Exercício e microambiente fisiológico

Jair Rodrigues Garcia Júnior

A incidência de câncer de mama é de 46,8 casos e de útero de 22,5 casos em 100.000 mulheres, de próstata é de 29,4 casos em 100.000 homens, de pulmão é de 23,6 casos em 100.000 pessoas. Já a incidência de câncer nos músculos (rabdomiosarcoma) é de 0,096 casos em 100.000, apesar dos músculos representarem 40-50% do peso corporal. Parece que os músculos possuem algum fator protetor e são menos vulneráveis ao crescimento de tumores. Assim como o exercício físico está relacionado à diminuição do risco de câncer e da mortalidade por essa doença.

MÚSCULOS RESISTENTES
O crescimento de tumores nos músculos é relativamente raro e, quando há metástase de um turmor de outro órgão ou tecido, é também raro acontecer a infiltração nos músculos. A resistência dos músculos pode ser em razão de sua estrutura e função, do microambiente metabólico e das miocinas e miRNAs, que podem ter propriedades antitumorigênicas.

MÚSCULOS FRACOS
Em pacientes idosos com câncer, a atrofia muscular e sarcopenia estão presentes em até 89% dos casos. Massa muscular e força reduzidas, e fragilidade estão associadas ao prognóstico clínico negativo, incluindo maior toxicidade da quimioterapia, complicações pós-cirúrgicas e maior taxa de mortalidade. Baixa atividade dos músculos e redução da massa leva ao balanço negativo das miocinas, afetando o sistema imune inato e adaptativo. Exercício físico de força é a solução para frear a perda muscular e restaurar o balance positivo das miocinas.

CAQUEXIA
Condição de perda severa da massa muscular e peso corporal, comum em mais de 80% dos pacientes com câncer avançado, sendo responsável por 22 a 30% das mortes. Além da perda muscular, a inflamação sistêmica é exacerbada, causada por moléculas derivadas do tumor, como o fator de necrose tumoral (TNF). Exercício físico e aumento da produção de miocinas, como irisina, musclina, fator de crescimento de fibroblastos 21 (FGF21), IL-6 e IL-15 são importante para prevenir a sarcopenia e caquexia nestes pacientes.

MIOCINAS
A concentração de miocinas aumenta durante o exercício físico vigoroso. Algumas miocinas modulam positivamente a resposta imune anticâncer, outras têm efeito antitumorigênico limitando o crescimento das células, estimulando a apoptose (espécie de suicídio), controlando a progressão e inibindo a migração e infiltração das células cancerígenas. Quando há produção das miocinas durante a contração, a concentração aumenta no próprio músculo e na circulação. Oncostatina-M, irisina, SPARC, decorina, fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF), interleucinas IL-6, IL-7, IL-10, IL-15 e os miRNAs têm atividade antitumorigênica.

SORO
Em estudos in vitro, a incubação de células cancerígenas com soro obtido de animais que fizeram exercício físico diminuiu a proliferação pela metade, sugerindo efeito da miocina oncostatina-M. O soro de humanos, retirado pós-exercício também mostrou efeito antitumorigênico com células cancerígenas coloretais, pancreáticas, mamárias e prostáticas. Neste soro havia concentrações aumentadas das miocinas oncostatina-M e SPARC. Essas miocinas têm efeito de quimiocinas, que atraem neutrófilos (quimiotaxia) e podem induzir a apoptose das células cancerígenas.

PREVENÇÃO E TERAPIA
Exercício físico tem se tornado foco dos profissionais de saúde no que se refere ao câncer, pois o microambiente fisiológico que se configura com as miocinas tem papel significativo na redução do risco, da proliferação e da severidade do câncer, aumento da eficácia da terapia e melhora do prognóstico.


 

Caquexia, a perda muscular severa é comum em mais de 80% dos pacientes com câncer avançado, sendo responsável por 22 a 30% das mortes.

Referências
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