Impasse divide fiéis da Paróquia Santa Terezinha

Formada em educação artística e com especialização em artes plásticas, explica que uma de suas paixões é a história da arte.

REGIÃO - Mariane Gaspareto

Data 25/02/2015
Horário 10:47
 

Um impasse tem dividido membros e frequentadores da Paróquia Santa Terezinha, da Igreja Matriz de Mirante do Paranapanema. Isso porque, recentemente, a paróquia divulgou em seu site oficial e em sua página no Facebook, imagens do projeto arquitetônico da Igreja Matriz, no qual não consta um painel, obra de arte cubista pintada sobre o reboco de uma das paredes pelo padre João Goetz, na década de 60. Em uma postagem na rede social da paróquia, fiéis se divergem sobre a demolição da obra que, segundo eles, contaria com a aprovação da Diocese de Presidente Prudente. Uma petição pública virtual, solicitando a preservação do painel, foi criada pelos contrários à obra e contava até ontem com 51 assinaturas.

Ana Mussa Góis Soares, 46, por exemplo, conta que nasceu e morou até seus 27 anos em uma casa localizada ao lado da igreja, onde seus familiares ainda residem – eles que, conforme ela, ajudaram a erguer a paróquia. "Sempre gostava de admirá-la, desde criança, e hoje sei o porquê". Formada em educação artística e com especialização em artes plásticas, explica que uma de suas paixões é a história da arte.

"Dias atrás eu vi uma manifestação no Facebook, pedindo a preservação no painel e também me envolvi na mobilização, pois é uma obra de arte. Pessoalmente dou um valor especial ao painel, lembro-me que quando ainda era criança, meu pai sofreu um acidente de carro e corri para o sacrário e ali fiquei num cantinho, pedindo a Deus para salvá-lo, de modo que não posso deixar que acabem com o que acredito ser parte da história de nós, mirantenses", conta.

Rose Sevilha, 46, por sua vez, afirma que também considera o painel um patrimônio histórico do município. "Confesso que fiquei chocada com o projeto de reforma. É uma pena que as pessoas queiram sempre substituir o velho pelo novo, sem ideia alguma do que estão fazendo", lamenta. Sevilha pontua que, o trabalho de tantas pessoas não poderia ser substituído sem o consentimento unânime da população. "Infelizmente, Mirante perderá sua identidade, muito triste isso", considera.

O jornalista Itamar Cavalcante, 59, em seu turno, conta que foi seminarista por seis anos, junto com o padre João Goetz, autor da pintura. "Eu não sou retrógrado, não acho que um prédio antigo deve ficar aos pedaços apenas para preservar seu aspecto, sei que a reforma é necessária, mas acredito que isso pode ser feito preservando. Se o problema é na cobertura, não há necessidade de demolir o painel", afirma.

 

O painel

O painel foi inclusive motivo de artigo elaborado pelo padre Wilson Cristovam, em 2008, para o curso de pós-graduação "Arte Educação", da Unesp (Universidade Estadual Paulista). Para o autor, a obra – concluída em janeiro de 1965 - representa as diversas realidades do município de Mirante do Paranapanema: a família, o trabalho, a indústria, a lavoura, a religiosidade popular e a paróquia propriamente dita.

Ainda segundo Cristovam, a pintura é "de grande importância para a região e poderá vir a tornar-se uma referência para os estudos da arte no Pontal do Paranapanema". No trabalho, conta que o artista, João Goetz, nasceu em 23 de julho de 1932, na Alemanha, e faleceu em 16 de dezembro de 1990. "Em 1979 foi nomeado membro da comissão diocesana de Arte Sacra", acrescenta.

 

Outro ponto de vista

O estudante Lucas Fonseca, 22, que também é membro da igreja, salienta que "o painel não será demolido por vontade do padre, mas pelo estado grave em que se encontra o prédio". Ele relata que há nove meses as missas são celebradas no salão paroquial da Igreja Matriz, visto que a paróquia foi interditada. "As pessoas não podem mais entrar lá, porque o teto está caindo. No final de semana mesmo caiu um metro de reboco da frente da igreja", explica. Conforme Fonseca, a construção está "pendendo para o lado" e o forro já cedeu em 20 centímetros. "É preciso que ocorra uma revisão na estrutura, e não dá para manter o painel. Em primeiro lugar devemos primar pela segurança da igreja e  dos fiéis", afirma.

Procurado, o arquiteto Eduardo Faust, que assina o projeto de reforma da Igreja Matriz, pontuou que não há uma decisão oficial sobre as obras. "Ainda é cedo para saber se precisaremos ou não demolir o painel. A necessidade de obras ali é inegável, mas só teremos um parecer final sobre como deveremos proceder provavelmente daqui a um mês", explica. De acordo com o arquiteto, a igreja encontra-se interditada por problemas na cobertura, e para contornar o problema, em seu projeto desenhou uma com maior inclinação, e para sustentá-la criou arcos e reforço nos pilares, distribuindo a carga.

Procurado, Paulo César da Costa Nascimento, pároco da Paróquia Santa Terezinha, informou que não se pronunciaria sobre o assunto, indicando que a reportagem procurasse o bispo diocesano Dom Benedito Gonçalves dos Santos, que, por sua vez, não foi encontrado até o fechamento desta matéria.

 

SAIBA MAIS


PREFEITO EXCOMUNGADO


Essa não foi a primeira vez que a Igreja Matriz de Mirante do Paranapanema se tornou notícia por assuntos religiosos. Conforme conta o jornalista Altino Correia, na época correspondente do jornal "Folha de São Paulo", nos anos 60, o então prefeito José Marcolino Sobrinho, o Zuca, e o presidente da casa de leis, Francisco Ferreira Lima, bem como outros seis vereadores, foram excomungados pela Cúria Diocesana, com base no Direito Canônico. Conforme ele, o ato inédito ocorreu em 12 de abril de 1969, em virtude da desapropriação da praça da Igreja Matriz aprovada pela Câmara Municipal. A igreja defendia seu patrimônio admitindo que a desapropriação estaria ferindo diretamente os dispositivos do Código do Direito Canônico, o qual diz que "se alguém tiver a ousadia de usurpar bens da igreja, móveis ou imóveis, fica excomungado até que devolva integralmente os bens usurpados".

 
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