A ansiedade é frequentemente interpretada como um estado de nervosismo comum, algo que todos enfrentam em certos momentos. Mas, para muitas pessoas, ela se torna uma presença constante, que ultrapassa o campo emocional e afeta diretamente o corpo, especialmente o coração.
Quando o organismo entra em estado de alerta, uma série de mudanças físicas se instala. O coração acelera, a pressão arterial sobe, a respiração se torna mais curta. Tudo isso faz sentido diante de uma ameaça real. O problema começa quando esse padrão se repete dia após dia, mesmo sem um perigo evidente.
Esse estado de alerta cobra seu preço. E um dos alvos mais sensíveis a esse desgaste é o sistema cardiovascular.
O que se sabe hoje, com base em estudos sólidos, é que pessoas que vivem sob tensão contínua têm maior propensão a desenvolver hipertensão, infarto, arritmias e até insuficiência cardíaca. Esse risco não se explica apenas por uma carga emocional elevada. Há alterações biológicas mensuráveis: ativação persistente do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, aumento da reatividade inflamatória, disfunção do sistema nervoso autônomo, entre outras.
A ansiedade também modifica comportamentos. Quem convive com esse estado tende a negligenciar o sono, a comer sem critério, a renunciar à atividade física e a recorrer a substâncias nocivas como válvula de escape. São estratégias de alívio imediato que alimentam um ciclo de deterioração. O resultado é um terreno propício ao surgimento de doenças metabólicas, como diabetes e obesidade, que se somam aos fatores de risco cardiovascular já existentes.
É importante reconhecer que os sintomas da ansiedade muitas vezes se confundem com algumas doenças cardíacas. Falta de ar, opressão torácica, palpitação, sudorese, vertigem. São manifestações que podem simular um infarto. O desafio está em distinguir o que é ameaça objetiva do que é desorganização funcional. E, mais ainda, em validar os sintomas do paciente mesmo quando os exames estão normais.
Na prática, o que mais me chama atenção não é apenas o que o paciente relata, mas o que o corpo dele revela. Muitas vezes, a dor no peito não é apenas um sintoma físico, mas um reflexo de algo maior, menos visível, mas igualmente real. A ansiedade, nesse contexto, surge como um fator que precisa ser reconhecido, compreendido e tratado com a mesma seriedade dos outros elementos de risco cardiovascular. Fechar os olhos para isso é negligenciar uma parte importante da equação.
Incluir a ansiedade na rotina da cardiologia não significa transformar o consultório em espaço de terapia. Significa afinar a escuta, ajustar o olhar, integrar o cuidado. O diálogo com colegas da saúde mental deve ser fluido, desprovido de barreiras, porque é nesse trânsito entre saberes que o paciente ganha.
Cuidar da saúde cardiovascular é, também, ajudar o paciente a identificar os fatores que mantêm o corpo em estado de alerta prolongado. Quando o coração reclama, nem sempre é por uma obstrução visível. Às vezes, é por aquilo que está transbordando por dentro, sem nome, mas com peso.