dos veteranos do Corinthinha Prudentino. Entrou no campo com um tênis cujo solado estava desgastado, liso como um sabão. Lino, que jogava de volante, usou a expressão: Ué, parece que o Roy vai jogar com um tênis "Kojac", se referindo ao famoso detetive vivido pelo grande ator, Telly Savalas, que era careca. 
Vamos seguindo o jogo. Peba Miranda (in memoriam) era cheio de expressões de efeito. Assistindo um jogo da Alemanha, se encantou com o lateral-esquerdo, Paul Breitner, que revolucionou essa posição: Oh Roy você viu esse tal de Breitner? Que que tem Peba?  Então rapaz, o home chuta de esquerda, entra pelo meio, faz gol, vai na linha de fundo, faz cruzamento tanto de esquerda como de direita, disse Peba encantado com a habilidade de Breitner. 
E continua com suas observações: E esse tal de Maradona? Rapidinho ele passa por dois, três, eu só jogo na minha né, vou me complicar pra quê? Roy gostava muito do Peba, que foi um zagueiro habilidoso da Família Miranda. Outro personagem foi o Zadinha (in memoriam), habilidoso meia. Num jogo, o Nenê Medeiros estava complicando demais seu jogo e Zadinha com sua filosofia simples de viver disse: Nenê faz o fácil que já é difícil. Segue o jogo. 
Um dia encontrei o querido amigo, Lê o Garrote (in memoriam) e perguntei: E aí Lê, sumiu? Oh Magrão, tô buscando o jogo, caio pra direita, abro na esquerda, entro pelo meio, mas a bola não chega, explicando o momento da sua vida. O bom humor dos boleiros é que me dá saudades. Quando o cara está com uma mulher bonita, a boleirada fala pra ele: Vê se não apoia muito pra não tomar uma bola bandida nas costas, na área da vida está cheio de bons centroavantes só esperando a bola no segundo pau. O alambrado é uma praça da alegria. Cada figura e suas sabedorias. 
O lateral direito estava indo muito pro apoio e todo lançamento estava sendo nas suas costas. Prevendo uma tragédia, um personagem do alambrado que não me recordo o nome gritou com aquele linguajar caipira: "Oh laterar, o jogo tá muito açulerado (acelerado), fica mais, "potrege" mais a bola. Outra história engraçada: Chegou dois caras do sítio para fazer um teste no Corinthinha. O treinador já foi perguntando: Vocês jogam do que? O menos tímido disse: Ó se for pra "dribá" eu vou na ponta direita e meu primo vai no meio, mas se for prá fazer gol eu vou pro meio e meu primo vai na ponta. Mas que m...  é essa?, disse o treinador bravo. Eu preciso de um ponta-esquerda. O menos tímido disse: "Eu posso ir, mas só chuto bola pingando". Vejam vocês.
 

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