Cara cortada

Persio Isaac

CRÔNICA - Persio Isaac

Data 03/10/2021
Horário 06:50

Otto Skorzeny era considerado pelos aliados na Segunda Guerra Mundial como o homem mais perigoso da Europa. Tinha uma grande cicatriz na face, consequência de duelos de esgrima nos tempos de faculdade. Ganhou a alcunha de "cara cortada". Oficial da temida SS e homem de confiança de Adolf Hitler. Suas missões de sabotagem, espionagem, resgates, foram sempre muito ousadas. 
Quando Benito Mussolini foi deposto e preso a pedido do Rei Victor Emanuel III, Hitler escolheu e confiou no tenente-coronel da SS, Otto Skorzeny, o resgate de Benito Mussolini. A operação Carvalho foi um sucesso. O ditador fascista estava preso num hotel onde o único meio de chegar era o uso de teleféricos. Otto desceu na região Grans Sasso nos Apeninos com planadores e paraquedistas. Não foi dado um único tiro. Quando Benito Mussolini foi libertado, disse a famosa frase: "Eu sabia que meu amigo viria me libertar". 
Otto Skorzeny foi o oficial mais condecorado da SS. Era carismático, 1.92 metro de altura e vinha de uma família rica da Áustria. Se formou engenheiro e se simpatizou pelo partido nazista quando passou a conhecer o ideário do partido. Era admirado pelos alemães e tratado como um herói. No fim da guerra, ele se entrega aos aliados. A política entra em cena. O interesse do Ocidente era agora combater o comunismo. Sua fuga é facilitada pela OSS (serviço de inteligência dos Estados Unidos) a precursora da CIA. Muitos nazistas foram protegidos e contratados para combater o comunismo. Muito deles foram para a América do Sul, como o carrasco de Lion, Klaus Barbie da Gestapo, que desempenhou uma função importante no governo do general Hugo Banzer na Bolívia. Ajudou a CIA a capturar o revolucionário Che Guevara na Bolívia. 
Os nazistas sempre foram adversários ideológicos ferrenhos contra o comunismo. A guerra fria estava nascendo. Otto foi morar na Espanha sob a proteção do ditador Francisco Franco Bahamonde. Se tornou um homem rico e influente. Além de negócios com o presidente da Argentina, Juan Domingos Perón, agia também como conselheiro e guarda costas de Eva Perón. 
Um dia na sua casa em Maiorca na Espanha, foi visitado por agentes do Mossad. O Egito sob a presidência de Gamal Abdel Nasser tinha planos de desenvolver mísseis balísticos com intenção de destruir Israel. Cientistas alemães foram contratados para desenvolver esse projeto. Um nazista estava prestes a se tornar um espião da agência de espionagem israelense. Aceitou, mas exigiu que seu nome fosse tirado da lista de Simon Wiesenthal, famoso caçador de nazistas. Não quis dinheiro. O brilhante cientista alemão, Heinz Krug, que trabalhou com Von Braun, estava nesse projeto egípcio. 
Como Otto era um herói admirado pelos alemães, seria fácil ganhar a confiança dos cientistas. E foi o que aconteceu. Heinz Krug foi morto em Munique, estava com Otto Skorzeny. Cartas bombas, sequestros foram usados para intimidar os cientistas e eles com medo saíram do projeto. O Egito foi obrigado a abandonar seu desejo de destruir Israel. Um nazista ajudou a salvar Israel. As circunstâncias, os interesses sobrepõem qualquer ideologia, moral ou ética. 
Otto Skorzeny fez parte da Odessa, organização que organizava a fuga dos oficiais nazistas para qualquer parte do mundo. Nunca mostrou arrependimento e jamais deixou de ser um nazista. Morreu de câncer no pulmão em 1975 em Madri. No seu funeral, suas cinzas foram jogadas em Viena. Não faltaram canções e símbolos nazistas. O agente do Mossad, Ranaan, que tinha perdido sua família no holocausto, estava presente para prestar sua homenagem ao melhor, mas também mais desprezível agente, que jamais esteve sob seu comando: Otto Skorzeny, ex-tenente coronel da Waffen-SS.
 

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