Esculhambação geral

OPINIÃO - Gaudêncio Torquato

Data 15/06/2018
Horário 04:30

Uma historinha explica nossas tropicais plagas. Há no mundo quatro modalidades de sociedade: a primeira é a inglesa, aberta, onde tudo é permitido, salvo o que for proibido; a segunda é a alemã, rígida, onde tudo é proibido, salvo o que for permitido; a terceira é a totalitária, ultra-fechada, ditatorial, onde tudo é proibido mesmo o que for permitido; e, por último, a brasileira, onde tudo é permitido mesmo o que for proibido.

Exemplo é a última greve dos caminhoneiros, que bloqueou o livre trânsito e deu prejuízo estimado em R$ 60 bilhões até o momento, com consequências sérias sobre a vida das pessoas – educação, saúde, alimentação, serviços, etc. O país retrocedeu em seu avanço civilizatório. Multas foram estipuladas, como na decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes, de determinar que 96 empresas transportadoras pagassem em 15 dias R$ 141 milhões pelo descumprimento da liminar que determinava o desbloqueio de rodovias.

Depois, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) determinou que os petroleiros arcassem com R$ 2 milhões por dia de greve. E o que se vê? A Câmara dos Deputados avalia anistiar as penalidades impostas na esteira de um projeto de lei que regulamenta o transporte de cargas e cujo relator é o deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP). Se isso ocorrer, o Brasil mostra sua cara sem retoques: a desmoralização das Cortes judiciárias, a desfaçatez dos nossos representantes e a prova inconteste de que aqui tudo é possível: transgredir a lei sem ser punido, descumprir o ordenamento jurídico e receber em troca aplausos por conduta ilegal e imoral.

Vale lembrar a frase atribuída a De Gaulle - o Brasil não é um país sério. A frase, na verdade, é de autoria do embaixador brasileiro na França entre 1956 e 1964, genro do presidente Artur Bernardes, Carlos Alves de Souza Filho, durante a “guerra da lagosta”, a propósito de uma pergunta do correspondente do JB em Paris, Luis Edgar de Andrade.

O fato é que no país não apenas a corrupção suja a veste de políticos, governantes e empresários. A lama se espalha e agrega futricas, politicagem, grupismo, fisiologismo, desmandos, rasgos da Constituição, projetos de lei com foco no corporativismo, domínio de castas, desleixo e desmandos de todos os tipos.

Se amanhã novas greves surgirem, os grevistas saberão que haverá um político “de espírito cívico” a lhe estender a mão. Não serão punidos. Fico imaginando a reação de um alto ministro de nossas Cortes ao ver no lixo sua decisão de punir quem não cumpre a lei. Se os malfeitos do nosso cotidiano se multiplicam é porque os “bem-feitores” da representação política mexem com os pauzinhos, a “fazeção de leis”. E ninguém se assuste com as máfias criminosas que dão ordens de dentro das prisões. A propósito, o faturamento da maior facção criminosa do país pode chegar este ano a R$ 800 milhões. Grana que dá para eleger uma grande bancada.

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