Jornalista retrata resgate histórico pós-teste genético de ancestralidade

Glauco Figueiredo Santos, 46 anos, compartilha como a descoberta e empreitada mudou o jeito de ver a vida e se conectar com as origens

PRUDENTE - THIAGO MORELLO

Data 20/09/2020
Horário 05:14
Weverson Nascimento - Aos 46 anos, Glauco teve a chance retornar às origens através de um teste genético
Weverson Nascimento - Aos 46 anos, Glauco teve a chance retornar às origens através de um teste genético

De origem africana, a palavra Omowale, que também é muito utilizada como um nome agênero (sem gênero), significa “a criança voltou pra casa”. Mas numa interpretação para a vida, esse retorno à casa pode simbolizar diversos significados, como retornar às origens, por exemplo. E foi isso que o jornalista e gestor de comunicação, Glauco Figueiredo Santos, 46 anos, fez. Através de um teste genético de ancestralidade ele pode não só conhecer seus antecedentes, como o feito serviu como ponte para iniciar um projeto que visa dar mais voz à vida negra.

Mas, antes de chegar a esse ponto é preciso dar um passo atrás. O ponta pé inicial, segundo ele, surgiu através da leitura do livro “Escravidão”, do também jornalista e escritor, Laurentino Gomes. “Através dessa leitura, eu consegui identificar e conhecer vários reinos que existiam na África, além de uma formação geopolítica que as matérias escolares não tratam. A história do preto, muitas vezes, é retratada somente pelo horrível período de escravidão”, completa.

E foi nessa ânsia de saber mais que surgiu a vontade de se aprofundar. E quanto mais aprofundado, mais afundo Glauco afirma que queria ir. Foi quando ele ganhou de presente - da esposa - o teste genético de ancestralidade. “Foi como o meu segundo nascimento, pois ali eu pude ver de onde eu vim, enfim, a composição que faz parte do meu ser”, frisa.

Como o jornalista diz, foi como se situar melhor no mundo. E através de um simples teste de coleta de saliva por um cotonete, enviado a um laboratório especializado, ele descobriu, por exemplo, que tem 86% de origem africana, sendo 46% presente no Golfo da Guiné, que fica na costa ocidental africana. “Mas, fora essa predominação, há traços de origens que estão espalhados por todo o continente”, diz. Característica essa que é bem comum por lá e só foi descobrir através desse aprofundamento, ainda de acordo com ele.

“É uma sensação de igualdade de fala. Aqui na região de Prudente, por exemplo, sabe-se que muitos são de origens italiana e japonesa, em sua maioria. Então, é simbólico alguém preto ter a chance de também saber sua origem, ainda porque muitos registros foram perdidos com o tempo, sobretudo no período de escravidão”, lembra.

Omowale forever

Mas mais que absorver o conhecimento é importante identificar o que pode ser feito com ele. E primeiro de tudo foi buscar ainda mais informação, mas para ser compartilhada. Depois do livro e do teste Glauco comenta que conseguiu se inscrever em cursos de filosofia africana, e história, além de se aproximar de movimentos regionais de causa preta, como os coletivos Mãos Negras, de Prudente, e o Pais Pretos Presentes, criado por Humberto Baltar e Thainá Baltar. “E aí a gente consegue ver as diversas pautas e conteúdos que são tratados”, pontua.

“Foi como o meu segundo nascimento, pois ali eu pude ver de onde eu vim, enfim, a composição que faz parte do meu ser”
GLAUCO FIGUEIREDO SANTOS, jornalista

E em tempos em que a tecnologia é sinal de poder, porque não fazer parte daqueles que a usam para esse sentido? Lembra da criança que retorna pra casa, Omowale? Ela ganhou nome de um perfil do Instagram criado pelo jornalista, que colocou em prática a questão de dar mais fala à história dos negros. “Desde então, eu tenho recebido convidados, debatido assuntos necessários e que servem tanto para preto quanto para o branco”, comenta.

O mais importante de tudo isso, afirma Glauco à reportagem, é garantir a necessidade de ir contra o racismo que está enraizado na humanidade, e que não se resume apenas a um alguém apontar o dedo para um negro e xingá-lo por conta da cor, mas sim no racismo estrutural, que “é como lutar com fumaça”, porque está presente em fragmentos.

“É uma grande construção histórica. Mas precisamos mostrar que essa voz existe e está existindo. O mundo evoluiu muito, mas vemos que precisa de mais. Não basta dizer que não é racista, porque tem amigos pretos e não os reprime, é preciso ser antirracista e colocar isso em prática. Uma das formas é reconhecer o privilégio de ser branco, por exemplo, e entender a reparação histórica que está sendo feita. E que ainda precisa ser feita”, finaliza.

 

Glauco é natural do Rio de Janeiro (RJ), mas vive em Presidente Prudente desde 2016. O Instagram criado por ele, “Omowale - De volta pra casa”, pode ser acessado pelo @omowale_br.

 

 

 

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