Individualismo e a crise do espírito comunal

OPINIÃO - Leonardo Delatorre Leite

Data 02/11/2021
Horário 04:30

A conjuntura contemporânea é marcada por certo fatalismo em relação aos anseios por esperança na construção de uma sociedade solidária. Nesse sentido, muitos pensadores afirmam que a atomização dos indivíduos, isto é, o crescente isolamento entre os homens, típico de uma mentalidade utilitária, definida em termos de instrumentalização das relações sociais em prol do lucro e dos benefícios particulares, acaba por destruir o próprio exercício das virtudes cívicas, sufocando, assim, os valores mínimos de altruísmo, empatia e solidariedade. Todavia, a despeito da crise de valores na sociedade, é possível ter esperança no amor genuíno, o qual se encontra na busca constante pelo sumo bem. 
Numa primeira análise, é preciso frisar o motivo responsável pela degradação da ética social no ambiente comunitário. Por certo, foi o pensador francês Alexis de Tocqueville o principal autor a elucidar as causas da decadência do chamado espírito comunal, geralmente associado aos princípios da busca pelo bem comum a partir da vivência comunitária das virtudes cívicas e cardeais. Para o filósofo em questão, um dos maiores perigos para a consolidação de uma liberdade centrada nos valores morais e autênticos encontra-se na primazia do individualismo, postura que tende a transformar os homens em seres preocupados tão somente com assuntos concernentes à esfera privada, o que acaba por torná-los alheios ao sofrimento do próximo. 
Desse modo, o próprio Tocqueville comenta: “Vejo uma multidão inumerável de homens semelhantes e iguais, que sem descanso se voltam sobre si mesmos, à procura de vulgares prazeres, com os quais enchem a alma. Cada um deles, afastado dos demais, é como que estranho ao destino de todos os outros”.
Em vista disso, o pensador francês reiterava que o individualismo exacerbado contribui para a ascensão de despotismos, visto que o descaso com a esfera pública a torna vulnerável aos autoritarismos, pois os cidadãos, focados em assuntos particulares, não lutam verdadeiramente pela justiça. Diante dos fatos supracitados, é importante frisar a concepção de uma nova liberdade, não definida exclusivamente em termos de ausência de restrições externas às ações individuais, mas na busca pelos valores sociais do bem comum, da justiça civil e do altruísmo. Felizmente, é possível vislumbrar a presença de indivíduos que se sacrificam em prol da liberdade virtuosa.  
Apesar das perversidades oriundas do individualismo, é possível ter esperança, pois ainda há espaço para o altruísmo, que se manifesta nas pequenas ações de bondade e caridade. Por certo, basta olhar para a própria realidade particular e meditar acerca da beleza existente nas amizades, na família e nas pessoas que, na ordinariedade da vida, perseveram no sumo bem e nas virtudes. Destarte, a vivência do amor é o primeiro passo para superar o individualismo e promover as bases de uma esfera pública atrelada aos princípios do espírito comunal. Nas palavras de São Padre Pio, o verdadeiro altruísmo “significa dar aos outros- especialmente a quem sofre e a quem precisa - o que de melhor temos em nós mesmos e de nós mesmos”.  
 

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