Mães solos contam experiências em criar seus filhos

O Imparcial traz as perspectivas de três mulheres que, em suas jornadas de vida, superam os estereótipos paternalistas da sociedade em relação aos desafios cotidianos da maternidade solo; conheça estas histórias

REGIÃO - CAIO GERVAZONI

Data 08/05/2022
Horário 05:00
Foto: Cedida/Thayná Atraújo
Thayná, mãe do menino Lorenzo, de sete anos, relata que tarefa de cuidar do filho sozinha não é nada fácil
Thayná, mãe do menino Lorenzo, de sete anos, relata que tarefa de cuidar do filho sozinha não é nada fácil

Em sua última estimativa, em 2021, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) indicou que o Brasil possui mais de 11 milhões de mães solteiras. Uma quantidade expressiva de pessoas do sexo feminino que transpõem a convenção tradicional do projeto de muitos casais que é “ter um filho”. Por diversas circunstâncias, estas mulheres esbarram no desafio de criarem sozinhas os seus. Neste Dia das Mães, O Imparcial aproveita o ensejo da data para trazer ao leitor a batalha cotidiana da maternidade solo em uma sociedade que, muitas vezes em sua raiz de ódio, reproduz estereótipos paternalistas em relação a mulheres que, para além dos paradigmas, enfrentam a peleja diária de criarem sozinhas seus filhos.

Diante de um pequeno fragmento em Presidente Prudente, conversamos com três mães solos onde, por vezes, as histórias como mulher se entrelaçam e por vezes não dada, principalmente, sua condição social, cultural e econômica. Thayná, Giovana e Ana confidenciam a você – leitora e leitor – estas vivências.

 

“CONFESSO QUE NÃO É FÁCIL”

É o que conta a jovem Thayná Araújo, 25 anos, sobre o desafio da maternidade solo.

Thayná foi mãe aos 18 anos, idade em que deu luz ao pequeno Lorenzo, hoje com 7 anos. Ela, que atualmente tira o sustento por meio de bicos de garçonete em restaurantes e como faxineira, descreve que dispõe de muita força para enfrentar a responsabilidade de ser mãe solteira. “Olha, confesso que não é nem um pouco fácil. As dificuldades vão surgindo no caminho e tem que ser forte para enfrentar uma responsabilidade que você não imagina que você vai conseguir, porém sempre falo muito isso: ‘Deus não dá batalhas para pessoas fracas’”, enfatiza Thayná.  

“É muito difícil, porém é muito gratificante saber que faço dois papéis na vida do meu filho. Sozinha e, todos os dias, o Lorenzo me mostra o quanto sou forte para correr e lutar por ele”, descreve a jovem.

O relato de Thayná, em contar sua trajetória na criação de seu filho, junta-se à realidade de muitas mulheres deste imenso país, repleto de drásticas contradições sociais. “Faz três anos que a nossa vida mudou de uma forma radical. A separação, a ausência do pai e alguns transtornos por conta disso. Hoje, moro sozinha com o meu filho e todos os dias é uma batalha diferente para conseguirmos seguir em frente”.

A diarista reforça que segue na luta, mesmo com as dificuldades que surgem no caminho de uma mulher sozinha em criar uma criança, no cenário do mundo neste contexto atual, que segundo ela, é muito difícil. “Sempre penso que temos um motivo maior para lutar e batalhar”, relata.

Mesmo jovem, Thayná é profunda ao passar o sentimento do que é ser mãe. “São sonhos que precisam ser realizados e um grande futuro de uma criança pela frente. Mãe não pensa em ninguém a não ser no filho, principalmente quando você tem que criar sozinha sem a presença de uma figura paterna, na qual seria mais que necessário na vida de uma criança, então não é nada fácil, porém hoje a cada dificuldade, a cada dia que passa, eu me sinto mais forte para lutar pelo meu filho, sabendo que tenho dois papéis muito importantes na vida dele no qual eu faço sozinha”, argumenta.

 

“SE VIRAR NOS TRINTA”

Para Thayná, a batalha para sobrevier no dia a dia é um “se virar nos 30” constante diante da concepção que ela julga que o filho tem atualmente. “A principal dificuldade em cuidar e educar, para mim, é na hora de ter que mostrar que o mundo que vivemos hoje não é tão fácil assim como ele pensa”, aponta a mãe de Lorenzo.

Conforme indica a mulher, a tarefa de conciliar o “querer” de mãe - em tentar proteger o filho de uma realidade difícil - ao mesmo tempo da necessidade de apontar a tarefa de “voar com as próprias asas” é um de seus principais desafios. “Mostrar que precisamos ir e aprender que uma hora precisamos voar sozinhos, que a dificuldade aparecerá no meio do caminho. Ele não vai ter a superproteção da mãe para o resto da vida e isso é uma dessas batalhas que tenho que enfrentar”, narra Thayná que, hoje, conta com as avós de Lorenzo como rede de apoio para a criação do menino. “As avós me ajudam muito em relação ao cuidar dele para eu poder trabalhar. A importância delas é enorme porque sem elas ficaria bem mais difícil, hoje trabalhamos para ‘sobreviver’, então é na onde aparecem as dificuldades no caminho de uma mãe solteira. Mãe que tem que se virar nos trinta para não deixar faltar nada para nossos filhos”, completa.

 

“MUITO ALEGRIA E BOM HUMOR”

É desta maneira que a digital influencer e estudante de Jornalismo, Giovana Cunha, 28 anos, inicia seu relato ao contar a história com sua filha, a pequena Heloísa, de apenas 3 anos de idade. Com risos, Giovana conta que por mais que o termo “mãe solo” possa parecer pesado, ela não costuma usá-lo por que de solo não há nada em sua vivência. “Eu levo a nossa história com muita alegria e bom humor”.

A digital influencer descreve que desde que deu luz à Heloísa em um momento em que já estava solteira e que possui uma relação de amizade com o pai da menina. “Eu namorei o pai da Helô, porém nosso relacionamento já não estava bem quando eu engravidei, então optamos por sermos apenas pais e amigos”.

Giovana, que atualmente se desdobra entre o trabalho de digital influencer e os estudos de Jornalismo, narra que conciliar a maternidade com seu dia-a-dia de luta profissional é uma “loucura”, no entanto a pequena Helô transmite a luz, bem como uma pedra vital, para sua batalha cotidiana. “A Heloísa foi o motivo para eu acreditar nos meus sonhos e mudar toda a minha vida, em todos sentidos, principalmente na vida profissional”, relata a estudante de Jornalismo, que, antes da gravidez, cursou Direito, antes de ingressar no curso atual. “Sempre sonhei com a faculdade de jornalismo”, noticia a mãe de Heloísa.

“Então, com a chegada dela, não me enxergava em nenhuma profissão que eu não fosse exatamente feliz, com o seu nascimento fomos ganhando muito espaço na internet. Eu comecei a contar sobre a nossa rotina e as pessoas gostavam”, confidencia a jovem sobre a ascensão de sua história nas redes sociais.  

Um ano após o nascimento de Heloísa, Giovana não fugiu da luta e manteve o sonho de cursar Jornalismo, com o apoio dos pais, prestou o vestibular e ingressou na nova jornada acadêmica durante o período noturno.

Segundo ela, hoje em dia, é necessária uma transmutação ao longo do dia para conciliar as suas funções. “De manhã, maternidade; à tarde, trabalho; e à noite, faculdade. E isso quase nunca dá certo! Porém, de uma forma - que nem eu acredito - dou conta de tudo”.

 

REDE DE APOIO E SUA IMPORTÂNCIA

“Minha rede de apoio é sensacional, desde quando eu engravidei meu pai bateu o pé que a minha casa e a da nenê era a casa dele, então até hoje moramos com a minha família e isso facilita o contexto”, frisa Giovana.

Apesar da condição citada, a estudante de Jornalismo pontua que os pais nunca se colocaram como os responsáveis de Heloísa. “Foi sempre como avós, as responsabilidades são minhas e eles auxiliam, mas não nego que contar com eles me deixa mais segura, e torna as vezes as coisas mais fáceis”, conta a jovem. “Um exemplo disso é estar tranquila na faculdade sabendo que ela está superbem cuidada a noite pela minha mãe”.

A digital influencer, que é filha única, relata também que conta com o apoio de suas tias, por mais que não ela não possui irmãs. “Super me ajudam! Se minha mãe não pode ficar com a Heloísa, elas [as tias] sempre me socorrem. Fora que supermimam minha filha, e se preocupam com outros detalhes, como se estamos em uma festa de família, olham ela a eu comer, ficam um pouco com ela para eu jogar um jogo, me distrair... Essa rede é mega importante, porque as vezes só estamos cansadas”, conclui Giovana.

 

“É PRECISO REALÇAR O DEBATE SOBRE A MATERNIDADE REAL”

A terceira personagem desta matéria é a designer de interiores, Ana Carolina dos Santos, de 31 anos. Ana narra que sua etapa como mãe solteira começou recentemente. A mãe do pequeno Guilherme, de um ano e nove meses, relata que esta etapa de sua vida teve início há pouco menos de um mês. “Ainda estou em fase de adaptação da rotina”, conta.

Para ela, o dia-a-dia tem sido cansativo e representa um grande desafio, essencialmente, em sua vida profissional. “Estou me desligando do trabalho e agora vou tentar fazer minha própria renda vendendo doces. Com isso, terei mais tempo e disponibilidade para me dedicar melhor ao meu filho, mas os desafios da vida do empreendedorismo me assustam um pouco. É muito instável! Ter uma ‘boquinha’ para alimentar não é brincadeira”, enfatiza Ana.

De acordo com a mãe do pequenino Guilherme, o desafio de manter a rotina da criança como mãe solteira é uma questão ser discutida diante da perspectiva dos limites de um ser humano. “É importante sempre nos lembrar que devemos respeitar nossos limites como pessoa também. Não é porque que somos mães que temos que ser perfeitas, seguir à risca tudo que as ‘cartilhas de boa mãe’ nos exigem”, entende Ana.

Para ela, é preciso realçar o debate sobre a maternidade real, do dia-a-dia para que essa carga de "perfeição" vá diminuindo para as próximas mulheres que vierem a se tornarem mães. “É fazer o que é possível e [isso] não é ruim, e mostra essa nossa humanidade para nossos filhos”.

 

PERCEPÇÃO SOBRE A REDE DE APOIO

E POLÍTICAS PÚBLICAS

Ana relata que conta com o apoio dos pais, de vizinhos e do pai de Guilherme para auxiliar na criação do filho. “Meus pais e até alguns vizinhos me dão esse suporte. Além de poder contar com o pai da criança sempre que preciso também. É importante porque a demanda com a criança é alta e a exaustão bate. E é necessário que estejamos descansados para dar tempo de qualidade para eles”, relata a designer.

Em seu ponto de vista, Ana analisa que o país não possui políticas públicas que deem apoio às mães de modo geral. “O Brasil é carente de política familiar em geral. Começando pela licença maternidade de apenas quatro meses quando o aleitamento materno é indicado pelo menos até o sexto mês de vida da criança”, desenvolve a mulher.

Para ela, a mulher como pessoa possui demandas pessoais e realizá-los nesta batalha são os desafios mais difíceis. “Os sacrifícios pessoais são os mais frustrantes ao meu ver. Mãe também é profissional, amiga, filha e mulher. A gente também tem demandas individuais. E geralmente quando precisamos de um tempo, seja para cuidar da aparência, saúde ou até mesmo sair para um momento de lazer, é desgastante ter que pedir para alguém cuidar da criança”, relata Ana. Por fim, a mãe do pequeno Guilherme, relata as dificuldades que recaem sobre a figura da mãe. “É quando vemos o ‘quem pariu mantém e embale’ na prática. Sempre tem a cobrança do ‘hoje você não ficou com ele direito’ ou ‘ele sente sua falta’, quando o pai pode sair, manter a rotina dos jogos de futebol, estudos ou o que quiser fazer sem ter a mesma cobrança”, finaliza a designer de interiores.

 

Cedida/ Giovana Cunha

Giovana Cunha, 28 anos, descreve seu relato ao contar a história com sua filha, a pequena Heloísa, de apenas três anos de idade

Cedida/ Ana Carolina dos Santos

Ana Carolina dos Santos, 31 anos, narra que sua etapa como mãe solteira começou recentemente HÁ menos de um mês

 

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