Ex-vereador volta à rotina de vendedor ambulante

Zé do Gato se reinsere no cotidiano do centro da cidade; autônomo, tem como única fonte de renda a venda de doces

PRUDENTE - MARIANE GASPARETO

Data 22/01/2017
Horário 07:25
 

O terno, o plenário e o texto rebuscado dos requerimentos e projetos de lei voltaram a ser substituídos pela camisa leve - típica de quem vai lidar com o sol quente - e a fala coloquial do vendedor ambulante. A velha rotina foi retomada pelo ex-vereador Jailson Nascimento Pereira, Zé do Gato. Ele continua frequentador assíduo da Câmara, mas agora por conta do seu ganha-pão. "Feiz Abudd! Ô Feiz Abudd... esse aí é o comprador de doce, meu amigo". Assim o trabalhador chama o responsável pela assessoria especial do prefeito Nelson Roberto Bugalho (PTB), na esperança de "vender seu peixe". Depois "da social" na Prefeitura é hora de partir para o sinaleiro ao lado, no cruzamento entre a Avenida Coronel José Soares Marcondes e a Rua Doutor Gurgel.

Jornal O Imparcial Zé do Gato enfrenta sol e calor todos os dias para comercializar paçoquinhas pelas vias

"Vou continuar vendendo meus doces na rua, mas eu não tenho vergonha não, é o meu trabalho", se adianta Zé do Gato, antes mesmo da reportagem perguntar qualquer coisa a respeito da sua profissão. De fato, se tem uma coisa que não encontramos em Jailson é o que as pessoas chamam de "preguiça" de trabalhar. Começou aos 10 anos de idade na roça, como "catador" de amendoim.

Por conta disso, estudo ele quase não teve, cursou até o quarto ano do fundamental, porque na época não tinha dinheiro para comprar material escolar e precisava ajudar no sustento dos dez irmãos. "Cheguemo de Pernambuco em 1961 e aqui em Prudente não tinha nada. Eu vim piquinininho , sem pai nem mãe", lembra.

Quando fala sobre o passado, dá a impressão de que é algo tão distante que ele mal se recorda, talvez pela memória falha ou pelo esforço em esquecer. Quando vem à tona a lembrança empoeirada e indesejada, sua vivacidade esmaece um bocado e surgem comentários um tanto deprimidos. Cabisbaixo, diz que sua vida foi de sofrimento e que naquela época era muito difícil, mudando de assunto rapidamente.

 

Uma vida de trabalho

Zé do Gato foi motorista (choffer de madame nas suas palavras), balconista, cobrador, vendedor de limão, catador de papel, vidraceiro, pedreiro, encanador, funcionário de lanchonete, de posto de gasolina e fez todo "bico" imaginável até ficar desempregado e se ver obrigado a trabalhar como autônomo.

Em 2002 começou a vender drops no sinaleiro e financeiramente não era ruim, dava pra ganhar até R$ 3 mil reais por mês. O problema maior era o cansaço físico: "Depende do meu esforço, quanto mais trabalho, mais eu ganho", explica. Nem como vereador ele abandonou o trabalho autônomo, mas agora volta a ter como única fonte de renda a venda dos doces.

Justamente por conta disso, a nova rotina não é nada mole: atualmente o ex-vereador fica perambulando pelas empresas do centro e também vendendo no "seu ponto" os doces das 9h às 17h - sem almoço e sem descanso. Passa só com um "lanchinho" para enganar o estômago até o fim do expediente. Tanto trabalho árduo em uma só vida não poderia ter outra consequência que não o peso de uma idade muito maior do que os 53 anos cronológicos. São os verdadeiros "100 anos em 10", mas de uma forma menos poética e mais cruel.

O cansaço do Zé transparece em seu corpo franzino, seu cabelo grisalho e em um desânimo no falar. Mas como em tantos outros casos de gente que não se dá o direito de desistir, de se deprimir e de se entregar, Jailson compartilha um segredo valioso que descobriu ao longo da vida. Ele aprendeu a não olhar para a dificuldade e a não deixar a dúvida entrar. Fecha os olhos para as dificuldades, assim como fez para o passado, e retoma a normalidade do dia a dia… "Olha a paçoquinha!".

 

 
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